quinta-feira, 3 de agosto de 2023

Operação da PF contra Carla Zambelli amplia elementos golpistas no entorno de Bolsonaro


Investigadores realizaram busca e apreensão na casa da deputada por suposta participação em ataques cibernéticos contra o Judiciário

Walter Delgatti, Carla Zambelli e Jair Bolsonaro — Foto: Reprodução e Divulgação

A deputada Carla Zambelli (PL-SP) foi alvo, nesta quarta-feira, de operação da Polícia Federal que apura sua eventual participação em ataques cibernéticos contra o Judiciário, ampliando os episódios de cunho golpista no grupo que orbitava o ex-presidente Jair Bolsonaro. Foram cumpridos mandados de busca e apreensão em endereços da parlamentar e assessores e um de prisão preventiva contra o hacker Walter Delgatti Neto, conhecido por vazar dados da Lava-Jato. Na decisão que autoriza a detenção, o ministro do STF Alexandre de Moraes, que teria tido dados pessoais violados pelos investigados, afirma que Delgatti agiu sob ordens de Zambelli para “expandir a narrativa fraudulenta contra o processo eleitoral” com o intuito de tumultuá-lo.

Os investigadores querem saber se a deputada atuou para invadir o sistema interno do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e se solicitou a violação de dados privados de Moraes. Em depoimento, Delgatti chegou a confessar os crimes, mas indicou que a deputada seria a mandante. Como o hacker tem histórico de depoimentos contraditórios, os policiais precisam de mais provas para avançar no caso.

Na decisão que autorizou a prisão de Delgatti e os mandados de busca, inclusive no gabinete da deputada, em Brasília, Moraes assinalou que o caso está relacionado ao chamado “inquérito das fake news”, iniciado em 2019 e que apura ataques a integrantes da Corte.

Cordão de isolamento

O episódio amplia o número de casos envolvendo bolsonaristas que agiram para tumultuar o resultado das eleições e que foram parar na mira da Justiça. O ex-ministro da Justiça Anderson Torres, por exemplo, foi flagrado com uma minuta que previa uma intervenção no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em caso de derrota eleitoral. Já o ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, Mauro Cid, que está preso, foi flagrado trocando mensagens de teor golpista com interlocutores. Corre ainda a investigação de um plano que teria sido arquitetado pelo ex-deputado Daniel Silveira (RJ) e pelo senador Marcos do Val (Podemos-ES) para gravar e incriminar e Moraes. Em julho do ano passado, Bolsonaro proferiu ataques ao sistema eleitoral, o que culminou com a sua inelegibilidade por oito anos.

Nesta quarta-feira, enquanto aliados do ex-presidente tentaram se descolar do caso e isolar a parlamentar, a própria investigada buscou preservar Bolsonaro. O ex-mandatário participou, por intermédio de Zambelli, de encontro com Delgatti para debater o sistema de votação em agosto passado.

Em depoimento à PF, o hacker disse que, em reunião no Palácio da Alvorada, o ex-presidente lhe perguntou se era possível invadir a urna eletrônica. Em entrevista à GloboNews, o advogado Ariovaldo Moreira, que representa Delgatti, disse que no mesmo encontro foi citada a possibilidade de “ruptura institucional”. O defensor, no entanto, afirmou não poder fornecer detalhes sobre reunião, pois estaria sendo negociado um acordo de colaboração premiada.

Deputados do PL foram econômicos nas manifestações de solidariedade a Zambelli. A única fala relevante partiu do presidente da sigla, Valdemar Costa Neto. Nas redes, ele reiterou não concordar com “eventuais erros cometidos por parlamentares do partido”, mas deu a entender que houve uma série de irregularidades na ação.

O texto, que sequer cita o nome da deputada, foi interpretado por aliados como uma espécie de “separação de responsabilidades” e um recado claro de que o partido não estará incondicionalmente ao lado de Zambelli em eventual processo de cassação do seu mandato — o que é visto como provável.

A manifestação de Valdemar foi redigida após movimentação, nos bastidores, do advogado de Bolsonaro, o ex-ministro Fabio Wajngarten. Na semana passada, de acordo com aliados do ex-presidente, Zambelli tentou marcar uma reunião para conversar com Bolsonaro, mas foi ignorada. Pessoas próximas ao ex-presidente afirmam que ele se irritou ao saber que era citado nas investigações. Ele lembrou do episódio em que a deputada sacou e apontou uma arma para um homem, em São Paulo.

Poucos aliados estiveram ao lado dela na entrevista coletiva em que reconheceu que tem “relação” com o hacker, a quem ajudou a ir a Brasília para encontrar Bolsonaro e Valdemar. O fato de ter eximido os dois de responsabilidade e assumido a culpa pelos contatos, de acordo com lideranças, fez parte de uma estratégia para não correr riscos internos.

— A impressão que tenho é que querem envolver o Bolsonaro. Não existe qualquer prova, ele não pediu nada — disse Zambelli.

Pagamentos a hacker

A operação foi montada, segundo informou a colunista do GLOBO Malu Gaspar, após a investigação identificar que assessores de Zambelli fizeram pagamentos para o hacker. No total, os repasses somam R$ 13,5 mil via Pix. Foram feitos também pagamentos em espécie ainda não contabilizados. Zambelli negou as acusações e disse que o pagamento era para outros serviços.

As invasões no sistema do CNJ ocorreram em janeiro, quando foi inserido um despacho de prisão contra Moraes. O hacker afirmou que o texto foi redigido por Zambelli e “vazado” por ela à imprensa. Também disse que foi procurado pela deputada em setembro de 2022, que solicitou que ele “invadisse a urna eletrônica ou qualquer sistema da Justiça Brasileira, visando demonstrar a fragilidade do sistema”. O hacker, contudo, afirmou que “não conseguiu” invadir o TSE. Zambelli teria dito que, caso não fosse possível invadir a urna, que ele deveria tentar obter “conversas comprometedoras” de Moraes, invadindo seu celular ou e-mail. Delgatti então teria dito que já havia invadido o e-mail de Moraes, mas que não havia conteúdo comprometedor.

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