terça-feira, 30 de agosto de 2022

Ninguém deveria construir impunemente um patrimônio como o do clã Bolsonaro



Quando um político diz que ficou rico pelo trabalho duro, convém perguntar: trabalho de quem? A prosperidade da dinastia Bolsonaro é um desafio à paciência dos contribuintes que suam a camisa para entregar compulsoriamente ao Estado parte do fruto do seu esforço. Em três décadas, o clã presidencial adquiriu 107 imóveis. Em quase metade das transações (51) o pagamento foi feito —total ou parcialmente— em dinheiro vivo. Em valores atualizados, o montante pago em moeda sonante foi de notáveis R$ 22,6 milhões. Repetindo: mais de R$ 20 milhões em grana viva.

No mundo dos negócios convencionais, o pagamento de montantes expressivos costumava ser feito em cheque ou, mais recentemente, por meio de transferência bancária eletrônica. Ninguém sai pelas ruas carregando malas de dinheiro, a menos que esteja envolvido em alguma transação ilícita. Em pelo menos 25 casos, as transações imobiliárias da primeira-família resultaram em investigações do Ministério Público. Entre eles a casa do presidente num condomínio na Barra da Tijuca, no Rio, e a mansão do primogênito Flávio, em Brasília. Não há vestígio de punição.

Dias atrás, falando a um podcast, Bolsonaro declarou que a prática da rachadinha é "meio comum". Sustentou que, na política, "sobra pouca gente" que não aderiu a essa modalidade de peculato. Perguntou-se ao presidente se ele sobraria. O capitão disse o seguinte: "Não vou falar de mim. Sou suspeito para falar de mim."

No momento, Bolsonaro percorre a conjuntura pedindo votos para permanecer mais quatro anos na Presidência. Chama Lula, seu principal adversário, de corrupto. Fala com a convicção dos entendidos na matéria. Ninguém deveria construir impunemente um patrimônio como o do clã Bolsonaro. Mas certos políticos amam tanto a pátria que se julgam no direito de morar no déficit público. Fazem isso protegidos por um pacto oligárquico que transformou o saque aos cofres públicos em algo trivial. Alguns ricos deveriam ter vergonha de ser ricos. Mas certos políticos jamais se envergonham de si mesmos, embora não lhes falte matéria-prima.

Por Josias de Souza

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