Josias de Souza
Se o Brasil fizesse sentido, aproveitaria as oportunidades abertas com as operações Vegas e Monte Carlo para golpear um tentáculo do crime organizado. Como o país nem sempre faz nexo, o Estado brasileiro vai se tornando a oportunidade que o crime aproveita para organizar-se.
O caso do juiz Paulo Augusto Moreira Lima dá ideia do estágio em que se encontra a esculhambação. Era responsável pelo processo que arrancou da sombra Carlinhos Cachoeira e seu bando. Súbito, foi transferido para outra frequesia.
O repórter Felipe Recondo trouxe à luz as razões da transferência. Estão expressas numa carta do magistrado à Corregedoria e à presidência do TRF-1. No texto, o doutor Moreira Lima pede para ser retirado do caso Cachoeira. Por quê? “Por não haver condições adequadas de segurança.”
Conta, por exemplo, o seguinte: “Minha família, em sua própria residência, foi procurada por policiais que gostariam de conversar a respeito do processo atinente a Operação Monte Carlo, em nítida ameaça velada, visto que mostraram que sabem quem são meus familiares e onde moram.”
A Monte Carlo produziu 79 réus, dos quais 35 são policiais (federais, civis e militares). O doutor ordenou o afastamento de todos eles de suas funções. Algo que faz da visita dos policiais à sua residência um caso de polícia.
Instado a comentar a situação de Moreira Lima, o presidente do STF, Carlos Ayres Britto, declarou: “Não se pode ameaçar do ponto de vista da integridade física nem moral e psicológica nenhum julgador e sua família.”
De fato, “não se pode”. Porém, as ameaças não só existem como, às vezes, teimam em se concretizar. Prova-o o recente assassinato da juíza Patricia Acioli, no Rio. “São crônicas de mortes anunciadas”, disse o senador Pedro Taques (PDT-MT), evocando, da tribuna do Senado, o clássico de García Márquez.
Taques contou que a procuradora da República Léa Batista, outra servidora pública que atua na repressão à quadrilha de Cachoeira, também recebeu uma ameaça velada. Chegou-lhe na forma de um e-mail. Comunicou o ocorrido à Procuradoria-Geral da República.
Em meio a esse cenário envenenado, o desembargador Tourinho Neto, do TRF-1, permite-se, segundo Taques, fazer graça. Num de seus despachos, contou o senador, Tourinho ameaçou aceitar pedido de suspeição formulado pelos réus da Monte Carlo contra o doutor Moreira Lima.
“Em tom de deboche, Tourinho Neto disse que o juiz estava próximo de pular o corguinho”, Taques relatou. “Alguns desembargadores vivem na ilha da fantasia dos seus gabinetes, acreditando que o crime organizado não existe. Enquanto isso, os canalhas estão a solapar os princípios fundamentais da República.”
Como se vê, o Brasil precisa começar a fazer sentido. Sob pena de pular o corguinho da esculhambação e tornar a organização do crime irreversível.
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