sexta-feira, 29 de setembro de 2023

Bolsonarismo, o sujeito oculto da posse de Barroso no STF



Foi a ministra Rosa Weber, ao despedir-se ontem do Supremo Tribunal Federal, quem disse: “Não somos onze ilhas”. A crítica mais comum que se faz ao tribunal é a de que cada ministro é uma ilha, com suas próprias leis e vontades. Daí a insegurança jurídica que suas decisões provocam.

Um dos prodígios do desgoverno de Bolsonaro nos últimos quatro anos foi justamente o de unir os ministros do tribunal, à exceção de dois: Kassio Nunes Marques e André Mendonça, nomeados pelo ex-presidente que se tornou inelegível. No mínimo, hoje, os outros nove formariam uma espécie de arquipélago.

A ameaça de a democracia dar lugar a um regime autoritário sob o comando de Bolsonaro e dos militares de volta ao poder sem disparar um só tiro, aproximou os ministros que passaram a atuar em bloco desde meados de 2021, pelo menos. Naquele ano, Bolsonaro tentou dar um golpe no dia 7 de setembro.

Tinha o apoio dos comandantes do Exército, Marinha e Aeronáutica. O golpe acabou abortado pela reação do Supremo, à época presidido pelo ministro Luiz Fux. Na ocasião, o Supremo entrou em estado rigoroso de prontidão que desestimulou o golpe planejado para dezembro e enfraqueceu o de 8 de janeiro.

É emblemática a imagem registrada na noite do dia 9: Lula, governadores de Estado, ministros do governo e os ministros Rosa Weber, Luís Roberto Barroso e Dias Toffoli, lado a lado, saindo do Palácio do Planalto e atravessando a Praça dos Três Poderes para visitar a sede semidestruída do Supremo.

Natural, portanto, que a posse de Barroso como novo presidente do Supremo servisse para celebrar a vitória da democracia. Ela esteve presente em todas as bocas, especialmente nas de Barroso, Gilmar Mendes, o decano do tribunal, e Rosa, de saída definitiva. O sujeito oculto das falas não teve seu nome citado, nem precisava.

Rosa:

“O Dia da Infâmia [8 de janeiro] há de ser sempre lembrado como propulsor do fortalecimento do nosso estado democrático de Direito em um renovar de energias diante da união e resposta imediata e firme dos Poderes e da sociedade civil à vilania praticada e na contramão do que pretendia aquela horda hostil”.

Gilmar:

“Naqueles tempos de calmaria e normalidade, a continuidade [do tribunal] era um dado. Meses atrás, era por muitos considerada uma dúvida. Essa Corte suportou, durante um par de anos, as ameaças de um populismo autoritário”.

Por tudo isso que se viu e se viveu, a presente cerimônia simboliza mais do que a continuidade de uma linhagem sucessória institucional. Ela assume um colorido novo. A posse de Vossa Excelência [Barroso] torna palpável a certeza de que, sim, o Supremo Tribunal Federal sobreviveu.”

“A atual ordem constitucional sabe se defender, seja de golpismos explícitos, seja de erosões autoritárias como aquela sistematicamente conduzida em 2022 contra o sistema eleitoral”.

“Vivemos um tempo que requer compromisso inequívoco dos três Poderes em favor da Constituição. Será fatal para os Poderes constitucionais a dúvida, a hesitação”.

Barroso:

“Em todo o mundo a democracia constitucional viveu momentos de sobressalto, com ataques às instituições e perda de credibilidade. Por aqui, as instituições venceram tendo ao seu lado a presença indispensável da sociedade civil, da imprensa e do Congresso Nacional. E justiça seja feita: na hora decisiva, as Forças Armadas não sucumbiram ao golpismo”.

“Um país não é feito de nós e eles, somos um só povo. A democracia venceu e precisamos trabalhar para a pacificação do país”.

“Numa democracia não há Poderes hegemônicos. Garantindo a independência de cada um, conviveremos em harmonia, parceiros institucionais pelo bem do Brasil”.

Nenhum comentário: