quarta-feira, 31 de julho de 2024

Lula faz qualquer coisa por Maduro, até papel de bobo



Em sua primeira manifestação sobre a eleição presidencial na Venezuela, Lula disse que "não tem nada de grave, nada de assustador" acontecendo no país vizinho. Disse isso num dia em que a autoproclamada reeleição de Nicolás Maduro, contestada pelo mundo democrático, eletrificava o asfalto venezuelano. Reprimida, a revolta popular já resultou em mais de uma dezena de cadáveres. Algo como 750 pessoas foram presas.

Falando à TV Centro América, de Mato Grosso, Lula avaliou que "é normal que tenha uma briga" entre Maduro e a oposição, representada no pleito de domingo por Edmundo González. Para ele, a encrenca é de fácil resolução.

Maduro disse a Celso Amorim, o enviado do Planalto a Caracas, que divulgará as atas das seções eleitorais, só não sabe quando. Remanescendo dúvidas sobre o resultado, "a oposição entra com um recurso e vai esperar na Justiça." O resultado do julgamento "a gente tem que acatar", disse Lula. Para ele, é "um processo normal, tranquilo."

Todo venezuelano sonha em viver nessa Venezuela democrática esboçada nas declarações de Lula, seja ela onde for. O diabo é que um fato não deixa de existir apenas porque o presidente brasileiro o ignora. No país de Maduro, a autoridade eleitoral é exercida por um compadre e o Judiciário está submetido ao palácio presidencial.

No Brasil, a Justiça Eleitoral puniu Bolsonaro com a inelegibilidade por ter sonhado com uma ditadura absoluta. Beneficiário direito da frente ampla que se formou em defesa da institucionalidade, Lula talvez devesse refletir sobre a inconveniência de tratar a Venezuela como uma democracia relativa.

Levando a reflexão a sério, Lula descobria o valor do silêncio. Evitaria, por exemplo, o endosso a uma nota vexatória expedida pela direção nacional do Partido dos Trabalhadores. Nela, a cúpula petista dispensou a divulgação das atas eleitorais venezuelanas. Chamou Maduro de "presidente reeleito". Deu de ombros para a convulsão do asfalto. Referiu-se à perversão eleitoral como "uma jornada pacífica, democrática e soberana".

Instado a comentar, Lula não se opôs ao teor da nota do seu partido. Ao contrário, endossou o texto. Mais: acusou a imprensa brasileira de exagerar, tratando a crise venezuelana "como se fosse a Terceira Guerra Mundial". Noutros tempos, a condescendência de Lula e do PT com ditadores companheiros era apenas vexaminosa. Depois do 8 de janeiro, tornou-se ultrajante.

Com suas declarações, Lula sinalizou que o reconhecimento da pretensa reeleição de Maduro pelo governo brasileiro é uma questão de tempo. Revelou-se capaz de fazer qualquer coisa pelo ditador venezuelano, inclusive papel de bobo.

Desde que tomou posse, Lula deu a volta ao mundo para proclamar que o Brasil voltou. Palpitou sobre tudo. Quando tratou das guerras na Ucrânia e na Faixa de Gaza, foi ignorado. Nesta terça-feira, recebeu telefonema de Joe Biden. O inquilino da Casa Branca imaginou que, sobre a Venezuela, Lula teria o que que dizer.

Se repetiu no telefonema metade do que disse sob refletores, Lula pode ter decepcionado o interlocutor. Pessoas que não levam em conta a realidade correm o risco de também não ser levadas em conta pela realidade.

Contestado internacionalmente, Maduro liga o botão de dane-se



A Venezuela convive há décadas com a tese segundo a qual as únicas opções para que as coisas melhorem são os ditadores ou os loucos. Por um descuido da providência divina, Nicolás Maduro demonstrou em menos de 24 horas que acumula as duas condições.

No domingo, acusado de fraude pela oposição, Maduro celebrou sua hipotética reeleição após uma suposta contagem de 80% dos votos. Nesta segunda-feira, com a velocidade de um raio, o personagem deixou-se coroar pelo órgão eleitoral da Venezuela como presidente reeletio. O duvidoso foi tratado como "irreversível".Maduro deu de ombros para o questionamento dos diversos países que condicionaram o reconhecimento do resultado das urnas a uma contagem detalhada dos votos, com a exibição dos relatórios das seções eleitorais. O Brasil informou que aguarda a divulgação dos documentos.

Em vez de acender a luz, Maduro acenou com um recrudescimento do apagão democrático. Acusou a oposição de tramar um "golpe de Estado". Insinua que seus adversários, entre eles a líder oposicionista María Coirina, estariam por trás de um alegado ataque hacker que teria impossibilitado a divulgação de todas as atas de votação. Expulsou os embaixadores de sete países latino-americanos.

Estão em cena todos os ingredientes tradionalmente usados por Maduro para perseguir rivais e erguer as teorias conspiratórias que escoram as suas fraudes. A diferença é que, dessa vez, o pavio da sociedade venezuelana está mais curto.

Num prenúncio do que está por vir, soaram em Caracas os primeiros buzinaços e panelaços. De tão incrível, a alegada vitória de Maduro é mesmo inacreditável. Para admitir que o improvável fosse real, seria necessário supor que o eleitorado reelegeu a ruína. Alheio à deterioração que o rodeia, Maduro ligou o botão de dane-se.

O É DA COISA: Ditadura de Maduro mata na Venezuela; PT descarta democracia?

 

terça-feira, 30 de julho de 2024

WW - CNN Brasil

 

De tão incrível, vitória de Maduro é fantasticamente inacreditável



Tomando-se como real a proclamação oficial do resultado da sucessão presidencial na Venezuela, a maioria dos eleitores reelegeu a superinflação, a recessão, o desemprego, a corrupção, a repressão e o êxodo de 25% do país. Ao anunciar a terceira vitória de Nicolás Maduro, o Conselho Nacional Eleitoral, órgão que contabiliza os votos, informou, com outras palavras, que a maioria dos venezuelanos decidiu premiar a ruína com mais seis anos de mandato.

A escassez de transparência e o excesso de pesquisas independentes que farejavam a vitória da oposição resultaram numa onda de suspeição. Excetuando-se países como Rússia, China, Cuba e Nicarágua —os cúmplices de sempre— os demais silenciaram ou duvidaram explicitamente do resultado, cobrando transparência.

Ninguém ignora que a democracia é um regime em que as pessoas têm ampla e irrestrita liberdade para exercitar a sua capacidade de fazer besteiras por conta própria. Mas a insensatez tem limites. Eleger a sandice uma vez é temeridade. Duas vezes é teimosia. Três vezes, suicídio.

Rival consentido por Maduro, Edmundo González é mero boneco de María Corina Machado, a líder oposicionista que o regime inabilitou. O triunfo da oposição não seria garantia de êxito. Mas até a ilusão de que é possível começar tudo de novo, do zero, parece alternativa melhor do que a reeleição do caos.

O hipotético vigor da ditadura apodrecida surpreende até a sombra de Maduro. A vocação dos venezuelanos para o suicídio, por inverossímil, tem aroma de fraude. Muita gente trata incrível e inacreditável como sinônimos. Engano. "Incrível" soa como elogio. "Inacreditável" é depreciativo. De tão incrível, a vitória de Maduro é fantasticamente inacreditável.

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sexta-feira, 26 de julho de 2024

Josias: Imprevisível, Datena pode desistir até às vésperas da eleição

 

Josias: Depoimento mostra que Ramagem pede para PF tratá-lo como tolo

 

Amorim vai a Caracas como testemunha de um fracasso





Enviado do Planalto à frigideira venezuelana, Celso Amorim embarca nesta sexta-feira para Caracas. Será protagonista de um enredo com final infeliz. Não foi por falta de aviso. Amigo fraternal de Lula, o ex-presidente uruguaio Pepe Mujica avisou há oito anos: Nicolás Maduro "está louco como uma cabra".

Devolvido ao Planalto com o apoio de uma frente democrática, Lula perdeu a oportunidade de se reposicionar. Ao mimar Maduro, tornou-se uma oportunidade que o ditador aproveita para tentar se manter no comando.

No ano passado, num instante em que o TSE punia Bolsonaro por ter sonhado com uma ditadura absoluta no Brasil, Lula tratava a Venezuela de Maduro como uma democracia relativa. Desgovernada, a cabra venezuelana ameaçou invadir a Guiana, prendeu antagonistas e descumpriu o acordo de Barbados, que previa eleições competitivas e transparentes.

Na sucessão passada, em 2018, Maduro foi reeleito numa disputa de fancaria. Meia centena de países resusaram-se a reconhecer a legitimidade da eleição. Se o ditador vencer novamente, os questionamentos serão instantâneos. Na improvável hipótese de perder para Edmundo González, terá seis meses para fabricar um "banho de sangue" capaz de impedir a posse do Plano C da oposição.

Em qualquer hipótese, Lula descobrirá da pior maneira que levou anos para fracassar da noite para o dia no plano que se autoimpôs de coordenar a estabilização política da Venezuela. Celso Amorim será testemunha ocular desse fiasco. Seja qual for o veredicto das urnas de domingo, haverá denúncia, incerteza e crise.

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Reinaldo: Bolsonaro pediu acesso à delação de Cid sabendo que não a obteria

 

quinta-feira, 25 de julho de 2024

Semelhança entre Bolsonaro e Maduro não se limita às urnas



No final de janeiro, Bolsonaro elogiou as urnas utilizadas em plebiscito promovido por Nicolás Maduro. Decorridos seis meses, o ditador da Venezuela incorpora ao seu cardápio de mentiras a suspeição contra o processo eletrônico de votação do Brasil, um arroz de festa na retórica bolsonarista. Incomodado com a comparação, o capitão ironizou nas redes sociais: ""Maduro is my friend. Kkkkkkkkkkkkk".

Na campanha de 2022, Bolsonaro jogou nas redes um vídeo com imagens de Lula ao lado de Hugo Chávez para assustar o eleitorado com a possibilidade de o Brasil virar uma Venezuela nas mãos do PT. Não se deu conta de que sua administração já exalava um aroma venezuelano. As semelhança vai muito além do apreço pelo voto impresso e pela mentira.

Na Venezuela, o chavismo corrompeu os militares com vantagens salariais e negócios escusos. No Brasil, Bolsonaro cooptou as "minhas Forças Armadas" com investimentos orçamentários, mimos previdenciários e uma portaria que colocou os contracheques dos seus generais de estimação numa laje acima do teto salarial do serviço público. Comandantes de escrivaninha foram agraciados com ganhos extras superiores a R$ 300 mil.

Hugo Chávez, o coronel autocrata que deu à luz Nicolas Maduro antes de morrer, fundou em 2007 a Milícia Nacional Bolivariana. Virou a maior força armada do país. Chegou a reunir mais de 2 milhões de civis voluntários. Ainda hoje essa força paramilitar assombra a população, prolongando o regime ditatorial. Bolsonaro ensaiou algo parecido com a distribuição indiscriminada de armas. Seu lema era "o povo armado jamais será escravizado."

Qualquer semelhança entre os dois projetos políticos não é mera coincidência. Personalidades autocratas são mesmo semelhantes. A diferença entre Bolsonaro e Maduro é que o Brasil não é a Venezuela.

Kamala precisa refinar discurso; maior desafio dela se chama Biden, diz Josias de Souza

 

Ramagem escancara nanismo de Bolsonaro na cidade do Rio: 13%



Bolsonaro vetou em maio do ano passado o plano do seu primogênito de disputar a prefeitura do Rio de Janeiro. A evolução as pesquisas ajuda a entender a proibição. Munido de levantamentos internos feitos por encomenda do PL, o capitão antevia um fiasco. Pesquisa Quaest divulgada nesta quarta-feira reforça a impressão de que eram sólidos os receios de Bolsonaro.

O deputado Alexandre Ramagem, representante do bolsonarismo na corrida eleitoral do Rio, amealhou na pesquisa 13% das intenções de voto. Está 36 pontos atrás do prefeito Eduardo Paes, com 49%. Juntos, os outros candidatos somam 19 pontos percentuais. Ainda que os eleitores de todos eles decidissem votar em Ramagem, Eduardo Paes ficaria 17 pontos à frente do candidato de Bolsonaro.

Segundo a Quaest, Ramagem apanha do prefeito mesmo entre os eleitores que votaram em Bolsonaro na corrida presidencial de 2022. Nesse nicho, a vantagem de Eduardo Paes é de dez pontos: 39% a 29%. Lula não chega a agregar votos para Paesw. Mas entre os eleitores de Lula, o predomínio de Paes é expressivo: 61%, contra 2% que preferem Ramagem.

Ramagem é o Plano C de Bolsonaro no Rio. O general Braga Netto, primeira opção, foi declarado inelegível pelo TSE. O general Eduardo Pazuello, o Plano B, foi preterido porque o capitão apostou que o tema da segurança pública daria vantagens a Ramagem, um delegado da Polícia Federal.

A campanha está só começando. Bolsonaro dispõe de três meses para demonstrar que seu prestígio como cabo eleitoral é maior do que o nanismo exposto no índice atribuído a Ramagem. Se tudo der errado, restará ao patriarca festejar o faro que lhe permitiu trocar o Zero Um por um zero à esquerda. Não resolveu o problema. Mas evitou que o eventual fiasco tenha a cara de Flávio Bolsonaro.

TSE longe da Venezuela e de Maduro; que Lula proíba agora viagem de Amorim



Defendi, no começo desta quarta, com muita ênfase, no "Olha Aqui", no UOL, e também em "O É da Coisa", na BandNews FM e no BandNews TV, que o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) suspendesse o envio de observadores para a eleição da Venezuela no domingo. E foi o que tribunal, sob a presidência da ministra Cármen Lúcia, fez na noite desta quarta. Parece-me o óbvio. Até porque há sinais consistentes de que o ditador Nicolás Maduro prepara uma nova fraude sobre a já existente. Gente decente não coonesta arruaceiros.

