A ameaça golpista aconteceu.
Só divirjo num ponto com a apuração do Estadão, que fez muito bem em publicar a reportagem. Quando Arthur Lira (PP-AL) foi a Jair Bolsonaro para dizer que o presidente poderia contar com ele até fim, ganhando ou perdendo, mas não para uma aventura golpista, em vez de o presidente ter negado o conteúdo ameaçador oriundo do ministro da Defesa, ele o endossou.
A propósito: no dia seguinte à ameaça recebida por Lira, o próprio presidente foi a público para afirmar que, sem voto impresso, não haveria eleições.
Vamos lá. Lira e o centrão são, no geral, malvistos na e pela imprensa? Fato que dispensa comprovação. Com alguma frequência, generais fora do lugar despertam mais simpatias porque dotados de suposta honestidade de propósito e de alguma pureza. Huuummm. Há quem se deixe seduzir intelectualmente pela pureza do uniforme e do coturno. Não é o meu caso.
A verdade é que Lira deu um nó na turma do intervencionismo, que contava atraí-lo para a patuscada do voto impresso, instrumento a que Bolsonaro pretende recorrer para jogar o país num impasse caso seja derrotado nas urnas.
Não conseguiu. Não só o presidente da Câmara deixou claro que o Bolsonaro não deveria contar com ele para qualquer aventura golpista como o advertiu para a rápida erosão de sua base de apoio. Ele contava encostar Lira contra a parede, com sua truculência habitual e sua estupenda inexperiência política, a despeito dos quase 30 anos de Câmara.
E Lira o fez ver que o condomínio governista estava se trincando e que não era um mágico. O episódio do Fundo Eleitoral, quando o Planalto jogou a sua própria incompetência no colo do vice-presidente da Câmara, Marcelo Ramos, fez Bolsonaro perceber o tamanho do seu isolamento.
Mas Lira fez mais do que começar a costurar — com a posterior entrada em campo de Fábio Faria — a troca da Casa Civil. Ele também plantou algumas defesas sobre as malignidades que haviam chegado a ele. Os que quiserem que o neguem à vontade — e isso inclui o próprio Lira. E, no entanto, aconteceu: ministros do STF e parlamentares que contam ficaram sabendo da ameaça.
Fux não chamou Bolsonaro ao palácio no dia12 só para dizer que ameaça às eleições é coisa de gente feia e boba. Também não tentou por acaso uma reunião entre os Três Poderes, o que acabou por não acontecer. Os interlocutores sabiam, àquela altura, o que sabiam.
Há um braço de ferro entre o centrão e os milicos de pijama do governo? Há, sim. Ocorre que o pijama tem mais trânsito com os da ativa do que parece, o que é uma aberração. Se me perguntarem se eu prefiro a coordenação política com um cara que comandava tropas até anteontem ou com um senador — no caso, Ciro Nogueira —, mesmo sendo do centrão, darei a resposta de qualquer pessoa sensata: se essas são as alternativas, então eu prefiro com o centrão, ainda que eu possa pensar coisas não muito boas sobre essa gente.
A razão elementar é uma só: o centrão pode sair pelo voto; milico só sai com tiro. E a democracia comporta eleições, mas não guerra armada.
Goste-se ou não, Braga Netto tentou encostar o presidente da Câmara contra a parede — e o centrão foi adicionalmente demonizado no caso do Fundo Eleitoral —, e acabou que Luiz Eduardo Ramos, um general, deixou a coordenação política.
Só para lembrar: em sua nota, o ministro da Defesa nega a ameaça golpista, mas não se furta a tecer considerações obtusas e impróprias sobre o voto impresso, como se fosse essa a sua função.
Ainda há muitos militares fora do lugar. A começar por Braga Netto.
Que vá jogar dominó.
Por Reinaldo Azevedo
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