quarta-feira, 9 de agosto de 2023

Pressão por doação dos milhões do Pix expõe hipocrisia do 'mito'



Um político com moral fluida, capaz de migrar da rachadinha para a pixcaretagem sem ruborizar a face, não há de se sensibilizar com apelos à solidariedade. Mas a Comissão de Justiça e Paz de São Paulo age bem ao lançar nas redes sociais, habitat antinatural do bolsonarismo, uma campanha para que Bolsonaro doe aos 130 mil órfãos da covid os R$ 17 milhões que recolheu via Pix.

Bolsonaro descobriu que depois da impunidade vem a bonança. Preso no QG do Exército, o coronel Mauro Cid ficou impossibilitado de vender o Rolex e as joias da República no mercado negro. Restou ao mito tomar ao pé da letra o brocardo segundo o qual dinheiro não traz felicidade. Bolsonaro rogou aos seus devotos: "Transfira-me o seu dinheiro via Pix e seja feliz." Foi graciosamente atendido.

O dinheiro foi coletado a pretexto de pagar multas impostas pelo Judiciário a Bolsonaro por não usar máscara em suas aparições públicas em São Paulo durante a pandemia. No total, essas multas somam R$ 936.839,70. Por enquanto, o infrator não pagou um mísero tostão. Com a conta bancária abarrotada, o capitão faz piada: "Dá para pagar todas as minhas contas e ainda sobra dinheiro para tomar um caldo de cana e comer um pastel com dona Michelle".

Os organizadores da campanha estimam que a coleta do Pix financiaria cinco séculos de pastel e caldo de cana para a família Bolsonaro. "Mais justo e nobre é dar um futuro digno" a crianças e adolescentes que perderam os pais na pandemia da "gripezinha".

O erro dos reformadores é tentar transformar os maus em bons. O mundo pode melhorar no dia em que os bons tiverem suficiente maldade para impor sua bondade. É improvável que a campanha pela doação dos milhões transforme Bolsonaro num benfeitor social. Mas o constrangimento da exposição da hipocrisia do "mito" já seria, no caso do capitão, um extraordinário avanço.

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