sexta-feira, 3 de janeiro de 2014

Guerra fantasma


Sandro Vaia
Para um político no poder não existe nada mais aprazível do que um inimigo. Ele dá conforto, segurança e aconchego. Por isso, muitas vezes, quando ele não existe de verdade, trata-se de inventá-lo.

Há uma condição para que isso dê certo, claro: é preciso que ao agitar o espantalho do inimigo - de preferência que seja inexistente e não ofereça perigo - o governante deve ter a convicção absoluta de que detém o monopólio das virtudes e das boas intenções.

Às vezes acontecem algumas exasperações, como no caso do ditador argentino general Leopoldo Galtieri, subitamente entusiasmado por multidões exaltadas como as que nas praças de touros tonificam seu herói com gritos de olé. (Sem falar, no caso específico, em algumas doses extras de estimulantes alcóolicos).

O excesso de entusiasmo com o “inimigo externo” levou ao desastre das Malvinas, que – é ocioso relembrar – custou a vida de mais de 600 jovens argentinos.

Mas não é desses casos extremos que vamos tratar aqui.

Mais modestamente, a presidente da República em sua prolixa mensagem de fim de ano – o 17º pronunciamento na TV desde que assumiu – referiu-se às críticas ao seu governo como “guerra psicológica”.

A Lei de Segurança Nacional de 1978 falava de “guerra psicológica adversa” (o que não deixa de ser uma curiosa redundância semântica, pois presume-se que toda guerra seja adversa a alguém ), e não se sabe bem porque a presidente foi desenterrar essa concepção esguiana, bastante em desuso nas democracias modernas.

Na verdade, como faz parte de qualquer jogo democrático com regras medianamente estabelecidas e em pleno funcionamento, o que existe, tanto por parte da oposição (que, supõe-se, viva para isso), alguns economistas e parte da imprensa, são críticas pontuais e específicas aos fatores que, na visão deles, impedem o pleno crescimento do potencial do país.

Aí, então, fala-se das dificuldades do balanço de pagamentos, da queda do saldo da balança comercial, das dificuldades para obter um superávit primário minimamente confiável, das idas e vindas das privatizações (apelidadas, vá lá, de concessões), o aumento da carga tributária – enfim, enumeram-se fatos de domínio público que até as pedras da rua estão cansadas de conhecer.

Chamar isso de “guerra psicológica” é pouco mais do que um exagero. Delfim Netto, o socialista fabiano convertido ao lulo-petismo, vive falando nos perigos da “tempestade perfeita”, e com isso ele pretende apenas alertar o governo para o qual torce declaradamente de que há algumas coisas que precisam ser consertadas.

A afirmação da presidente deve ter chocado seus ouvidos sensíveis, pois ele era o ministro do crescer-para-depois-distribuir quando a “guerra psicológica” foi inventada pelo governo a que servia. Pragmático como sempre, disse ao Estadão de quarta que, como a possibilidade de reeleição dela supera os 50%, “o jeito é usar a Dilma”.

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