segunda-feira, 25 de fevereiro de 2019

Editorial do Estadão - O espectro do populismo



O “bolsonarismo” é, por enquanto, apenas uma caricatura mal-ajambrada de movimento populista, desses que de tempos em tempos assombram o Brasil, mas isso não significa que o País possa tranquilizar-se. Ao contrário: a esclerose precoce do governo de Jair Bolsonaro parece ter despertado no presidente o demagogo que ele sempre foi e que se encontrava apenas anestesiado em razão de conveniências políticas. Caso isso se confirme, a recuperação do País, repleta de obstáculos, será seriamente prejudicada, com consequências graves para a solvência do Estado e para a retomada do desenvolvimento. Nem é preciso enfatizar o perigo que um cenário desses representa para a estabilidade do País e mesmo para a ordem social.

São cada vez mais evidentes os sinais de que Bolsonaro, como governante, toma suas decisões não por razões de Estado ou como parte de alguma estratégia política de longo prazo, e sim estimulado pela perspectiva do aplauso fácil e imediato, este que brota de suas fanáticas hostes nas redes sociais – meio de comunicação caótico e irresponsável que Bolsonaro escolheu para se dirigir à sociedade, a título de estabelecer uma “relação direta entre o eleitor e seus representantes”, como disse em seu discurso ao ser diplomado como presidente. Desse modo, Bolsonaro equipara os atos de governo a tuítes tolos e a “memes” engraçadinhos. Nem é preciso mencionar os riscos institucionais que essa prática acarreta – basta lembrar a recente confusão criada pelo presidente e por um de seus filhos no Twitter a respeito de um dos ministros de Bolsonaro, demitido como consequência do imbróglio.

Para os propósitos de Bolsonaro, no entanto, as redes sociais são o meio ideal para confundir a opinião pública, criando uma realidade paralela na qual a gritante falta de traquejo do presidente para o exercício de tão importante cargo seja convertida em qualidade de “homem simples”. Nesse mundo bolsonarista, a falta de um programa claro de governo, em que haja firme compromisso com o progresso consistente e sadio do País, é compensada pela espetacularização das decisões do presidente e de seus ministros. Foi com esse espírito demagógico, por exemplo, que Bolsonaro anunciou recentemente nas redes sociais uma devassa no Ministério da Educação. “Daremos início à Lava Jato da Educação!”, exclamou o presidente no Twitter, para compreensível delírio dos bolsonaristas mais animados, que acham que todos os problemas do País se resumem à corrupção.

A ninguém, contudo, é dado o direito de surpreender-se. Em 1999, este jornal publicou uma entrevista com Bolsonaro na qual o então deputado federal declarou sua admiração por Hugo Chávez, então recém-eleito presidente da Venezuela, dizendo que “gostaria muito que sua filosofia chegasse ao Brasil”. Chávez conquistara o poder denunciando a hegemonia das oligarquias políticas, a degradação dos partidos, a corrupção desenfreada e a falência das instituições – e sobre essas bases ideológicas construiu uma ditadura populista tão sólida que sobreviveu a ele.

Não se pretende, com esse paralelo, sugerir que Bolsonaro possa reencarnar Chávez, mas é importante observar que o presidente brasileiro se elegeu com um discurso semelhante ao do falecido caudilho venezuelano e apresenta a mesma preocupante falta de compromisso com as liberdades democráticas. Seu histórico de defesa da ditadura militar e de supressão de direitos em nome de uma certa “ordem” fala por si, mas é preciso acrescentar ainda o fato de que Bolsonaro pretende resumir seu governo a uma luta do “bem” contra o “mal” – situação que inviabiliza a democracia. Foi assim que, recentemente – pelo Twitter, é claro –, Bolsonaro avisou que haverá “dificuldade” para “tentar consertar tudo isso”, pois “o sistema não desistirá”. Esse “sistema”, presume-se, engloba todos aqueles que discordam de Bolsonaro.

Assim, contando ainda com formidável concentração de poder político, econômico e cultural, resultado de uma vitória eleitoral acachapante e da ausência de uma oposição digna do nome, Bolsonaro e seu entorno parecem ter decidido acelerar sua marcha populista – receita certa para o desastre.

Um comentário:

AHT disse...

SÓ PARA INGLÊS VER. E A REALIDADE? - I

Se, a reforma da previdência for aprovada na íntegra,
Ótimo! Economistas, empresários e os eleitores do

Presidente Bolsonaro, dirão: “As reformas seguintes
Alavancarão de vez o país para o crescimento,
Racionalizando o Estado e, promovendo eficaz combate
Ao crime organizado e suas terríveis consequências.

Investimentos em Infraestrutura, Pesquisas, Saúde e
Na Excelência em Educação tornarão realidades a
Geração de empregos e capacidade de poupança.
Lamentável, mas contrariados existem e, também,
Ênfase midiática em fatos negativos do clã Bolsonaro.
Sagazes opositores se aproveitaram, justamente, de

Vis traições e viciosas atitudes antiéticas e imorais
Envolvendo e gerando dúvidas sobre o próprio clã.
Reações positivas mantém governo no bom rumo”.

E a realidade, nua e crua?

A realidade do início de governo frustra expectativas.

Redes sociais e dá-lhe Twitter e WhastApp. Tuitar
E zapear, passatempos e armas até para Bolsonaro
Atiçar, guerrear com reais e supostos traidores.
Liturgia do cargo? Ao lixo, tal qual mestre Trump faz.
Incendiar, certo que os sensatos apagarão o fogo,
Demonstrando que nada aprendeu de sério e útil
Ao decorrer de anos agitando e polemizando?
Do primeiro milagre, esqueceu? Precisa do segundo?
Edificar o Brasil, com e para todos os brasileiros?



AHT
23/02/2019