terça-feira, 18 de junho de 2019

Filhos de Bolsonaro nomearam presidente do BNDES. E a fala torta do general



O engenheiro Gustavo Montezano, de 37 anos, com mestrado em economia, foi nomeado presidente do BNDES. É um profissional de mercado financeiro respeitado por aqueles de sua geração na área de crédito. Tem a aprovação até de uma turma já mais madura. Mas apresenta currículo para presidir o BNDES, o maior banco de fomento do gênero no mundo? A resposta unânime é "não". Vai dar certo? Não sei. Chegou lá por maus propósitos. Vai abraçá-los? A ver.

Uma coisa é certa: ele aceita cumprir "missões" meramente políticas num cargo técnico. E uma das que lhe foram atribuídas é levar adiante a caça às bruxas em gestões passadas no banco, muito especialmente a petista. Mais ainda: há um fato que está sendo subestimado no noticiário: trata-se de uma indicação não de Salim Mattar, secretário de Desestatização, de quem era segundo. Também não é uma escolha de Paulo Guedes, ministro da Economia.

FALA TORTA DE RÊGO BARROS 

Quem nomeou Montezano foram os filhos de Jair Bolsonaro. A amizade vem ali da pós-infância, da primeiríssima juventude. Ou por outra: teremos, sim, um BNDES com viés ideológico. Os filhos o escolheram para ser o segundo de Mattar, e dali ele pulou para o BNDES. É tecnicamente ruim? Depende para quê. Já chego lá. Atenho-me antes à fala do general Rêgo Barros, porta-voz de Bolsonaro. Prestem atenção: 
"O presidente tem, por concepção pessoal, naturalmente, a percepção de que eventuais pessoas que tenham participado de governos que colocaram o Brasil nessa situação catastrófica em que se encontra não devem compartir conosco a possibilidade de promover a melhoria do Brasil. É nesse contexto que o presidente trabalha. Por outra vertente, a escolha das pessoas que hão de dirigir os vários órgãos do governo do presidente Bolsonaro é nitidamente, e vocês já perceberam isso, dentro de um caráter técnico. Então, sendo um caráter técnico, o próprio substituto do Joaquim Levy, agora se apresentando, Gustavo Montezano, corrobora essa percepção do senhor presidente."

Há vários problemas na declaração de Rêgo Barros. Um deles é o próprio Régo Barros, um general de divisão da ativa. Quando ele usa a primeira pessoa do plural, como em "conosco", não se sabe se fala apenas do governo ou também das Forças Armadas. Em segundo lugar, mas não menos importante, cumpre destacar: Joaquim Levy já era Joaquim Levy quando foi escolhido para o comando do banco. Tinha servido à primeira gestão Lula como secretário do Tesouro (2002 a 2006) e ao primeiro governo Sérgio Cabral como secretário da Fazenda (2007-2010). Não colaborou com catástrofe nenhuma nem num caso nem noutro.

LEVY E O FUZILAMENTO DE FHC 

No governo FHC, foi secretário-adjunto de Política Econômica do Ministério da Fazenda; em 2001, economista-chefe do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão. Eram tempos em que Bolsonaro defendia o fuzilamento do então presidente em razão das privatizações. Quem, afinal, queria destruir o Brasil então? É professor de Economia, já trabalhou no FMI, no Baco Interamericano de Desenvolvimento e no Banco Mundial.

Meter Levy no saco de gatos pardos de pessoas que "participaram de governos que colocaram o Brasil numa situação catastrófica" é, antes de mais nada, uma mentira. Além de ser, obviamente, um desrespeito. Desrespeito que se estende a Marcos Barbosa Pinto, que havia sido escolhido por Levy para assumir a diretoria de Mercado de Capitais do banco.

ALGUNS "NOMES TÉCNICOS" DE BOLSONARO 

A propósito, encaixam-se no critério de competência técnica, alardeado pelo porta-voz, os ministros Abraham Weintraub, da Educação; Ernesto Araújo, das Relações Exteriores; Damares Alves, das Mulheres, Família e Direitos Humanos; Ricardo Salles, do Meio Ambiente? Em todos esses casos, o chamado "viés ideológico" precede a competência e a experiência. Certamente a iniciativa privada de alta performance não os contrataria para um cargo de comando, não é mesmo?, como o Bradesco já contratou Levy. Então vamos com calma! Um pouco mais de respeito com a biografia alheia.

Tomara que Montezano se dê bem no cargo. O começo é torto. É visto pelo mercado como um bom analista de crédito. Talvez não haja quadro no BNDES com a sua expertise nessa área. Mas também há vozes graduadas que o consideram politicamente ingênuo. E aí sempre mora o perigo em área tão delicada. Certamente está calçando um sapato que, em princípio, é muito maior do que o seu pé. "Sapato não encolhe, e pé não cresce depois de certa idade, Reinaldo". Sim, é verdade. Estamos no terreno da metáfora, não é?, do simbolismo. Se assumir o cargo para ter um desempenho técnico, como promete o porta-voz, o pé pode expandir-se para a adequar-se ao sapato. Mas ele pode fazer o contrário, forçando o calçado a adaptar-se a seu tamanho. Aí os brasileiros é que vão pagar o pato pelas amizades dos filhos presidente de turno.

Por Reinaldo Azevedo

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