sábado, 22 de junho de 2019

Mentira feia a senadores: Tessler deixa caso Lula 2 dias após Moro reclamar


Laura Tessler: dois dias depois de Moro criticar seu desempenho, ela já não
participava mais de processo que tinha Lula como réu.O ex-juiz escolhia os
 acusadores… (Foto: Reprodução)

Resolvi seguir uma sugestão de Deltan Dallagnol, coordenador da Lava Jato, e, ora vejam, cheguei a novas evidências do teor mentiroso de sua nota malcriada, divulgada nesta sexta. Seja paciente, leitor. Leia a coisa até o fim. Você pode não descobrir exatamente como se fazem as salsichas. Mas vai saber como se fabricam certas notícias. Ou "notícias", com aspas, como poderia escrever o buliçoso rapaz. Você vai constatar que a procuradora Laura Tessler foi afastada do caso que dizia respeito ao ex-presidente Lula DOIS DIAS DEPOIS DE SERGIO MORO RECLAMAR DE SEU DESEMPENHO.

Influente que é em certos meios, Dallagnol conseguiu emplacar a sua nota mistificadora no "Jornal Nacional" e no "Jornal da Globo", que levaram ao ar contestações àquilo que ninguém disse, uma vez que não havia e não há resposta para aquilo que se disse. Explico tudo. Antes, um pouco de contexto. 

É longo. Mas enfrente o texto até o fim.

O QUE AFIRMOU MORO AO SENADO E OS FATOS 
Revelei neste blog e no programa "O É da Coisa", da BandNews FM, que não procedia a afirmação do ministro Sérgio Moro, em depoimento à CCJ do Senado, na quarta, segundo a qual a sua restrição ao trabalho de Laura Tessler, revelada pelo site "The Intercept Brasil", fora inócua. Como vocês devem se lembrar, em mensagem a Dallagnol, Moro reclamara do desempenho de Laura. A interferência é escandalosamente ilegal porque não cabe a um juiz orientar o trabalho da defesa ou da acusação. Ao fazê-lo, Moro se comportava como aquilo que ainda é: o real coordenador da força-tarefa.

Muito bem! Diálogo então inédito entre Dallagnol e o também procurador Carlos Fernando, publicado na quinta por este escriba, demonstrava que o coordenador oficial da força-tarefa passara a seu colega as críticas feitas por Moro ao trabalho de Laura e que os dois acertaram que ela ficaria fora do caso Lula. E ficou. E a ação foi fulminante. 

A nota de Dallagnol, cujos trechos ganharam destaque nos dois noticiários da Globo, negava que a procuradora houvesse sido afastada da Lava Jato. Contestava-se o não-dito. Escrevi com todas as letras: "Laura Tessler não foi expulsa da Lava Jato". Eram esforços conjugados para esconder os fatos.

Agressivo e grosseiro como de hábito, chamando-me de "blogueiro" — como se eu devesse tomar isso como ofensa (ele já me chamou de "jurista", com aspas, em seus diálogos com Moro que incidem em ilegalidades) —, Dallagnol sugeriu que eu fosse consultar os processos. E eu fui. E essa consulta torna ainda mais estúpida a sua nota. Não sei se ele engabelou os dois programas jornalísticos ou se houve uma parceria contra os fatos. Já chego ao produto da minha pesquisa nos autos. Antes, é preciso relembrar os diálogos e a data.

OS DIÁLOGOS 
No dia 13 de março de 2017, Moro escreve a Dallagnol: 

Moro – 12:32:39. – Prezado, a colega Laura Tessler de vcs é excelente profissional, mas para inquirição em audiência, ela não vai muito bem. Desculpe dizer isso, mas com discrição, tente dar uns conselhos a ela, para o próprio bem dela. Um treinamento faria bem. Favor manter reservada essa mensagem.

No mesmo dia, em seguida, Dallagnol procura Carlos Fernando: 

12:42:34 Deltan Recebeu a msg do moro sobre a audiência tb? 
13:09:44 Não. O que ele disse? 
13:11:42 Deltan Não comenta com ninguém e me assegura que teu telegram não tá aberto aí no computador e que outras pessoas não estão vendo por aí, que falo
13:12:28 Deltan (Vc vai entender por que estou pedindo isso) 
13:13:31 Ele está só para mim. 
13:14:06 Depois, apagamos o conteúdo. 
13:16:35 Deltan Prezado, a colega Laura Tessler de vcs é excelente profissional, mas para inquirição em audiência, ela não vai muito bem. Desculpe dizer isso, mas com discrição, tente dar uns conselhos a ela, para o próprio bem dela. Um treinamento faria bem. Favor manter reservada essa mensagem.

13:17:03 Vou apagar, ok? 
13:17:07 Deltan apaga sim 
13:17:26 Apagado. 
13:17:26 Deltan Vamos ver como está a escala e talvez sugerir que vão 2, e fazer uma reunião sobre estratégia de inquirição, sem mencionar ela 
13:18:11 Por isso tinha sugerido que Júlio ou Robinho fossem também. No do Lula não podemos deixar acontecer. 
13:18:32 Apaguei

Reitero: como resta escancarado, e foi o que informei na quinta, Deltan repassa a Carlos Fernando mensagem de Moro com críticas ao trabalho de Laura, e a dupla de procuradores começa a tomar providências para afastar a colega do caso. A reação foi rápida. E isso não tem contestação. Aquilo a que os dois jornalísticos da Globo deram destaque, em parceria com Dallagnol, contestava o que ninguém afirmou, mas buscava passar a impressão de que a força-tarefa estava desmentindo o jornalista — embora os noticiosos não tenham citado o autor da matéria. Atribuíram-na ao site "The Intercept Brasil", o que é mentira. Também isso não muda o fato. Já foi o tempo em que comício em favor das diretas virava comemoração do aniversário de São Paulo.