O TSE já havia desistido da empreitada, mas voltou atrás. Depois do ataque do tiranete sanguinolento ao sistema eleitoral brasileiro, ecoando as acusações sem fundamento que por aqui fazem os fascistas nativos, seria um despropósito a Justiça Eleitoral brasileira atuar como "observadora" da votação. Se o tribunal não é, como quer herdeiro de Hugo Chávez, digno de confiança, iria lá para observar o quê? Estar-se-ia ou diante de um paradoxo ou de uma armadilha. Se atestasse lisura em caso de vitória do governo, como lisura teria havido se o próprio ganhador desqualificava o avaliador? Se reconhecesse o triunfo da oposição, o tirante acusaria uma conspiração.

Justiça Eleitoral não é diplomacia e não tem de fazer média com ninguém. Devemos a essa parte do Judiciário e ao STF a preservação da democracia, com o menor solavanco possível. Acusar a manipulação do sistema eleitoral sem haver uma prova é coisa muito grave. Isso custou, até agora, a inelegibilidade de um ex-presidente — e é provável que crimes associados a essa acusação, numa conspiração golpista, ainda lhe rendam a cadeia.

O TSE nada tem a fazer na Venezuela. Até porque, qualquer que seja o resultado, eleições democráticas não terão ocorrido pela simples e evidente razão de que a oposição não goza de liberdade de manifestação. Ela é representada pelo moderadíssimo Edmundo González porque outros nomes mais identificados com a resistência ao regime foram desabilitados por um tribunal aparelhado pela ditadura. Inexiste democracia sem eleições. É condição necessária, mas não suficiente, para um regime democrático, que também se traduz por um conjunto de valores.

Lula queimou capital político interno por apostar numa transição pacífica na Venezuela. O Acordo de Barbados foi para o ralo. O ditador não respeita nem mesmo aqueles que lhe estendem a mão. Atacou miseravelmente o processo eleitora no Brasil, unindo-se, na prática, aos golpistas daqui.

E nós sabemos que os tribunais superiores foram os grandes fiadores do processo eleitoral e aturam como forças de contenção do golpismo. O que faria a nossa Corte Eleitoral num regime que se organizou para fraudar eleições, ainda que possa não haver irregularidades no registro e na contagem de votos? A burla já está dada e consiste em usar o aparato estatal para garantir a desigualdade na disputa.

ITAMARATY
Lula tem de deixar claro outra vez quão importante e inegociável é para ele o processo democrático -- e todos sabemos que assim é para o único brasileiro a presidir o país três vezes, ungido pelo voto.

Que o presidente constate a gravidade da acusação de Maduro, dado o contexto que se vive aqui e no mundo. O Planalto deveria, de pronto, suspender a ida de Celso Amorim, assessor especial, e de diplomatas brasileiros a Caracas com o objetivo de acompanhar o pleito. Até porque o herdeiro de Hugo Chávez dá todos os indícios de que não vai aceitar um resultado adverso, razão por que ameaçou o país com um "banho de sangue" se perder. Lula expressou seu inconformismo com a fala, e o provocador recomendou que tomasse chá de camomila.

Antidemocráticas as eleições já são à medida que a oposição não disputa com o governo em igualdade de condições. Cabe ao Brasil se distanciar dessa farsa. O governo brasileiro não tem de romper com ninguém: nem com a Venezuela nem com a Argentina. Mas não pode correr o risco de entrar para a história como quem coonesta um processo criminoso por sua própria natureza.

CONCLUO
O líder petista já cobrou duas vezes um pedido de desculpas do argentino Javier Milei. É um erro. Empresta grandeza a um provocador. Um dos mais importantes e respeitados chefes de Estado do planeta não deve conferir a um faroleiro o poder da recusa.

Ocorre que a ofensa de Maduro é ainda mais grave. Chega, Lula — para lembrar o Machado de Assis de "Um Apólogo" —, de "servir de agulha a muita linha ordinária".

Venezuela: por que a eleição preocupa? G1

 

quarta-feira, 24 de julho de 2024

Reinaldo: Kamala Harris à frente no país em que se pode perder ganhando; quem de fato decide

 

Maduro reage a Lula como lobo atacando Chapeuzinho Vermelho



Devagarinho, Lula vai se dando conta de que a "democracia relativa" que enxergava na Venezuela se parece muito com uma ditadura absoluta. Descobre da pior maneira que Nicolás Maduro é um democrata sui generis, do tipo que jamais negaria a ninguém o direito de concordar inteiramente com ele.

Lula ousou declarar-se surpreso com a antevisão de Maduro segundo a qual um "banho de sangue" tingirá a conjuntura venezuelana caso a oposição prevaleça nas urnas do próximo domingo. O autocrata companheiro deu de ombros: "Quem se assustou que tome chá de camomila". Horas depois, disse que não são auditadas as eleições no Brasil, nos Estados Unidos e na Colômbia, três países que monitoram com lupa o pleito venezuelano.

Edmundo González, o opositor que Maduro consentiu antes de saber que subiria além do desejável nas pesquisas, agradeceu o apoio de Lula ao processo eleitoral. Disse valorizar a presença de Celso Amorim como observador em Caracas. O assessor internacional do Planalto declarou ao Globo que Maduro deveria aproveitar as eleições para "mostrar que a democracia" venezuelana "está consolidada".

A despeito dos esforços de Amorim, Lula talvez devesse buscar a assessoria de uma criança de cinco anos. No teatro infantil, com seus enredos básicos, sua comédia ingênua e seus exageros trágicos, as crianças se integram com facilidade à catarse. Elas participam do espetáculo. Interferem na história, vaiam os vilões e torcem pelos hipotéticos herois.

Uma criança teria saltado da cadeira em maio do ano passado, quando Lula recepcionou Maduro em Brasília. O assessor mirim teria invadido o palco para avisar ao Chapeuzinho Vermelho do Planalto que o Lobo Mau venezuelano não merecia o benefício da dúvida. O que faltou a Lula foi um acompanhante infantil, com discernimento para alertar que um presidente marcado pelos calos do 8 de janeiro não deveria se meter em apertos antidemocráticos.

Kamala à frente no país em que se pode perder ganhando; quem de fato decide



Kamala Harris, vice-presidente dos EUA, parece um fenômeno irresistível. Será mesmo? Vamos ver. Nunca se arrecadou um montante de US$ 100 milhões para uma campanha em 24 horas. É inédito na história das eleições. Essa grana veio de 1,1 milhão de doadores, e 62% disseram que era a primeira contribuição que faziam para essa disputa. Ou por outra: 682 mil pessoas ainda não haviam repassado um miserável tostão para o pleito de 2024 e o fizeram depois que Kamala assumiu o lugar de Joe Biden como o nome dos democratas. Isso quer dizer alguma coisa? É claro que sim! Se será o suficiente para que ela tire o pirulito da boca do golpista laranja, bem, aí vamos ver.

