Impossível enxergar a olho nu traços de racionalidade na estratégia adotada por Jair Bolsonaro na disputa municipal de 2020. O presidente sai do processo eleitoral menor do que entrou.
Bolsonaro não pode atribuir o infortúnio senão a si mesmo. Exerceu na sua plenitude a prerrogativa de construir o seu próprio caminho para o vexame. Deu os primeiros passos no ano passado, quando deixou o PSL chutando a porta.
Sem partido, Bolsonaro fez escolhas suprapartidárias. Nas capitais, apoiou meia dúzia de candidatos. No geral, abraçou-se a afogados. E não teve força para içar seus favoritos. Em alguns casos, funcionou como bola de ferro.
Numa disputa em que o eleitor premia políticos bem avaliados na gestão da pandemia, a pregação do presidente contra a "turma do fique em casa" perdeu o prazo de validade.
A polarização de 2018 foi substituída por uma busca pela eficiência possível. Em 2020, o nós contra eles foi substituído pelo "eu e as minhas necessidades." O eleitor decidiu cometer erros diferentes.
Eleito como adepto do presidencialismo sem coalizão, Bolsonaro tinha no PSL o seu esteio. Imaginou-se que aproveitaria os primeiros meses no Planalto para engordar o partido. Mandou expulsar desafetos. E não atraiu um mísero parlamentar.
Na Câmara, o presidente dispunha dos votos dos 53 deputados do partido. Ao tomar o caminho da porta de saída, foi seguido por apenas 19 deputados. Trocou o apoio de 100% pela lealdade de 35,8%. Terminou no colo do centrão.
Obcecado pela ideia da reeleição, Bolsonaro deveria ter aproveitado a eleição municipal para consolidar o PSL nas principais cidades do país. A legenda dispõe de dinheiro e tempo de propaganda no rádio e na TV.
Juntos, o fundo partidário (R$ 113,9 milhões) e o fundo eleitoral (R$ 245,2 milhões) do partido somam R$ 359 milhões. Em vez de se entender com a legenda que cresceu na sua aba, Bolsonaro criou um sururu. Ficou sem bancada e sem dinheiro.
O presidente tentou criar seu próprio partido, o Aliança pelo Brasil. Não conseguiu. A disputa municipal de 2020 seria uma oportunidade para estruturar uma máquina partidária nacional, equipando-se para 2022. Mas Bolsonaro não costuma perder oportunidade de perder oportunidades.
Apostou suas fichas no personalismo. No Congresso, ficou dependente do centrão. Na briga municipal, apequenou-se. Na sucessão de 2022, sua competitividade será proporcional aos resultados que for capaz de exibir, sobretudo na economia.
Na bica de completar dois anos, o governo Bolsonaro ainda é um conjunto de promessas pendentes de confirmação.
Por Josias de Souza
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