REVELAÇÃO QUE NASCE DA CONSULTA AOS AUTOS: FATOS ANTECEDENTES 
Como se nota acima, as trocas de mensagens ocorreram no dia 13 de março de 2017. Pergunta: o que teria acontecido antes para deixar o então juiz Sergio Moro descontente com Laura Tessler, levando Dallagnol e Carlos Fernando a temer por seu mau desempenho da procuradora no caso Lula? 

É o que se vai ver agora.

FATOS ANTECEDENTES 
No dia 10 de março de 2017, uma sexta-feira, Laura participou de uma audiência relativa ao "caso do tríplex" (Processo nº 5046512-94.2016.404.7000), em que figura como acusado, entre outros, o ex-presidente Lula. Na ocasião, foram ouvidas duas testemunhas de defesa do petista: Henrique Meirelles e Luiz Fernando Furlan. Os depoimentos de ambos foram favoráveis ao ex-presidente. A procuradora não fez perguntas às testemunhas. NOTEM: LAURA FAZIA, SIM, PARTE DO CASO DO TRÍPLEX.

No dia 13 de março, data da troca de mensagens de Moro com Dallagnol e deste com Carlos Fernando, Laura havia participado de audiência relativa a outro processo, nos quais figuram como acusados, dentre outros, Antônio Palocci, João Vaccari Neto e Marcelo Odebrecht (Processo nº 5054932-88.2016.404.7000). 

A audiência começou às 9h30. Foram, então, ouvidas como testemunhas de defesa Emilio Odebrecht, José Eduardo Cardozo, Marcio Faria, Ivo da Motta Corrêa e Newton de Souza.

A audiência começou às 9h30. Foram, então, ouvidas como testemunhas de defesa Emilio Odebrecht, José Eduardo Cardozo, Marcio Faria, Ivo da Motta Corrêa e Newton de Souza. 

Segundo a ata, Laura se manifestou pela publicidade dos depoimentos de Emilio e de Faria, o que contrariou Moro, que decidiu "colher os depoimentos, mas manter o sigilo sobre eles até que nova deliberação ou até o levantamento do sigilo pelo Egrégio Supremo Tribunal Federal, seguindo, neste ponto, recente decisão tomada pelo Min. Herman Benjamim no Tribunal Superior Eleitoral".

Encerrada essa audiência, o então juiz pegou o seu celular, entrou no Telegram e detonou o trabalho de Laura em conversa com Dallagnol. 

Depois da mensagem, Laura participou, sim, de audiências no processo envolvendo Palocci, Vaccari, Marcelo Odebrecht e outros (Processo nº 5054932-88.2016.404.7000) — E NINGUÉM DISSE O CONTRÁRIO —, mas jamais voltou a participar de audiências do Processo nº 5046512-94.2016.404.7000: o do tríplex.

AÇÃO FULMINANTE 
No caso do processo contra Lula, foram realizadas audiências em 15/03/2017 (dois dias depois da mensagem de Moro), 20/04/2017, 26/04/2017, 04/05/2017 e 10/05/2017 — quando se deu o interrogatório do ex-presidente. O MPF foi representado em todas elas por Júlio Noronha e Roberson Pozzobon, como havia sido combinado entre Deltan Dallagnol e Carlos Fernando. Este último fez questão de estar presente ao depoimento do petista. Para que nada fugisse do controle. 

E quem presidia a sessão? Ora, Sérgio Moro, aquele que chegou a combinar com Dallagnol até o conteúdo da reação do Ministério Público Federal à peça apresentada pela defesa. 

Como se nota pelas datas, dois dias depois da mensagem de Moro, Laura já estava fora do caso. 

PROVA PROVADA 
Porque se comporta como um militante político e tem o apoio acrítico, quando não ignorante, de parte considerável da imprensa, Dallagnol acha que aqueles que não rezam segundo a sua cartilha —que atenta contra a ordem legal — também estão fazendo política. 

Laura Tessler atuava no Processo nº 5046512-94.2016.404.7000, que diz respeito ao tríplex. Depois das críticas de Sérgio Moro, foi afastada por Deltan Dallagnol. E ele cortou a cabeça da colega sem demora: 48 horas depois, estava fora do caso. 

Esses são os fatos. Quem sabe o Jornal Nacional e o Jornal da Globo se interessem por eles. Mesmo que não ocorra, a verdade segue sendo a verdade, a exemplo daquele comício das diretas…

ENCERRO 
Está aí a evidência de que, à diferença do que disse Moro ao Senado, a procuradora de quem ele reclamou foi excluída do caso Lula dois dias depois. 

Estamos diante da prova cabal de que, no caso, Moro escolheu o acusador em busca do melhor efeito. Mas qual? Um juiz que age assim não pretende que tal acusador o ajude na elucidação da verdade, na busca da verdade material. Seu objetivo, desde sempre, é a condenação do réu. 

Não é um juiz isento, mas um juiz de condenação. 

Fim de papo.

Por Reinaldo Azevedo

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