segunda-feira, 10 de outubro de 2022

Mesmo podendo perder, Bolsonaro já chantageia STF com ilegalidade confessa


Bolsonaro manipulando uma arma em uma das expressões de sua tara armamentista. E o prédio do Supremo, que ele quer atingir com balas oriundas do Legislativo Imagem: freepik; Reprodução; Divulgação

O presidente Jair Bolsonaro deixou claro, em entrevista concedida à "Veja", que, se eleito, vai pôr em debate a elevação do número de ministros do Supremo. Seguiria, assim, a trilha da ditadura militar de 64 e de Hugo Chávez, como já mostrei aqui. Em entrevista à GloboNews, o vice-presidente Hamilton Mourão, eleito senador pelo Rio Grande do Sul, deu outros detalhes do plano: definir mandato para membros do tribunal, impor aos magistrados restrições para decisões monocráticas e facilitar a cassação de membros da Corte por supostos crimes de responsabilidade.

E, em todos esses casos, eles esperam que os ministros fiquem inermes, aceitando a degola das instituições e a transformação do STF em puxadinho do Planalto. Seria o roteiro certo para um novo patamar da crise e para a volta da ameaça da intervenção militar. E, como o esperado, há dublês de canalhas e pensadores que se mostram muito preocupados com o autoritarismo da Frente Ampla... Para estes, o bolsonarismo estaria esculpindo o Moisés da democracia. Bastou um resultado meio apertado nas urnas para que certas vocações se revelassem aquilo que sempre foram por baixo do glacê da impostura letrada. Adiante.

Falando ontem a um canal do YouTube, o presidente e candidato demonstrou que, no fundo, tem uma boa alma. Não quer briga com ninguém. Basta que lhe façam as vontades, e o resto se acerta. Afirmou:
"Se eu for reeleito e o Supremo baixar um pouco a temperatura... Já temos duas pessoas garantidas lá [Kassio Nunes Marques e André Mendonça], tem mais gente que é simpática à gente [...]. Tem mais duas vagas para o ano que vem, talvez você descarte essa sugestão".

A corrosão institucional vai se dando assim, como se vê. O chefe do Executivo, sem nenhum pudor, diz "ter duas pessoas garantidas" no tribunal. E isso já não causa estupefação. Grave mesmo, entendem os valentes, é Lula não apresentar um plano bem detalhado de governo quando o Orçamento enviado ao Congresso é uma peça de ficção. E Bolsonaro avançou, naquele seu estranho idioma:
"Se não for possível descartar, você vê como é que fica. Você tem que conversar com o Senado também [para] a aprovação de nomes. Você tem que conversar com as duas Casas [sobre] a tramitação de uma proposta nesse sentido".

Pergunta-se: ele realmente tem uma proposta fundamentada para aumentar o número de ministros do Supremo? Ora, são os mesmos fundamentos da ditadura militar em 1965, quando, por intermédio do AI-2, ampliou-se de 11 para 16 o número de membros da Corte. Ou os de Chávez para repetir o feito na Venezuela em 2003. O objetivo é controlar o Poder Judiciário.

BOLSONARO CONFESSA A INCONSTITUCIONALIDADE DA PROPOSTA!
Na conversa, ele imagina a resistência do Supremo e especula que os ministros se mobilizariam contra a mudança:
"E está na cara que muita gente do Supremo vai para dentro da Câmara e do Senado [com posição] contrária [à proposta], porque, se você aumenta o número de ministros do Supremo, você pulveriza o poder deles. Eles passam a ter menos poder, e lógico que não querem isso".

Pronto! Está clara a intenção, a mobilização e o intento. A propósito: caso Lula vença a eleição, a intenção continua de pé? Como Bolsonaro é muito ignorante e vive mal cercado, não se dá conta de que um texto dessa natureza, dadas as suas próprias palavras, já nasce marcado pelo desvio de finalidade: como ele deixa claro, o objetivo não é garantir mais funcionalidade ao Supremo, mas "pulverizar o poder deles". A "pulverização do poder deles" tem como consequência a ampliação do seu próprio poder.

Os ministros não precisariam fazer lobby na Câmara e no Senado contra uma PEC com esse conteúdo. Bastaria declarar a sua escancarada inconstitucionalidade. Viola, à partida, o Artigo 2º da Carta, que define:
"São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário".

Bolsonaro, que afirma já ter dois prepostos na Corte, fala sobre os outros a indicar, se reeleito, e passa a especular com a ampliação do número de ministros para que ele próprio possa concentrar mais poderes.

Quanto ao roteiro golpista de Mourão, parece que o senador eleito e ainda vice-presidente da República ignora que a rotina de trabalho do Supremo e as atribuições e competências que não estão explicitadas na Carta se encontram no Regime Interno do tribunal, recepcionado pela Constituição com a força de lei. E não será o senador Mourão a dar pitaco no texto. Essa gente não quer governar o Brasil, mas dar continuidade à desordem inaugurada em 2019.

Como não há temperatura a baixar e como Bolsonaro, se reeleito, dá como certa a subserviência de seus quatro prepostos, suponho que os outros sete permaneceriam com a coluna ereta, hipótese em que ele tentaria, então, engendrar o seu golpe pela via legislativa. Os setores bolsonaristas da elite brasileira podem insistir no caminho do caos. Cuidado! Há o risco de serem eleitoralmente bem-sucedidos e de comemorar a vitória antes do abismo.

À noite, falando a jornalistas, referindo-se de novo à ampliação do STF, tentou parecer mais manso, o que ele nunca é:
"Essa não é a ideia nossa, mas [após] uma boa conversa com a senhora Rosa Weber, presidente do Supremo Tribunal Federal, eu entendo que a gente sai pacificado".

O que é uma "boa conversa"?

Ora, ele já tinha deixado claro: o Supremo "baixar a temperatura".

O que é "baixar a temperatura"?

Ora, ele já tinha deixado claro: os ministros todos se comportarem como Nunes Marques e André Mendonça.

O que são, para ele, esses ministros?

Ora, ele já tinha deixado claro: suas "duas pessoas garantidas".

ENCERRO
E a confiabilidade das urnas? Ele não quis tratar do assunto. Afirmou que a questão está com o mudo ministro da Defesa. E esse, hein? Não vai dizer nada? Aguarda o resultado do segundo turno para se posicionar? Não. Bolsonaro não desistiu de tornar as eleições brasileiras, de novo, sujeitas a fraudes:
"As informações que eu tenho são que, em qualquer sistema informatizado, você nunca vai ter uma garantia 100% de confiabilidade. O ideal, que eu tenho ouvido falar, deixa para o futuro, é nós voltarmos o voto impresso, mas deixo bem claro: deixa para o futuro isso daí".

"Informações"? Quais? De quem? É verdade: sistema com "100% de confiabilidade" é aquele em que se contam votos na unha.

É espantoso! O cara insiste em pôr fim à única coisa no Brasil que funciona cem por cento, juntando eficiência e rapidez.

Não fosse assim, Bolsonaro não seria presidente.

Nenhum comentário: