Tancredo Neves, o melhor presidente que a doença impediu o Brasil de ter, dizia que "ninguém joga só embaralhando. Tem que dar carta a alguém". Nos últimos dias, Lula dedicou-se a misturar a cena econômica, conturbando-a. Chegou a hora de dar a Fernando Haddad alguma carta que permita ao ministro jogar. O nome do jogo é confiança.
Ao produzir declarações que atiçaram o dólar, Lula fez a festa de especuladores que lucram com a alta da moeda americana. Simultaneamente, flertou com o fator inflacionário, que favorece a alta dos juros. Ao insinuar na semana passada que ainda não estava convencido da necessidade de cortar despesas, seu compromisso com a agenda de Haddad já havia se tornado uma dúvida.
Tudo isso ocorre num momento em que a equipe econômica se esforça para acomodar as contas nacionais nos trilhos de um regramento fiscal que mal foi criado e já claudica.
Nesta terça-feira, após reunir-se pela manhã com Haddad, Lula recorreu a acrobacias semânticas para se reposicionar em cena. Na contramão do que vinha insinuando, declarou que "responsabilidade fiscal é um compromisso" e que o governo "não joga dinheiro fora".
Questionado sobre o dólar, Lula afirmou, a caminho do ato de lançamento do Plano Safra, que o momento é de falar sobre "arroz e feijão." As palavras exerceram efeitos sedativos sobre a cotação do dólar. No final da tarde, assediado pelos microfones, Haddad soou aliviado: "Com comunicação bem feita melhora tudo".
No exercício do seu terceiro mandato presidencial, Lula já teve tempo para aprender que a política econômica não é decidida pelo ministro da Fazenda, mas pelo presidente. Na política, como na vida, a comunicação não é a arte de falar, mas de ser entendido. Se evoluir da retórica para a prática, dando a Haddad cartas que inspirem compromisso e confiança, a coisa ainda pode funcionar. Do contrário, não há a menor risco de dar certo.
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