quarta-feira, 31 de agosto de 2022

Nordestino, mulher e pobre podem demitir Bolsonaro e afastar fascistoides



Já escrevi aqui que as medidas econômicas do governo decorrentes de duas PECs ilegais — a dos combustíveis e a dos benefícios sociais — devem ter impactado o comportamento do eleitorado. Mas nunca se saberá com certeza porque é impossível testar cenários sem elas. É razoável supor, não?, que a situação eleitoral de Jair Bolsonaro estaria pior se os combustíveis estivessem nos cornos da Lula e com R$ 200 a menos do Bolsa Família, que se chama "Auxílio Brasil" só em "novilíngua" bolsonarista. O que se pode dizer, aí sim, é que, a um mês da eleição, elas não foram suficientes ainda para virar o quadro eleitoral, conforme esperam os governistas — e, hoje, parece improvável que aconteça. Mas eleição é como o Programa do Chacrinha, já brinquei aqui: só acaba quando termina.

Mais uma pesquisa presencial vem a público pronta para decepcionar bolsonaristas. O levantamento Genial-Quaest divulgado no começo desta madrugada indica que, se a eleição fosse hoje, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) teria 44% dos votos, contra 32% de Bolsonaro, números idênticos aos da Pesquisa Ipec divulgada na segunda. Há duas semanas, a diferença também era de 12 pontos (45% a 33%). Ciro Gomes (PDT) oscilou de 6% para 8%, e Simone Tebet (MDB) manteve os 3%. Vera Lúcia (PSTU) e Pablo Marçal (PROS), que não será candidato, têm 1%. Como a margem de erro é de dois pontos, também nesse caso permanece a possibilidade de Lula vencer no primeiro turno, na margem de erro: 44% contra 45% de seus adversários. Mas, repita-se, é uma possibilidade que vem se estreitando em várias pesquisas.

No segundo turno, Lula manteve seus 51%, e Bolsonaro oscilou um para baixo, com 37%. A diferença é de 14 pontos. No Ipec, para lembrar, o placar é 50% a 37% — uma diferença de 13. As duas pesquisas são presenciais, com o mesmo número de entrevistas: a composição da amostra e o método são distintos. Mas, no caso, chegam ao mesmo achado.

UM MAU MÊS PARA BOLSONARO
Vamos ver. Neste mês, parcela considerável dos beneficiários do Bolsa Família já recebeu os R$ 200 suplementares. Também foram liberados os Auxílios Caminhoneiro e Taxista. A campanha eleitoral explícita nas ruas começou no dia 16. Quatro candidatos deram as aguardadas entrevistas ao Jornal Nacional. No dia 26, teve início o horário eleitoral no rádio e na TV, e se realizou o primeiro debate no dia 28.

A Quaest foi a campo entre os dias 25 e 28. Os números certamente não captam ainda eventuais impactos da campanha na mídia e do debate, mas agosto, convenham, já foi um mês agitado, e rigorosamente nada aconteceu nos números com Lula e Bolsonaro, o que é má notícia para o presidente, que está atrás. Na pesquisa do começo do mês (3), eles tinham, respectivamente, os mesmos 44% e 32%. Ciro Gomes variou três pontos para cima nesse período: de 5% para 8%. Simone Tebet cresceu um.

A título de curiosidade: em abril deste ano, Lula tinha 44% das intenções de voto, e Bolsonaro, 29%. Quatro meses e muitas lambanças legais depois, a diferença caiu apenas três pontos: de 15 para 12.

OS MAIS POBRES E O GOVERNO
Insisto: o correto é dizer que as medidas eleitoreiras não surtiram até agora o efeito esperado, não que tenham sido inúteis porque nunca se sabe se, no quadro econômico anterior, Bolsonaro não teria despencado, e Lula, disparado. Creio que seria o provável, daí o desespero para aprovar as PECs ilegais.

Entre os que recebem o Bolsa Família, Lula mantém uma distância gigantesca de Bolsonaro: 54% a 25%. Saibam: no começo do mês, era menos: 52% a 29%. Entre os que recebem até dois mínimos (38% do total), o petista mantém liderança folgada: 52% a 25%. No grupo de dois a cinco (40%), tem-se 41% a 35% contra o atual presidente, que só lidera no pequeno contingente que recebe acima de cinco mínimos (22%): 42% a 34%.

