Bem, tem a economia, os conflitos sociais, as religiões, a música, a poesia, o poder. Alguns acham que tem a tradição ou a história, outros acham que não, que tudo no Brasil acontece uma primeira e única vez. Tem a sociologia, a burocracia e o cotidiano para desmentir isso. Sim, há racionalidade no Brasil. Mas, o que vale mesmo, o que menos se espera, o que funciona acima de tudo, quando não há mais o que pensar, é o indecifrável, o “sobrenatural de Almeida”, o imprevisto e o impensável, o enigma que desce do pedestal para fazer o mundo girar.
Para lembrar de um caso bem recente: quando o PT foi fundado, em 1980, por suas características de partido sindicalista, cristão e cheio de radicais juvenis, poucos acreditavam que um dia seu presidente, o operário Luiz Inácio da Silva, seria o presidente mais popular do Brasil por duas vezes e elegeria sua sucessora. Estava marcado nas estrelas.
Ou lembrar de um mais antigo: quando no dia 16 de novembro de 1889, o jornalista Silva Jardim foi às ruas para ver o que estava acontecendo, descobriu que o Imperador Pedro II havia sido deposto por um golpe militar, e ninguém dera a mínima, nem para defendê-lo nem para criticá-lo. Baixara a República, como uma manga madura que inexoravelmente cai do galho.
Que espanto é o Brasil! Há três meses, como se fosse do nada, um milhão de brasileiros foram às ruas de centenas de cidades para protestar contra a corrupção política, a incúria administrativa e a falta de moral no país. Encheram o saco, queriam mudanças, os políticos tremeram e tremeram, mas, ao final, aceitaram calados o nada que não foi feito. Mais do que esperado.
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