sexta-feira, 3 de novembro de 2023

Caso sobre a agressão a Moraes fica parecido com sinuca viciada



Patrono da advocacia brasileira, Rui Barbosa dizia que "a força do Direito deve superar o direito da força." Por esse raciocínio, límpido como água de bica, algo vai mal no inquérito que apura a agressão que Alexandre de Moraes diz ter sofrido de bolsonaristas no aeroporto de Roma, em 14 de julho. Relator do caso no Supremo, Dias Toffoli incluiu Moraes como assistente de acusação no inquérito. Significa dizer que a vítima poderá sugerir procedimentos à Polícia Federal ou até inquirir testemunhas.

Em recurso, a Procuradoria-Geral da República pediu ao Supremo que revogue o "privilégio de natureza pessoal" concedido por Toffoli ao amigo Moraes. Algo que "não tem precedente". Para a PGR, a fome de Moraes de atuar como assistente de acusação só pode ser saciada se o inquérito virar denúncia e se os acusados se tornarem réus em ação penal. Permitir que isso ocorra no estágio inicial da investigação é "inconstitucional" e "incompatível com o princípio republicano".

Moraes disse ter sido xingado de "bandido, comunista e comprado" por Andreia Munarão. O ministro sustenta que Roberto Mantovani, marido de Andreia, deu um tapa no rosto do seu filho. O casal nega as acusações. Vídeo enviado da Itália permitiu à PF concluir que Andréa e Roberto tiveram "atitude hostil e agressiva". A hostilidade desencadeou "uma discussão" com o filho de Moraes, com "aparente agressão física". No mês passado, Toffoli deu mais 60 dias à PF para refinar o inquérito. Manteve o vídeo sob sigilo. A Procuradoria cobra transparência.

Agressões e hostilidades, se comprovadas, exigem punição. Mas o Supremo precisa ouvir Rui Barbosa. Abstraindo-se as dúvidas levantadas pela PGR sobre a legalidade do papel concedido por Toffoli a Moraes, o desejo de auxiliar a acusação passa a impressão de que a suprema vítima não confia no trabalho da Polícia Federal.

De resto, o inquérito vai ganhando a indesejável aparência de uma sinuca viciada. Os investigados, pela bola sete, jogam contra o dono da mesa, com as regras e os tacos da casa —e com o ministro-relator apostando no adversário. Ou o Supremo dá meia-volta ou restará a impressão de que "a força do Direito" foi encaçapada pelo "direito da força.".

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