AUXÍLIO, COMBUSTÍVEIS E AVALIAÇÃO CRÍTICA
O benefício com data parece ter caído mal junto a parcela significativa do eleitorado -- e também é frequente se ouvir por aí que Bolsonaro só agiu movido pelo interesse eleitoral. Há 15 dias, 44% diziam ser irrelevante o auxílio para votar ou não no presidente; agora, 41%. Ocorre que nada menos de 28% diziam que as chances haviam diminuído, número que agora saltou para 35%. E oscilou de 24% para 22% os que veem as aumentadas.

Também nesse caso, os mais pobres não se deixam cooptar com facilidade. 38% dos que recebem até dois mínimos dizem que o aumento do auxílio fez diminuir a chance de votar no presidente (eram 32% há quinze dias). No grupo, 36% afirmam ser irrelevante. Na faixa superior, de dois a cinco mínimos, os hostis ao benefício na boca da urna saltaram de 28% para 34%; para 42%, tanto faz; para 22%, a chance aumentou. Entre os mais endinheirados, acima de cinco mínimos, também cresceram os refratários: de 24% para 30% — 47% dizem não fazer diferença, e só 21% apontam como fator positivo para votar.

Identifica-se uma hostilidade às medidas a toque de caixa até em relação ao ICMS dos combustíveis. Entre os que ganham até dois mínimos, que não consomem gasolina ou diesel, 37% dizem que diminuiu a chance de votar em Bolsonaro. Na faixa de dois a cinco, 33% dizem a mesma coisa. Acima de 5 mínimos, passaram de 24% para 29% os eleitoralmente refratários à medida. Nos três grupos de renda, veem aumentadas as possibilidades do voto, respectivamente, 26%, 33% e 37%. Para os demais, não faz diferença.

Como se nota, há aqui um campo para a oposição explorar no mês que resta de campanha eleitoral até o primeiro turno. Acham que Bolsonaro tomou as medidas apenas para tentar ganhar a eleição nada menos de 63% dos entrevistados — 86% entre eleitores de Lula; 84% entre os de outros candidatos e 25% entre os que votam no presidente. Só 31% avaliam que o governo agiu para ajudar as pessoas, crença que chega, claro!, a 69% entre os que votam pela reeleição, caindo a 9% entre os eleitores do petista e a 14% no grupo que vota dos demais candidatos.

RELIGIÃO, REGIÃO, MULHERES E ESCOLARIDADE
A vantagem do atual mandatário é grande entre os evangélicos (27% do total): 51% a 27%, mas os números se invertem no grupo dos católicos (53% da amostra): 51% a 27% para Lula. Entre os 19% sem religião (15%) ou que cultuam outras crenças (4%), o ex-presidente bate o atual por 45% a 24%. O mês de agosto também não trouxe novidades positivas para Bolsonaro entre as mulheres -- 53% do eleitorado: Lula segue vencendo por 45% a 29% -- 42% a 35% entre os homens.

O Nordeste (27% do eleitorado) segue uma terra quase hostil a Bolsonaro: 58% a 21% para Lula. Ambos estão em empate técnico no Sudeste (39% a 36% para o petista) e no Sul (39% a 37% para o presidente). No Norte-Centro Oeste, o empate é rigoroso: 38%.

A vantagem de Lula também se explica quando se leva em conta a escolaridade: 51% a 28% entre os que têm o ensino fundamental — e esse grupo representa 38% da amostra. Entre os com ensino médio (40%), o petista lidera por 42% a 34% (há 15 dias, eram 41% a 32%). Eles só empatam em 35% no grupo dos 22% com ensino superior.

ENCERRO
Bolsonaro tem um mês para tentar se entender com os pobres, os menos escolarizados, os nordestinos e as mulheres. São eles que, por enquanto, livram o Brasil de um segundo mandato do "Mito". Dado o que pensa e diz o candidato, não parece que essas categorias caibam na sua equação.

Mas eleição só acaba quando termina.

Por Reinaldo Azevedo

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