No escândalo das joias, os fatos parecem ter pretensões literárias. A exatidão está no exagero. Ao tentar recriar a realidade em seu depoimento à Polícia Federal, Bento Albuquerque desmentiu a si mesmo. E fabricou um enredo que destoa também do script criado por Bolsonaro. O caso passou a ter três versões: a do almirante, a do capitão e a verdadeira.
Bento agora diz que os dois estojos que trouxe da Arábia Saudita em 2021 continham presentes para a União. Se fosse assim, bastaria ter seguido a orientação dos fiscais, pois bens do Estado não são tributados. Antes, o almirante dizia que as joias de R$ 16,5 milhões, retidas na alfândega, iriam para Michelle Bolsonaro. As joias masculinas, que escaparam à fiscalização, seriam de Bolsonaro.
O Planalto jamais requisitou a incorporação das joias ao acervo público. Bolsonaro tramou a pilhagem. Apropriou-se de relógio, abotoaduras, caneta, anel e um rosário islâmico. São bens "personalíssimos", alegou. Num instante pouco beato, Bento admitiu à PF que escondeu as peças surrupiadas pelo ex-chefe na sua própria bagagem. Os diamantes camuflados na mochila do assessor foram salvos do roteiro inexato. Felizmente, permanecem retidos.
O escândalo das joias descerá à crônica do governo Bolsonaro como uma espantosa sequência de fatos extraordinários que aconteceram com pessoas ordinárias —em todos os sentidos. O inquérito da PF mal começou. Mas já está demonstrado que a verdade não só é muito mais incrível do que a ficção como é bem mais difícil de ser inventada.
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