sexta-feira, 17 de março de 2023

Tempo esquisito: crime vira 'apagão' e 'lixo' é guardado dentro do armário



Certos personagens deixam Brasília mais surrealista do que o habitual. De volta ao governo da Capital, Ibaneis Rocha atribuiu o quebra-quebra de 8 de janeiro a um "apagão geral". Em depoimento ao TSE, o ex-ministro Anderson Torres classificou a célebre minuta de decreto golpista de "texto folclórico", "loucura" e "lixo". Curioso, muito curioso, curiosíssimo! Crime virou "apagão". E "lixo" é guardado no armário.

Houve na intentona bolsonarista de 8 de janeiro um festival de crimes: terrorismo, depredação, roubo, atentado contra o Estado Democrático de Direito e tentativa de abolir por meios violentos o regime democrático. Tudo transmitido em tempo real pelas emissoras de TV e pelas redes sociais. Ibaneis é advogado. Mas não se constrange em chamar o surto criminoso de "apagão". O caso do governador é de falta de eletricidade mental.

A minuta de decreto que autorizava Bolsonaro a instaurar estado de defesa na sede do Tribunal Superior Eleitoral e anular a eleição de Lula foi apreendida na casa de Anderson. Estava dentro do armário, no interior de uma pasta ornamentada com o brasão da República. Há mesmo um quê de "loucura" na cena. Mas o ex-ministro da Justiça de Bolsonaro não sofre de insanidade. Ao contrário, ele aproveita cada segundo dela. Jamais se viu alguém capaz de guardar o "lixo" com tanto esmero.

Numa rara concessão ao óbvio, Ibaneis reconheceu que "o apagão não foi de graça", pois "alguma coisa aconteceu" para que Brasília vivesse o curto-circuito de 8 de janeiro. "Tivemos falhas da Polícia Militar do DF, do batalhão do Exército, tivemos diversas falhas em conjunto", disse o governador. Ironicamente, Ibaneis esqueceu de lembrar —ou lembrou de esquecer— a falta de iluminação mental que o levou a acomodar Anderson na chefia da Secretaria de Segurança de Brasília. Aliás, Ibaneis eximiu Anderson de culpa.

Como um Judas às avessas, Anderson negou três vezes no depoimento ao TSE que Bolsonaro tivesse conhecimento do "lixo" que ele guardava no armário de casa. Até Bolsonaro já admitiu que o processo no qual a minuta golpista foi anexado deve resultar na sua inelegibilidade. Mas o discípulo se mantém leal ao messias que foge da crucificação refugiado na terra do Pateta. Anderson reiterou que não sabe quem redigiu a minuta. Disse ter recebido a sujeira por meio da assessoria. Mas não se recorda do nome do assessor.

Tempo esquisito. Em plena era da informação, ninguém sabe de nada em Brasília. O surrealismo, quando é demasiado, ofende a lógica e a inteligência alheia.

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