Mary Zaidan |
Em junho de 2005, quando o escândalo do mensalão tornou-se
uma ameaça real para o então presidente Lula, os jardins de Paris foram
escolhidos para encenar a ficção de defesa dele e dos seus.
Uma repórter desconhecida, perguntas e respostas ensaiadas transmitidas com
exclusividade pelo Fantástico. Produção cuidadosa para dizer ao país que o crime
não passava de caixa 2, delito que todos cometem. Por mais absurdo que possa ser
um presidente da República admitir isso.
Não foi suficiente, mas a tese estava lançada.
Um mês depois, Lula convocou rede de rádio e TV para dizer à nação que fora
traído pelos seus por práticas inaceitáveis – “das quais nunca tive
conhecimento”. Sem oposição para questioná-lo, atravessou a tormenta,
reelegeu-se e elegeu a sua sucessora.
Ao deixar o Planalto, jurou que dedicaria seus dias para provar que os fatos
não eram fatos, que imagens não eram imagens, que o mensalão nunca existiu.
Se o câncer na garganta lhe impôs atraso nos prazos, não lhe tirou a obsessão
de conferir crédito à fantasia que propagara anos atrás. Crê também que é dono e
senhor de todas as cartas, como se presidente fosse. Algo que, definitivamente,
ele não consegue desencarnar. Para Lula, Dilma Rousseff é e continuará sendo
concessão sua.
Foi assim que o ex tratou sua pupila ao responder ao apresentador Ratinho
sobre a possibilidade de ele ser candidato novamente. Primeiro, garantiu que só
seria candidato na hipótese de Dilma não querer ser. Na frase seguinte, avançou
no dito, lançando uma segunda hipótese: “Não vou permitir que um tucano volte ao
poder no Brasil.”
Desta vez, Lula preferiu o Programa do Ratinho, no SBT, terceira emissora no
ranking de audiência. Por quê? Dirão alguns que se trata de um programa popular.
Local certo para apresentar à massa Fernando Haddad, candidato do PT à
Prefeitura de São Paulo. Os 8% de audiência desmentem a premissa.
Foi ali porque ali era possível combinar tudo. Música, emoção, vídeos
escolhidos, campanha eleitoral e um conjunto bem organizado de mentiras do
protagonista que não seriam colocadas em xeque.
Lula disse o que quis do jeito que quis. Mentiu. Da CPMF ao número de escolas
construídas. Até nas rabadas.
Magnânimo, fez pouco caso das denúncias de Gilmar Mendes de que ele, Lula,
tentara coagir o ministro do STF para atrasar o julgamento do mensalão, tema
minimizado por Ratinho - “o povão não entende muito”. Tudo dentro do script.
Lula só derrapou ao confessar sua crença de que o tempo se encarrega de
arrumar as coisas. Um lapso de verdade. Uma aposta que faz para tentar livrar a
si e aos seus das garras do mensalão.
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