segunda-feira, 17 de outubro de 2022

Episódio de Paraisópolis tem cheiro de trapaça. Cuidado com tática Odorico!


Tarcísio e o tuíte em que afirma ter sido atacado. Sobra a sugestão de atentado político, o que é um absurdo. Com que intento? A quem interessaria? Imagem: Marlene Bergamo/Folhapress; Reprodução

O tiroteio em Paraisópolis, em São Paulo, nesta segunda, não pode ficar barato, "sair no xixi", como se diz. O troço acontece no dia seguinte à acusação insana e irresponsável de Jair Bolsonaro, que tentou ligar a campanha de Luiz Inácio Lula da Silva ao narcotráfico, em debate promovido por Band, UOL, Folha e TV Cultura. O presidente, note-se, mentiu ao afirmar que Lula andou ao lado de traficantes do Salgueiro — errou até a comunidade. O "CPX" do boné que usava o presidente, todos sabem a esta altura, quer dizer "Complexo" — do Alemão.

Conheço pessoas que integram a comitiva e que estão envolvidas com o projeto educacional, iniciativa obviamente louvável, que deve ser aplaudida. E seria de todo positivo, aliás, que não se misturasse a campanha política. Atenção! Não houve tiros contra o prédio. Portanto, Tarcísio de Freitas mente e se rebaixa ética e moralmente ao escrever no Twitter um "fomos atacados". Não foram. Os tiros, que são reais — resta saber quem os deu —, não tinham como alvo o edifício em que ele estava. Mas pode ter havido um confronto envolvendo criminosos e seguranças à paisana nas imediações da escola.

A "Folha" registra uma outra fala lamentável do empresário Wallace Rodrigues, que é membro da comunidade e sócio do empreendimento educacional. Segundo o jornal, disse ele:
"Ouvimos disparos do lado de fora do prédio. Foram disparos para o alto de opositores políticos do Tarcísio".

Se afirmou isso, não é menos irresponsável. O "lado de fora" do edifício é toda a comunidade. Como é que Wallace sabe que são tiros disparados por "opositores políticos de Tarcísio"? A fala é muito grave, e ele tem de prestar contas à polícia. Ou conhece os autores ou está se dedicando ao baixo proselitismo, prejudicando, entendo, um empreendimento meritório.

Quem são esses "adversários políticos", senhor Wallace? É de domínio público que o PCC tem forte presença na Comunidade de Paraisópolis. Sejamos óbvios: se o crime não quisesse ali a escola, não se teria levantado nem o primeiro tijolo — e não estou sugerindo nenhuma associação indevida do empreendimento com os criminosos. Assim, que razão haveria para atentar contra o dito-cujo? Wallace deve explicações. Ou tem de retirar o que disse. Ou, ainda, de dizer que foi mal interpretado.

À imprensa, afirmou o general João Camilo Pires de Campos, secretário de Segurança Pública de São Paulo:
"É prematuro dizer isso [se tratar de um atentado] com os dados que temos".

Câmeras de segurança de estabelecimentos próximos, imagens de cinegrafistas que acompanhavam a agenda de Tarcísio e "bodycams" dos PMs serão usadas nas investigações — aquelas "bodycams" com as quais o candidato quer acabar se eleito — proposta absurda, que afronta os fatos e os direitos humanos.

Qual é uma das hipóteses da polícia? A região estava com seguranças de Tarcísio armados até os dentes. Pode, sim, ter havido algum desentendimento com soldados do crime que estavam de olho na movimentação. O primeiro entrevero teria se dado com policiais à paisana que faziam a segurança do candidato. O coronel Ronaldo Miguel Vieira, comandante-geral da Polícia Militar, afirmou que o tiroteio teve a participação de ao menos oito homens que rondavam o local em motos. Um dos supostos criminosos foi morto.

Que o Ministério Público acompanhe a apuração de muito perto. Faz sentido uma escaramuça entre criminosos e homens armados que garantia a segurança de Tarcísio na visita a Paraisópolis. Ou pode ter havido ainda um confronto entre bandidos que acabou engolfando a turma que protegia Tarcísio. Mas atentado? Ataque de adversários? Isso é sandice.

Até porque, convenham, se o PCC, com forte presença em Paraisópolis, não quisesse a vitória de Tarcísio, um "atentando" malsucedido se afiguraria um excelente reforço à campanha de... Tarcísio! Ademais, estaria conferindo verossimilhança ao discurso mentiroso de Bolsonaro.

Tudo indica que não se tratou de um ato político, à diferença do que afirmou Tarcísio. Se, no entanto, político foi, não deve ter partido dos que se opõem ao candidato ou a Jair Bolsonaro, né? Afinal, isso só desviaria água para o moinho da dupla. Seria estúpido. Há mais: tudo o que o crime não quer é a polícia circulando pela comunidade, conduzindo investigações.

Pode ter sido um "atentado", mas daqueles à moda do Odorico Paraguaçu. Quando queria agir contra seus adversários, ele mesmo mandava pichar: "Odorico é ladrão".

Num ambiente crispado como o que vivemos, em que pessoas podem morrer em razão de suas escolhas políticas, fazer o que fez o candidato, sugerindo ter sido alvo de um ataque político, é espantoso. Se eleito, que governe o Estado com mais responsabilidade.

Encerro: "Então você acha que foi armação?" Eu acho que é preciso investigar. A exploração política que se tentou fazer — e isso inclui Tarcísio — é, sim, armação, ainda que não tenha nada a ver com o episódio na sua origem.

Nota: Tarcísio recua do que escreveu no Twitter e agora diz que episódio de Paraisópolis diz respeito a questão territorial — entre criminosos —, não a atentado. Logo, ele dá razão ao que escrevi: ele não foi atacado. Resta agora que Wallace Rodrigues retire o que disse.

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