Pesquisa Reuters/Ipsos divulgada ontem, com levantamento feito entre segunda e a própria terça, ouvindo 1.241 americanos adultos, com margem de erro de três pontos para mais ou para menos, aponta Kamala numericamente à frente de Trump: 44% a 42%. Nada mal! O que se tinha como certo é que, aos democratas, só restava o lamento pesaroso. Agora não. Trump falou como eleito, na quinta, na convenção dos republicanos e chegou até a dar uma espécie de ultimato aos democratas. Tratou-os ora com benevolência fingida, ora como Trump... E ele aparece atrás nas pesquisas dois dias depois da desistência de Biden.

O diabo é que, nos EUA, um indivíduo não vale um voto. Assim, lembremos de novo: os republicanos ganharam, nas urnas, a sua última eleição em 2004, no segundo mandato de Bush Filho. O primeiro, em 2000, ele perdeu para o democrata Al Gore. Mas levou a Casa Branca. Trump foi derrotado por quase 3 milhões de votos por Hillary Clinton em 2016. O Colégio Eleitoral fez o milagre de dar a vitória ao derrotado, o que já aconteceu cinco vezes no país — três delas no século 19.

Pois bem: em 24 horas, Kamala obteve o apoio de todos os governadores democratas que se colocavam como postulantes; teve o nome endossado pelas lideranças do partido nas duas Casas do Congresso; conquistou o número necessário de delegados e arrecadou, sem pedir, aquela montanha formidável de dinheiro. No sistema brasileiro, talvez se estivesse diante de uma ascensão irresistível. Mas, por lá, o busílis é outro.

Numa contagem mais ampla, os Estados ditos "pêndulos", nem democratas nem republicanos inamovíveis, seriam 12, somando 161 dos 538 votos do colégio eleitoral — logo, é preciso obter 270 apoios para vencer. Numa avaliação mais rigorosa, considera-se que são sete as unidades da federação que realmente definem a eleição, a saber — informo o número de delegados de cada um em 2024: Wisconsin (10), Pensilvânia (19), Arizona (11), Michigan (15), Geórgia (16), Nevada (6) e Carolina do Norte (16). No total, 93 votos. Na eleição de 2020, os republicanos só venceram neste último Estado. Neste ano, em pesquisas anteriores ao tsunami de eventos, o democrata só levava em Wisconsin.

Exceção feita a Maine (4) e Nebraska (5), que indicam delegados segundo a proporcionalidade, quem ganha num Estado leva todos os delegados. No pleito de 2020, Biden venceu Trump nas seguintes unidades da federação:
- por 49,5% a 48,8% no Wisconsin (10);
- por 49,8% a 48,9% na Pensilvânia (19);
- por 49,45 a 49,1% no Arizona (11);
- por 50,5% a 47,9% em Michigan (15);
- por 49,5% a 49,2% na Geórgia (16);
- por 50,2% a 47,5¨em Nevada (6);
E perdeu por 50% a 48,6% na Carolina do Norte (15).

Perceberam a distância ínfima? Querem ver como são as coisas? Em 2020, Biden obteve uma montanha de votos a mais (7.050.804) do que Trump. No Colégio Eleitoral, o placar pró-democrata foi de 306 a 232: uma diferença de 74. Os sete estados-pêndulo listados acima somam 92 cadeiras. O atual presidente só perdeu na Carolina do Norte (15). Fosse Biden o candidato à reeleição, dizem as pesquisas, só lhe sobraria desta feita, nesse grupo, o Wisconsin. Os outras 82 poderiam ficar com Trump.

Por que faço essas observações? Vejam a vantagem mínima dos democratas em 2020, em termos percentuais, nos Estados listados. Em termos numéricos, ele obteve as 77 cadeiras em razão de uma vantagem, nesse grupo, de meros 288.167 votos. É visível que o modelo está estupidamente errado.

VOLTO A KAMALA
Os dois pontos percentuais que marcam a liderança de Kamala sobre Trump na pesquisa são importantes, sim, para indicar a mudança de ânimo. Até domingo à tarde, antes de Biden anunciar a desistência, a derrota era a única coisa certa para os democratas. Uma mudança e tanto! Mas reparem como o colégio pode distorcer a realidade. Em 2016, a democrata Hillary Clinton obteve 65.853.516 votos, contra 62.984.825 de Trump -- uma dianteira nas urnas de 2.868.691 votos, mas ela ficou com 227 delegados no Colégio Eleitoral, e ele, com 304: 77 a mais. O republicano venceu em Wisconsin, Pensilvânia, Arizona, Michigan, Geórgia e Carolina do Norte. Juntos, eram 86 delegados.

É visível que os republicanos estão ainda um tanto zonzos com o "furacão Kamala". De súbito, é o algoz de Biden a virar o "velho gagá" da disputa, pecha que os republicanos imputavam a Biden. Espera-se uma reação pesada nas próximas horas. Por enquanto, é Kamala quem está desenhando a biografia do adversário ao afirmar, com fez na segunda, que, na condição de promotora, já enfrentou "predadores de mulheres, fraudadores e trapaceiros", emendando: "Eu conheço tipos como Donald Trump". Nesta terça, mais alguns petardos contra o adversário em evento em Wisconsin: trata-se de escolher, afirmou, entre a "liberdade e o caos".

Que seja a liberdade.

terça-feira, 23 de julho de 2024

Kamala Harris fala em primeiro comício como pré-candidata

 

'Bildentena' trata o eleitor como coadjuvante de uma palhaçada



"Se o Biden pode desistir a qualquer momento, por que eu não posso?", pergunta José Luiz Datena. A comparação não é boa. Joe Biden não desistiu da corrida à Casa Branca, foi empurrado para fora da raia. Datena é campeão de defecções. "Nunca perdi uma eleição, desisti de todas", jactou-se na semana passada.

Biden, 81 anos, comportou-se como se a velhice pudesse ser sempre deixada para amanhã. Datena, 67, age como se a velhice chegasse para os seus projetos políticos sempre ontem. Flerta com a política há uma década. Passou por 11 partidos. A quatro dias da convenção em que o PSDB planeja formalizar sua candidatura a prefeito de São Paulo, procura novamente a porta de saída.

Datena vendeu um terreno na Lua a Tabata Amaral ao admitir que poderia ser vice da candidata do PSB. Revendeu a mesma propriedade ao tucanato, adicionando uma vista para os anéis de Saturno. Seria cabeça de chapa, não vice. Depois de se consolidar como uma espécie de conto do vigário no qual todos caem, Datena soa como se receasse ser passado para trás: "Desde o começo, falei: se me sacanearam, eu desisto mesmo!"

Tomado pelas palavras, Datena tem pavor de ser usado. "Não confio em palavra de político", disse na semana passada. Na prática, usa os políticos, fazendo gato e sapato de todos eles. Nesse jogo de malandro e otário, convém lembrar de um ensinamento de Tancredo Neves: quando a esperteza é grande demais, come o dono. O risco que Datena corre é o de reservar para o eleitorado no seu enredo o papel de coadjuvante de uma palhaçada.

Reinaldo: Kamala tem grandes chances se souber incorporar discurso moderado

 

Kamala arrebata democratas em 24 horas e diz conhecer criminosos como Trump


Kamala Harris, que será sagrada candidata do Partido Democrata, e o republicano Donald Trump: a possibilidade de uma virada no jogo.

