sexta-feira, 7 de outubro de 2022

Os nem-nem-nem


Eleitores na fila de votação no dia 2 de outubro com santinhos espalhados no chão — Foto: Marcia Foletto

Quem são os 38.223.491 de brasileiros que não votaram, anularam o voto ou votaram em branco?

Faltou 1,7 milhão de votos para Lula ganhar no primeiro turno, justamente a diferença a favor de Bolsonaro em São Paulo, no interior próspero e escolarizado, religioso e conservador. Eles decidiram o primeiro turno. É muita gente, vivendo no estado mais rico do Brasil, que se fosse um país seria de Primeiro Mundo, e também um dos mais conservadores.

Como já não se pode mais falar em esquerda X direita — chamar alguém de “esquerdista” ou “direitista” se tornou ofensa grave, como equivalente a “comunista” e “fascista” —, agora é mais educado e prudente definir o confronto entre progressistas x conservadores. O problema é definir que “progresso” é esse, e para quem, e o que esse pessoal quer “conservar” — se forem privilégios, todo mundo quer.

Os mais conservadores seriam os gaúchos, catarinenses e paranaenses, que deram ampla vitória a Bolsonaro? Não por acaso são estados prósperos, tradicionalistas, de cultura própria, com forte influência da imigração europeia, regionalistas de maioria branca e classe média escolarizada. Se o delírio separatista de alguns gaúchos radicais se materializasse, do Paraná para baixo seria uma Bélgica com as praias de Santa Catarina. E eles passariam férias no Brasil.

Foram os nordestinos, dos estados mais pobres e das populações mais carentes e menos escolarizadas que votaram em Lula, apesar dos benefícios distribuídos por Bolsonaro. Seriam os nordestinos os mais progressistas do Brasil? Ou os mais leais e gratos ao conterrâneo ? A Bahia é o estado mais progressista do Brasil ? E Minas, que é metade nordestina pobre e metade sudestina rica, onde Lula venceu, é um pouco mais progressista que conservadora?

A máxima de Tim Maia, do país onde puta goza, cafetão tem ciúme, traficante é viciado e pobre é de direita, foi desmoralizada? Afinal, o Brasil mais pobre votou na esquerda. Tom Jobim completaria: “O Brasil não é para principiantes”.

Também me incomoda falarem sempre em porcentagens e as pessoas ficarem reduzidas a parcelas de um todo. Quando dizem que o gado fanático de Bolsonaro é “só” 30% da população, está se falando de uma multidão de 50 milhões de homens e mulheres de carne e osso, uma Colômbia inteira com a camisa da Seleção Brasileira. Bem inquietante.

O mistério é: quem são esses 38.223.491 de brasileiros que nem sequer foram votar, por preguiça ou desilusão, ou fizeram questão de anular o voto como protesto, ou votaram em branco, contra todos? É muita gente. E é claro que não estão nada satisfeitos com Lula e Bolsonaro. Eles, os nem-nem-nem, podem decidir as eleições.

Seria muito interessante uma pesquisa só entre esses 38 milhões (um quarto do eleitorado, um Canadá) para tentar saber suas motivações e as suas eventuais intenções de mudança de atitude diante do novo quadro do segundo turno. O desafio é saber quem são esses brasileiros.

Nenhum comentário: