Reunido com os chefes dos outros dois Poderes, em 28 de maio, Jair Bolsonaro olhou para o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, e declarou: "Com a caneta, eu tenho muito mais poder do que você, apesar de você fazer as leis. Eu tenho o poder de fazer decretos." Na noite desta terça-feira (18), o Senado inaugurou a resistência à decretocracia idealizada por Bolsonaro. Por 47 votos a 28, os senadores aprovaram projeto de decreto legislativo que derruba decreto editado pelo presidente da República para flexibilizar a posse e ampliar o porte de armas no Brasil.
O projeto será remetido para a Câmara. Ali, Rodrigo Maia comanda uma articulação para confirmar o resultado do Senado, impondo uma derrota à Bic de Bolsonaro. O capitão não se deu por vencido. Consumada a coronhada dos senadores, ele anotou nas redes sociais: "Esperamos que a Câmara não siga o Senado, mantendo a validade do nosso decreto, respeitando o referendo de 2005 e o legítimo direito à defesa." Não há, por ora, sinais favoráveis ao Planalto. Ao contrário, esboça-se na Câmara uma aliança dos partidos do centrão com a oposição para derrotar o capitão.
Ironicamente, muitos dos parlamentares que trabalham contra os decretos são favoráveis à flexibilização da posse a até do porte de armas. Discordam, entretanto, da forma adotada por Bolsonaro para cumprir sua promessa de campanha. Avaliam que o presidente não pode modificar uma lei —o Estatuto do Desarmamento— por meio de decreto. Deveria ter enviado ao Congresso um projeto de lei. Os próprios presidentes da Câmara e do Senado cogitam estimular a tramitação de propostas sobre o tema. Há projetos à disposição na Câmara.
Afora a movimentação do Legislativo, o Supremo Tribunal Federal também se debruça sobre o ímpeto armamentista de Bolsonaro. Há na Corte cinco recursos contestando a ampliação do porte de armas por decreto. O julgamento está marcado para quarta-feira (26) da semana que vem. Se a Câmara não se apressar, pode ser superada pela Suprema Corte. É grande a chance de o Supremo tachar de inconstitucional o decreto do presidente.
Num gesto paradoxal, Bolsonaro criticou o Supremo dias atrás por equiparar a homofobia ao crime de racismo. Acusou os magistrados de "legislar", invadindo a seara do Congresso. Agora, está na bica de ser enquadrado por ter usurpado a atribuição dos parlamentares ao impor por decreto providências que não poderiam ser adotadas senão por meio de projetos de lei. Vai ficando entendido que, com seis meses de mandato, a Bic do capitão dispõe de muita tinta. Mas não pode tudo.
Por Josias de Souza
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