Ganhar a eleição certamente será muito mais difícil a Kamala Harris do que se firmar como a candidata do Partido Democrata à Presidência. A ascensão de seu nome foi fulminante, e a consolidação, acachapante. Até o fim desta segunda, nada deu errado para a vice de Joe Biden desde a hora em que o titular anunciou, na tarde de domingo, que não concorreria a reeleição. Todos os potenciais adversários internos apoiaram o seu nome, e as doações chegaram US$ 81 milhões em um dia. Os democratas deram uma impressionante prova de unidade, e, agora, quem tem de rever a sua estratégia é Donald Trump, que deu a entender na Convenção Republicana que a eleição seria apenas homologatória. Não será. Ontem à noite, levou o primeiro petardo da já ungida Kamala: ela afirmou que sabe lidar com criminosos do feitio do fanfarrão republicano.

Vem chumbo grosso por aí. Relembro dois trechos do discurso de Trump na quinta para que nos lembremos de como ele enxergava a disputa. Simulando o que nunca foi, resolveu simular a coreografia da pomba da paz:
"Amigos, delegados e cidadãos americanos. Estou diante de vocês esta noite com uma mensagem de confiança, força e esperança. Daqui a quatro meses, teremos uma vitória incrível e daremos início aos quatro maiores anos da história do nosso país.

Juntos, lançaremos uma nova era de segurança, prosperidade e liberdade para cidadãos de todas as raças, religiões, cores e credos.

A discórdia e a divisão na nossa sociedade devem ser curadas. Devemos curá-las rapidamente. Como americanos, estamos unidos por um destino único e por um destino partilhado. Nós vamos nos erguer juntos. Ou desmoronamos.

Estou concorrendo para ser presidente de todo os Estados Unidos da América, não de metade, porque não há vitória em vencer para apenas metade do país.
Portanto, esta noite, com fé e devoção, aceito com orgulho a sua nomeação para concorrer ao cargo de presidente dos Estados Unidos. Obrigado! Muito obrigado!

E faremos isso direito. Nós vamos fazer isso direito."

Poderia ser a fala de quem propõe uma conciliação entre fortes, ainda que inicie esse trecho do discurso dando a vitória como assegurada. Até aí, vá lá, assim fazem todos. Para quem conhecia o falastrão que se fez desmerecendo adversários e inventando conspirações, a fala soou estranha. Ocorre que não ele não estava apelando à paz entre adversários que se respeitam. Na sequência, ele deixou claro que via os democratas de joelhos, rendidos. Leiam:
"Não importa que obstáculo surja em nosso caminho, não iremos esmorecer. Não vamos nos curvar. Não recuaremos e nunca deixarei de lutar por vocês, por sua família e por nosso magnífico país. Nunca!

E tudo o que tenho para dar -- com toda a energia e luta, de coração e alma -- eu ofereço à nossa nação nesta noite. Muito obrigado!

Eu prometo isto à nossa nação: vamos mudar o nosso país. E vamos mudá-lo muito rapidamente. Obrigado!

Esta eleição deveria ser sobre as questões que o nosso país enfrenta e sobre como tornar a América bem-sucedida, segura, livre e grande novamente.

Numa época em que a nossa política, muitas vezes, nos divide, agora é o momento de lembrar que somos todos cidadãos americanos -- somos uma nação sob Deus, indivisível, com liberdade e justiça para todos.

E não devemos criminalizar a dissidência ou demonizar a divergência política, que é o que tem acontecido ultimamente no nosso país, a um nível jamais visto antes. Nesse espírito, o Partido Democrata deve parar imediatamente de usar o sistema judicial como uma arma e de rotular o adversário político como 'inimigo da democracia'. Especialmente porque isso não é verdade. De fato, sou eu quem está salvando a democracia para o povo do nosso país.

Se os democratas quiserem unificar o nosso país, deveriam abandonar essa caça às bruxas partidária, da qual eu sou vítima há aproximadamente oito anos. E devem fazê-lo sem demora e permitir a realização de eleições que sejam dignas do nosso povo. Nós vamos vencer de qualquer maneira."

"Criminalizar a dissidência?" Este senhor "criminalizou" os vitoriosos de 2020. A invasão do Capitólio só aconteceu porque ele não reconheceu o resultado das eleições e acusou uma fraude que não existiu, o que repete na fala acima ao mencionar "a realização de eleições que sejam dignas do nosso povo", num indício claro de que, se perder, está disposto a repetir o comportamento criminoso da eleição passada. Mas há mais do que isso.

Estava tão certo do sentido homologatório do embate que tem o desplante de dar uma espécie de ultimato aos adversários: que o Partido Democrata pare, disse, de usar o sistema judicial como uma arma contra os adversários. Ele, com efeito, não via uma disputa, uma competição, um confronto. O pleito teria se convertido num ritual de humilhação, de sujeição e de rendição.

E TUDO FAZIA CRER QUE...
E tudo fazia crer que assim seria. Depois do desempenho desastroso de Biden no debate de 27 de junho -- e poucos nos demos conta da atuação medíocre do próprio Trump, limitando-se a mentir compulsivamente -- e dada a resistência do presidente, que assegurava que não desistiria da disputa, o republicano resolveu fazer o seu discurso dito "moderado" -- para quem não leu as entrelinhas -- como uma das faces de sua arrogância, não como um chamamento à paz.

Se o debate e as gafes posteriores de Biden deram ao republicano a certeza de que não haveria resistência possível, os desdobramentos decorrentes do ataque a tiro que sofreu pareciam pôr um ponto final à batalha com três meses de antecedência. E Trump se viu como o vitorioso, por antecipação, de ao menos uma eleição presidencial, já que, nas urnas, ele perdeu para Hillary Clinton em 2016 com uma diferença de quase três milhões de votos. No modelo americano, infelizmente, quem não ganha pode levar; quem vence pode ficar sem as batatas. Não é um bom modo de fazer as coisas, é claro!

Mas aí veio o que pode ser o reverso da fortuna, a ver. Como escrevi aqui ontem, todos os males haviam saído da Caixa de Pandora, mas restava a esperança lá no fundo. Nesta segunda, os democratas evidenciaram que estão de volta ao jogo. E com a disposição de quem ultrapassa com força os primeiros percalços.

AS GROSSERIAS
Com a estupidez habitual, o agora candidato mais velho da história das eleições americanas, resolveu espezinhar Biden:
"É um novo dia, e Joe Biden não se lembra de ter abandonado a disputa ontem! Ele está pedindo sua agenda de campanha e marcando conversas com os presidentes Xi, da China, e Putin, da Rússia, sobre o possível começo da Terceira Guerra Mundial. Biden está 'afiado, decidido, enérgico e pronto pra luta'!".

Alguém detecta nas palavras acima aquele cara que chegou a falar em união na quinta? Escreveu mais:
"Os democratas escolhem um candidato, o desonesto Joe Biden. Ele perde feio o debate, depois entra em pânico e comete erro atrás de erro. É avisado de que não poderá vencer, e decidem que eles vão escolher outro candidato, provavelmente [Kamala] Harris -- Inédito! Essas pessoas são a verdadeira AMEAÇA PARA A DEMOCRACIA".

Sete presidentes já desistiram de concorrer à reeleição. Tendo exercido um único mandato, no entanto, foram apenas três antes de Biden, todos no Século 19. O evento, pois, é raro, e é possível que Trump não apostasse que fosse acontecer. Mas aconteceu. E, agora, o que era desalento entre os democratas passou a alimentar a expectativa de uma virada. Todas as lideranças importantes do partido se uniram a Kamala. Dos medalhões, apenas Barack Obama havia se mostrado reticente até a noite desta segunda.

A convenção do partido está marcada para o fim de agosto, mas o jogo já está jogado, e Kamala será mesmo a candidata. É claro que a estratégia republicana tem de mudar. O discurso delinquente sobre imigração vai continuar, até porque se considera ser a maior fragilidade da ainda vice-presidente, uma vez que Biden havia delegado a ela a questão. Mas convenham: Trump não precisa de motivos, apenas de pretextos. Sua cruzada contra a imigração, associando-a insegurança pública, trabalha com dados mentirosos.

OS DELEGADOS E O PRIMEIRO PETARDO
O desempenho de Kamala no primeiro dia como pré-candidata é realmente fabuloso. Além de ter conquistado um coro de apoiadores de peso, já reunia, no fim da noite de ontem, delegados de sobra para receber a indicação do partido. São necessários 1.976, mas ela contava, segundo a agência Associated Press, com 2.579.

O Partido Democrata tem expertise para se livrar de armadilhas. O por ora silente Barack Obama se apresentou como o primeiro negro a se tornar presidente, não como o primeiro presidente negro. Parece jogo de palavras, mas não é. Como evidenciou em seu livro de memórias, "Terra Prometida", esta era a visão que o populismo de direita espalhava sobre a sua ascensão:
"O governo estava tomando dinheiro, empregos, vagas em faculdades e status social de gente trabalhadora e merecedora como nós e entregando a eles -- os que não compartilham de nossos valores, que não trabalhavam tanto como nós..."

Isso não lhes parece uma espécie de divisa do trumpismo? Driblar o ressentimento, que Trump manipula tão bem, será um dos desafios de Kamala.

Isso não significa, no entanto, que o biltre fanfarrão não deva ser tratado com dureza. A sua primeira reação à desistência de Biden prenuncia uma guerra suja. E a candidata democrata terá de reagir com a dureza necessária. Parece que ela está disposta.

Protagonizou ontem à noite o primeiro ato de campanha, já como a ungida informal de seu partido. Falando em Willmigton, Delaware, a ex-promotora disse que conhece tipos como Trump e já enfrentou criminosos. Fez uma espécie de resumo da folha corrida do seu adversário:
"Enfrentei criminosos de todos os tipos: predadores que abusaram de mulheres; fraudadores que enganaram consumidores; trapaceiros que quebraram as regras para seu próprio benefício. Então, ouçam-me quando digo: 'Eu conheço o tipo de Donald Trump'".

Para quem tratava a eleição como conquista assegurada e se julgava na condição de dar um ultimato aos adversários, humilhando-os, a situação de Trump se complicou. E muito!

É a esperança saindo do fundo da caixa.

sexta-feira, 19 de julho de 2024

Josias: Tabata produz dupla desmoralização, a de Datena e a de si mesma

 

Bolsonaro repete em comício toda a toada golpista de 2022



Cercado pela Polícia Federal, Bolsonaro transformou um comício de Alexandre Ramagem, seu candidato à Prefeitura do Rio de Janeiro, num ato de desafio à lógica, ao sistema eleitoral e às instituições. Fantasiado com um figurino de perseguido político, repetiu toda a cantilena golpista que produziu o 8 de janeiro e compôs o pano de fundo contra o qual o Tribunal Superior Eleitoral decretou sua inelegibilidade por oito anos.

Voltou a sustentar a lenda segundo a qual Lula subiu a rampa do Planalto pela terceira vez graças a uma fraude: "O que aconteceu no final de 2022, um dia, nós recuperando a liberdade de expressão, vocês tomarão conhecimento". Recorreu a uma analogia futebolística. "Já vimos um time de futebol ser campeão sem torcida. Mas um presidente da República eleito sem povo é a primeira vez na história."

Ao justificar sua fuga para a Flórida às vésperas da posse de Lula, o capitão bateu abaixo da linha da cintura. "Não passo faixa para ladrão." Num instante em que a banda bolsonarista do Congresso articula uma anistia capaz reabilitá-lo politicamente, Bolsonaro insinuou que sua carta voltará ao baralho na próxima sucessão: "Quando se fala em 2026, nós temos que passar por 2024."

Depositou seu futuro nas mãos de sua milícia parlamentar. "Temos certeza que em 2026 muita coisa vai mudar. O Parlamento vai de fato nos garantir a lisura das eleições, e temos certeza que atingiremos o objetivo que é de todos nós."

Menos de 24 horas depois do depoimento de Ramagem à Polícia Federal no inquérito sobre a Abin paralela, Bolsonaro incluiu o cúmplice no enredo ficcional do complô. "O Ramagem, delegado da Polícia Federal que eu conheci na transição de 2018, já começa a pagar um preço alto pela sua ousadia de querer pensar, sonhar e administrar uma cidade com respeito, com honradez e com orgulho."

Na política, como na vida, todo mundo deve raciocinar com hipóteses. Das mais amplas às mais específicas. Levando-se o raciocínio de Bolsonaro às últimas consequências, a melhor das hipóteses para ele é a de que tornou-se mesmo vítima de um complô da Polícia Federal, do delator Mauro Cid, dos chefes militares que refugaram a minuta do golpe e do Supremo para fazer de um ex-presidente limpinho um criminoso contumaz.

A pior das hipóteses é que, alheio à evidência de que tudo o que está na cara não pode ser uma conspiração da lei das probabilidades contra um inocente, Bolsonaro demora a se dar conta de que o cerco criminal está prestes a convertê-lo de investigado a réu e, no limite, a condenado prestes a passar uma temporada na cadeia.

Diante de tais hipóteses, Bolsonaro tem duas alternativas: ou continua trafegando no universo da Terra plana, ou percebe que um palanque não é o lugar mais adequado para que um delinquente obtenha argumentos sólidos capazes de retirá-lo da condição de um condenado esperando na fila para acontecer.

Maduro constrange Lula com sua retórica do 'banho de sangue'



Às vésperas da eleição presidencial na Venezuela, Nicolás Maduro já não pronuncia discursos políticos. Num comício realizado em Caracas, despejou sobre o microfone ganidos apocalípticos de um cachorro louco. Disse que haverá um "banho de sangue", uma "guerra civil" no país se ele não for reeleito nas eleições marcadas para o próximo dia 28 de julho.

