Mais uma vez a imprensa e os adversários pinçam um fato para criticar, maliciosamente, o presidente da República. Reagindo ao "ato midiático" do governo de São Paulo, que cobra uma definição sobre a compra de 54 milhões de doses adicionais da CoronaVac, o Ministério da Saúde informou que não tem pressa. Decidirá até o final de maio. O mundo caiu sobre a cabeça de Jair Bolsonaro. Uma injustiça. São compreensíveis as razões do capitão.
Bolsonaro decerto está preocupado com a ruína fiscal do Estado, agravada pela pandemia. Em 2019, antes do coronavírus, o déficit nas contas públicas foi de R$ 95,1 bilhões. Em 2020, o buraco virou uma cratera histórica: R$ 743,1 bilhões. Ou 10% do PIB. O país está endividado até a raiz dos cabelos de todos os brasileiros. Inclusive os calvos. É natural que Bolsonaro, frequentemente tachado de populista, esteja preocupado com a saúde das contas nacionais.
Antes de decidir sobre a compra das vacinas, o presidente precisa orçar o valor do apoio legislativo do centrão. A turma do toma lá, dá cá anda com código de barras na lapela. Há uma frenética remarcação de preços. Os 63 pedidos de impeachment inflacionaram o mercado da baixa política. Na disputa pelo comando da Câmara e do Senado, os votos estão pela hora da morte.
É fúnebre o quadro da pandemia. O Brasil voltou a amargar uma média diária de mortes acima de mil. Nesta quinta-feira, os cadáveres da Covid foram contados em 1.439. A pilha de corpos ultrapassou a marca de 201 mil. A maioria dos brasileiros sonha com a vacina. Bolsonaro já declarou que não cogita vacinar-se. Mas não abre mão de imunizar o seu mandato.
O Brasil pós-redemocratização elegeu cinco presidentes: Collor, FHC, Lula, Dilma e Bolsonaro. Dois foram enviados para casa antes de concluir o mandato: Collor e Dilma. Uma taxa de mortalidade de 40% —oito vezes maior do que o índice de letalidade da Covid-19 no Amazonas: 5%. A proliferação de pedidos de impeachment empurra o governo Bolsonaro para o grupo de risco.
Caindo o capitão, o índice de mortalidade política dos presidentes brasileiros subiria para 60%. Para evitar o massacre, os operadores do Planalto percorrem o Congresso sem máscara. Articulam a eleição do líder do centrão Arthur Lira na Câmara. Para o comando do Senado, Rodrigo Pacheco, da ala do DEM que valoriza uma "boquinha".
O centrão e seus congêneres, como se sabe, não perdem por esperar. Ganham. Na campanha, o centrão foi agredido por Bolsonaro. Mas não costuma ficar com raiva. Fica com tudo. A blindagem parlamentar custará caro. Natural, portanto, que o governo retarde a decisão sobre a compra das doses adicionais de CoronaVac. Antes de comprar a "vacina chinesa do João Doria", Bolsonaro quer esmiuçar o preço da imunização do seu mandato.
O ministro Paulo Guedes (Economia) deve estar orgulhosos da responsabilidade fiscal exibida pelo chefe.
Por Josias de Souza
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