terça-feira, 17 de setembro de 2024

Marçal enfeitiçou-se com seu próprio feitiço após cadeirada




Mago dos memes e dos recortes, Pablo Marçal foi enfeitiçado pelo próprio feitiço no debate da TV Cultura. Privado pelas artimanhas do sorteio de trocar farpas com Ricardo Nunes e Guilherme Boulos, mais bem-postos nas pesquisas, esmerou-se nas provocações ao quinto colocado, insinuando que José Luiz Datena seria estuprador. Alvo de uma cadeirada, passou a administrar a agressão com método. Foi engolido pela esperteza.

Primeiro, Marçal esboçou a intenção de permanecer no debate após a expulsão de Datena. Chegou a esticar a troca de ofensas com seu agressor no intervalo comercial. De repente, em conversa com assessores, optou por refugiar-se nas redes sociais, seu habitat natural. Deixou-se filmar no interior de uma ambulância e no leito do hospital Sírio-Libanês. Exibiu as imagens na internet em meio à tese segundo a qual a cadeirada seria uma repetição dos atentados sofridos por Bolsonaro, em 2018, e Donald Trump, há pouco mais de dois meses.

Num dos vídeos que postou, Marçal exibia uma pulseira verde no pulso. O adereço identifica pacientes sem gravidade. De madrugada, enviou mensagem para o WhatsApp de Datena. Nela, escreveu: "Você fraturou minha costela, cara". O marketing da cadeirada foi pulverizado num boletim divulgado pelo Sírio-Libanês na manhã desta segunda-feira. Marçal sofreu traumatismo na região do tórax à direita e no punho direito, "sem maiores complicações associadas", informou o hospital, dando alta ao candidato.

Percebendo que havia micado o plano de migrar da posição de encrenqueiro profissional para a de vítima, Marçal recalibrou rapidamente o discurso. Em entrevista, retomou o discurso belicoso. Queixou-se da falta de solidariedade dos adversários. Às vésperas de um novo debate, que será levado ao ar pela Rede TV e pelo UOL na manhã desta terça-feira, Marçal declarou-se pronto para a guerra. Aprendeu da pior maneira um velho ensinamento de Tancredo Neves: a esperteza, quando é muita, engole o dono.

O episódio engolfou também o processo eleitoral paulistano. O histrionismo de Marçal e o descontrole emocional de Datena transferiram a disputa do caos para o pântano. Os conflitos já não são dirimidos no âmbito da Justiça Eleitoral, mas na delegacia de polícia. No limite, a própria democracia escorrega no lodaçal.

Ironicamente, Marçal acenara com uma trégua em mensagens enviadas ao celular de Datena 48 horas antes do debate de domingo. Numa das mensagens, Marçal desculpou-se: "Oi, Datena, me perdoe pelas palavras pesadas contra você". Noutra, escreveu: "Tenho sentido que somos animais num zoológico e todos querem ver agressões gratuitas". Em ligação telefônica, um assessor de Marçal sugeriu um encontro. Farejando o que estava por vir, Datena refugou a oferta.

Costuma-se dizer que um macaco senta no próprio rabo para falar mal do rabo dos outros. Ao cobrar serenidade de Datena depois de fustigá-lo na noite de domingo, Marçal estava sentado em cima do seu próprio cinismo. Vivo, Charles Darwin diria que a campanha municipal de São Paulo é a prova de que o ser humano parou de evoluir. Pior: Faz o caminho inverso, rumo às cavernas.

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