O que Maduro rosnou, com outras palavras, foi mais ou menos o seguinte: "Nenhum resultado será admissível na sucessão presidencial venezuelana, exceto a continuidade da ditadura". Uma ditadura que já dura duas décadas e meia se os mandatos de Maduro forem somados aos do antecessor Hugo Chávez.

O comportamento do ditador consolida o sepultamento do plano de Lula de mediar um processo de conciliação no país vizinho. O funeral começou com a inabilitação de María Corina Machado. A cova foi aberta com o bloqueio do registro da candidatura de Corina Youris, o Plano B da oposição.

Agora, Maduro joga terra em cima da pretensão de Lula ao insinuar que não aceitará uma eventual derrota para Edmundo González Urrutia, o derradeiro representante oposicionista numa disputa marcada pela opacidade, pela sabotagem e por prisões arbitrárias.

Por mal dos pecados, a eleição na Venezuela está separada da posse do eleito por um período de quase seis meses. É tempo suficiente para que Maduro fabrique um Apocalipse sanguinário na hipótese de uma improvável derrota.

Cada vez que Maduro late em Caracas, constrange alguém em Brasília. No ano passado, Lula estendeu o tapete vermelho do Planalto para Maduro. Referiu-se à ditadura companheira como mera "narrativa" de opositores. Dias depois, afirmou numa entrevista que "o conceito de democracia é relativo". Deu no que está dando.

Trump na convenção: farsa, deportações em massa, petróleo e salvacionismo


Trump discursa na Convenção Republicana: mentiras em proporções industriais
e falso discurso da unidade; na verdade, ouviu-se o alucinado de sempre.

Ele até que fingiu tentar... Donald Trump falou por 93 minutos no discurso em que "aceitou" a indicação do Partido Republicano para a Presidência dos EUA, a mais longa manifestação em discursos dessa natureza. Em muitos momentos, a fala se transformou numa arenga de autocongratulação e autossatisfação. Fosse um exercício erótico, seria masturbação em público. De qualquer modo, a assistência estava ali para se excitar com a exposição narcísica. Eu diria que houve menos momentos de êxtase do que imaginavam — e até do que imaginávamos os que acompanhamos o troço por dever profissional, ainda que estomagados. Quando falou do atentado que sofreu e de como sobreviveu — por vontade de Deus, é claro! —, houve uma ameaça de transe. Mas foi breve. E ele anunciou as duas coisas que vai fazer no primeiro dia se eleito: fechar as fronteiras e perfurar poços de petróleo.

A página da CNN americana na Internet fez um levantamento de todas as mentiras que contou. Impressiona. O tiozão do churrasco — de hambúrguer; picanha é para aquele povo forte abaixo do Equador... — segue sendo o generalista sobre o nada de sempre, mas se tornou o dono inconteste do Partido Republicano. Não tem compromisso com os fatos; fala o que lhe dá na telha; conta lorotas com uma determinação fanática e, vai saber..., talvez acredite nas bobagens que diz. Ainda que apenas simule a crença, sabe que há milhões que transformam seus disparates em palavra revelada.

Chegou a falar em união e disse que não quer governar apenas para metade dos EUA:
"Estou diante de vocês esta noite com uma mensagem de confiança, força e esperança. Daqui a quatro meses teremos uma vitória incrível e daremos início aos quatro maiores anos da história do nosso país. Estou concorrendo para ser presidente de toda a América, não de metade da América. Porque não há vitória em vencer para metade da América. Portanto, esta noite, com fé e devoção, aceito orgulhosamente a sua nomeação para presidente dos Estados Unidos".

Era para valer? Obviamente, não. Mais de uma vez, no curso de seu longuíssimo discurso, deixou claro que só um resultado é aceitável: a sua vitória. Nesse sentido, repete a fala autoritária da campanha de 2020 e se mostra disposto a não aceitar, mais uma vez, o resultado caso lhe seja adverso. Ninguém acredita que isso possa acontecer se Joe Biden seguir na disputa. Mas parece haver sinais de que pode desistir. E aí se estará diante de uma nova situação.

O republicano ainda afirmou:
"O Partido Democrata deveria parar imediatamente de usar o sistema de Justiça como arma e de rotular os seus adversários políticos como inimigos da democracia, especialmente porque isso não é verdade. Na realidade, sou eu quem está salvando a democracia para o povo do nosso país."

OS IMIGRANTES
Qual é o plano de governo de Trump? Este:
"Nenhuma nação questionará nosso poder. Nenhum inimigo duvidará do nosso poder. Nossas fronteiras estarão totalmente seguras. Nossa economia irá disparar. Devolveremos a lei e a ordem às nossas ruas; o patriotismo às nossas escolas e, mais importante, restauraremos a paz, a estabilidade e a harmonia em todo o mundo."

Para alcançar esse intento, é preciso eleger um inimigo, além dos democratas. Dedicou um bom tempo a demonizar os imigrantes, que seriam responsáveis, segundo disse, por "dezenas de milhares de assassinatos". É um assombro. Afirmou que a criminalidade cresce nos EUA, enquanto declina no resto do mundo. As várias agências de checagem atestam: é apenas uma de suas mentiras.

Dados preliminares do FBI, informa o site da CNN, apontam uma queda de 13% nos assassinatos em 2023 e de 6% nos crimes violentos na comparação com 2022. Os números estão abaixo dos registrados em 2020, último ano da gestão Trump. Os índices relativos ao primeiro trimestre de 2024 são ainda mais eloquentes quando comparados com igual período do ano anterior: declínio de 26% nos homicídios e de 15% dos crimes violentos. E Trump, "o moderado", prometeu, sem receio, "a maior deportação em massa da história do país":
"[Deportações] Ainda maiores do que as do presidente Dwight D. Eisenhower de muitos anos atrás. Vocês sabe: ele era um moderado, mas acreditava fortemente nas fronteiras. Ele fez a maior operação de deportação que já tivemos."

Trump já havia feito essa afirmação no ano passado. Para lembrar: a "Operação Wetback", levada adiante por Dwight Eisenhower em 1954, deportou 1,4 milhão de indivíduos, especialmente mexicanos, mas também levou o terror a famílias já americanas com raízes no México e em outros países da América Latina. Diz o candidato que pretende fazer coisa ainda maior, além de erguer o muro.

DE NOVO, A SUPOSTA FRAUDE
O candidato que mentiu sobre praticamente todos os temas em que tocou voltou a acusar fraude nas eleições de 2020, sustentando que eles -- os democratas -- usaram a covid para trapacear, à medida que houve uma facilitação do voto pelos correios, sem nenhuma evidência de irregularidade. Não obstante, Trump e os trumpistas entraram com mais de 50 ações na Justiça para anular votações.

Eis o cara que diz querer unir o país.

Outra ideia força do seu discurso é o incentivo à exploração de petróleo, porque, disse, a América precisa da energia para ser grande outra vez. Aliás, ele prometeu fazer duas coisas logo no primeiro dia de mandato: "Perfurar [poços de petróleo] e fechar nossas fronteiras".

"A PAZ DE TRUMP"
E, claro!, com ele o mundo ficará em paz:
"A guerra está agora a assolar a Europa e o Oriente Médio, e essa administração [Biden] está longe de resolver o problema".

