segunda-feira, 25 de julho de 2011

O ministro do Supremo convidado para a festa de casamento de um advogado em Capri jura que nem é amigo do noivo

Augusto Nunes



Especializado em proclamar a inocência de gente cujo prontuário implora por uma temporada na cadeia, o advogado criminalista Roberto Podval aparece frequentemente no noticiário dos jornais. No momento, por exemplo, cumpre-lhe garantir que o casal Nardoni não matou a menina Isabella, que Marcelo Sereno se limitou a prestar serviços à pátria quando foi o braço direito de José Dirceu na Casa Civil, que Denise Abreu só pensou nas vítimas dos acidentes e nos flagelados dos aeroportos enquanto agiu na Anac ou que Sérgio Gomes da Silva, vulgo Sombra, nada teve a ver com o assassinato do prefeito Celso Daniel.


Para tirar uma folga da seção de polícia, Podval, 45 anos, resolveu fazer uma escala nas colunas sociais a bordo de um casamento de cinema. Como a noiva tem ascendência italiana, decidiu que o cenário do evento, marcado para 21 de junho, seria o spa na Ilha de Capri que abriga o restaurante L’Ollivo (duas estrelas no Guia Michelin). Assegurada a boa mesa, tratou de acentuar o clima romântico com um show do cantor Peppino di Capri, presença obrigatória nas paradas de sucesso dos anos 60. O noivo avisou aos 200 convidados que todos teriam direito a dois dias de hospedagem gratuita no  Capri Palace Hotel ,um cinco estrelas cujos apartamentos foram ornamentados com champanhe, frutas e brindes. Também colocou a disposição dos viajantes uma equipe de cabeleireiros e maquiadores importados do Brasil.

Conversa fiada

Nada falhou, orgulhou-se em seu blog a empresa contratada para organizar a festa de arromba: “O casamento foi um evento de proporções épicas. Organizamos a chegada dos convidados, auxiliamos nos trâmites de reserva e no deslocamento na Itália via trem ou ferrys, check-in e diversos detalhes para que se sentissem em casa”. A celebração se estendeu até o começo da manhã do dia 22. Exatamente um mês depois da festança, a Folha de S. Paulo devolveu o criminalista às páginas de sempre ao informar que o ministro José Antonio Dias Toffoli ─ que participou do julgamento de dois casos envolvendo clientes de Podval e, no momento, é relator de outros dois ─ comparecera à festança. Não viu nada de errado na viagem a Capri?, quis saber o jornal nesta quinta-feira.

“A viagem foi de caráter estritamente particular”, mandou dizer o ministro pela assessoria de imprensa. Se quisesse, poderia comprovar que arcou com os gastos da viagem e que nem tem intimidade com o criminalista. Mas, segundo a assessoria, “ele se reserva o direito de não fazer qualquer comentário sobre seus compromissos privados”. Conversa fiada, retrucam normas legais e imperativos éticos. Primeiro, Toffoli deve provar que não usou dinheiro público na compra das passagens aéreas nem ficou hospedado num hotel por conta do noivo. Se fez isso, convém ressarcir a União e o advogado ─ e declarar-se impedido de participar de qualquer julgamento em que Podval esteja interessado. É muito amigo para julgar com isenção. Se bancou com o próprio dinheiro uma viagem à Itália só para festejar um casamento, é mais amigo ainda.

“Os casos de suspeição previstos em lei são referentes apenas a relação de amizade íntima ou inimizade capital entre o magistrado e a parte e jamais em relação ao advogado”, intrometeu-se Gabriel Wedy, presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil. Interessada em justificar casos semelhantes protagonizados por dirigentes da entidade, o doutor Gabriel Wedy acabou por juntar-se involuntariamente ao coro dos que exigem que Toffoli fique fora do julgamento do caso do mensalão.

Antes de vestir a toga presenteada por Lula, o ministro foi advogado do PT e chefe da Advocacia-Geral da União. No primeiro emprego, ajudou a preservar o direito de ir e vir dos delinquentes companheiros. No segundo, aprendeu com o mestre a recitar que a roubalheira imensa não aconteceu. Caso insista em julgar os mensaleiros no STF, Toffoli será mais que um juiz suspeito. Será um cúmplice pronto para absolver os culpados.

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