Repetiu, na prática, a ladainha de que, com ele, os conflitos da Ucrânia-Rússia e Israel-Hamas nem teriam começado, orgulhando-se, ainda, da interlocução que manteve, quando presidente, com o Kim Jong-Un e com o Talibã. Sobre o ditador norte-coreano, mandou ver:
"Eu me dou bem com ele; ele também gostaria de me ver de volta. Acho que ele sente minha falta, se você quiser saber".

Elogiou ainda a firmeza de "Viktor Orbán", o primeiro-ministro autocrata da Hungria e um dos principais aliados de Vladimir Putin no mundo. Não erra quem apostar que Trump, se vencer, vai negociar a "paz" com a Ucrânia na linha: "Chega dessa conversa; entreguem os territórios ocupados à Rússia porque preciso do dinheiro que sustenta a guerra para fazer a América grande outra vez". Quanto ao Oriente Médio, a má notícia restará para os palestinos: Israel receberá carta branca para continuar o massacre, que já perpetra hoje sem ela.

No mais, diz que vai "proteger" a economia e os empregos americanos, e isso significa que pretende intensificar a política protecionista em curso. O alvo principal é a China. E o resto do mundo. Na sua "América Grande" parece não haver lugar para o que América não for.

Se há alguma esperança, está na suposta disposição de Biden de desistir. Trump está certo de que Deus o livrou da bala. E, pois, deve julgar que seus planos para o futuro são inspirados pelo "Senhor" — aquele Deus, vocês sabem, que odeia imigrantes e democratas...

AO VIVO HADDAD QUEBRA O PAU COM BOLSONARISTAS AO VIVO!!

 

Áudio de Ramagem e Bolsonaro, memes sobre Haddad | A Hora com Toledo e Thais Bilenky

 

Trump: o 1° discurso pós-atentado G1

 

quinta-feira, 18 de julho de 2024

Caso Bolsonaro: Ramagem na PF, Cid cita empresário; Lula põe sigilo de 100 anos | UOL News

 

Crise na segurança: a proposta do governo | G1

 

Lula atravessa a rua e pisa em outra casca de banana



O que era o forte de Lula – a capacidade de falar de improviso, fazer-se entender pelas pessoas mais simples e tocar nos seus sentimentos –, começa a revelar-se um risco para quem na idade avançada dele aspira a um novo mandato presidencial.

A levar-se em conta o padrão clássico do grande tribuno, Lula sempre ficou devendo. Mas, o carisma e o poder de convencimento compensam suas deficiências. Não importa que cometa erros de português ferindo ouvidos sensíveis.

Para o poeta Manuel Bandeira, a vida vem “da boca do povo na língua errada do povo, língua certa do povo porque ele é que fala gostoso o português do Brasil”. O que os demais fazem, segundo Bandeira, “é macaquear a sintaxe lusíada”.

Em tempos de redes sociais e de feroz polarização política, porém, o improviso e o desejo de arrancar risos com frequência podem se voltar contra os que se valem de tais recursos. É o caso de Lula, para felicidade dos seus críticos.

O teleprompter não faz mal e os grandes líderes mundiais o usam para pronunciamentos importantes – Lula, não, ou apenas raramente. Mesmo as piadas podem ser pensadas e testadas com antecedência, e não ditas no calor do momento.

Dir-se-á que isso tornaria Lula menos espontâneo – duvido que torne; a espontaneidade é uma marca dele, impossível de ser perdida, e uma de suas vantagens sobre os outros. Um Lula menos dado a fazer graça o pouparia de derrapagens.

Derrapou, ontem, mais uma vez e poderá pagar caro por isso. Ao condenar a violência doméstica que sofrem as mulheres, ele disse que “se o cara for corintiano, tudo bem”. Lula torce pelo Corinthians. Nunca bateu numa mulher.

A piada sem graça foi feita em meio a um comentário onde ele criticou a violência de homens contra mulheres e elogiou a presença de nove mulheres em um evento de empresários do ramo de alimentos no Palácio do Planalto.

A certa altura do discurso, Lula observou:

“Hoje eu fiquei sabendo uma notícia triste. Tem pesquisa […] que mostra que depois de um jogo de futebol aumenta a violência contra a mulher. Inacreditável. Se o cara é corintiano, tudo bem, como eu. Mas eu não fico nervoso quando [o time] perde, eu lamento profundamente”.

Outra vez, e como de hábito, Lula atravessou a rua para pisar numa casca de banana. Não se brinca com algo tão grave como o espancamento de mulheres por seus maridos. E logo no dia em que Janja o havia advertido para os perigos do improviso.

O Lula dessa piada infame nada tem a ver com o Lula que já disse que “mulher não foi feita para apanhar”; que invocou sua mãe, que apanhava do marido, para censurar a violência doméstica; e que costuma tratar as mulheres com carinho.

Da mãe, a sábia dona Lindu, ele lembra ter ouvido o conselho:

“Meu filho, se um dia você se casar, tiver problema com mulher, nunca levante a mão para sua mulher. Se não estiver vivendo bem, saia de casa, deixe a mulher cuidar da casa e vá procurar o que fazer, mas nunca levante a mão”.

O governo divulgou uma nota em que afirma que “em nenhum momento o presidente Lula endossa ou endossou” a violência contra as mulheres. Faltou dizer que nem os corintianos estão liberados para bater em suas companheiras.

Com instinto canibal, Eduardo Bolsonaro morde Pablo Marçal



Mestre na arte de dizer mentiras na internet com extrema sinceridade, Eduardo Bolsonaro experimentou do próprio veneno. Habituado a atacar, foi às redes sociais para se defender de uma urucubaca digital postada no Instragram pelo coach bolsonarista Pablo Marçal. O deputado acusou-o de divulgar um "recorte malicioso" de entrevista concedida por ele ao jornal Gazeta do Povo.

Marçal divulgou apenas os trechos da entrevista em que Eduardo o elogia, suprimindo as ressalvas à sua pretensão de chegar à prefeitura de São Paulo. No desmentido, o deputado diz que votará no prefeito Ricardo Nunes. Insinua que Marçal bajula Bolsonaro para atrair o voto bolsonarista.

Com seu "recorte malicioso", Pablo Marçal excluiu da fala de Eduardo justamente o trecho em que ele esclarece que o candidato decepcionou os bolsonaristas que esperavam dele uma conduta à moda do general Pazuello, padrão "um manda, outro obedece".

Eduardo Bolsonaro empilhou interrogações: "Onde estava o Marçal na eleição de 2022? Ele postava 'nem Lula e nem Bolsonaro'. Ele se posicionou sobre a prisão do Daniel Silveira? E sobre as velhinhas presas do 8 de janeiro? É difícil você avalizar alguém em cima da hora."

Imaginava-se que a autofagia fosse uma doença da esquerda. Mas a fome com que Eduardo mastigou Marçal mostra que o primitivismo dos devotos do capitão inclui traços da fúria canibal da tribo dos caetés, que comeram o bispo Pero Fernandes Sardinha, no ano de 1556, no litoral de Alagoas.