Professora Dorinha: ‘Não vejo teste como problema’ |
A Comissão de Educação da Câmara deve votar na primeira quinzena de novembro projeto de lei que cria o Exame Nacional de Avaliação do Magistério da Educação Básica (Enameb). Já foi aprovado no Senado. Contém uma ideia simples: a cada cinco anos professores de escolas públicas e privadas fariam uma prova. Os resultados dotariam o país de estatísticas que ajudariam a identificar fragilidades do sistema educacional.
Como o Brasil gosta de complicar as coisas simples, o projeto tem muitos opositores. Vinculado à CUT, o sindicalismo educacional torce o nariz. O PT e seus simpatizantes levam o pé atrás. Até o MEC toma distância. Veja como é simples o cenário. Simples como o ABC. A, existem os que precisam aprender. B, há os que se dispõem a ensinar. C, existe um descompasso entre o que deveria ser apreendido pelos alunos e a capacidade dos professores de ensinar.
Chama-se Professora Dorinha Seabra Rezende (DEM-TO) a deputada incumbida de relatar o projeto na Comissão de Educação. Ouvida pelo blog, ela disse que não vê o teste “como um problema”. lembrou que a avaliação periódica de professores está prevista na Lei de Diretrizes e Bases da Educação. Leva o número 9394. Foi sancionada em 1996, sob FHC. Decorridos 17 anos, diz a deputada, a aferição dos conhecimentos dos professores é feita “em poucos Estados”. A proposta em discussão prevê que o teste alcançaria os três ente da federação: municípios, Estados e União.
O projeto foi apresentado por Wilson Matos, um ex-suplente de senador que já não se encontra no Congresso. Os senadores o aprovaram em 2009. Foi remetido à Câmara em ofício cuja cópia está disponível aqui. Datado de 24 de setembro daquele ano, foi assinado por José Sarney, então presidente do Senado. Já lá se vão quase quatro anos. E nada.
A Professora Dorinha está determinada a apresentar o seu relatório na primeira quinzena de novembro. Ela revela simpatia pela proposta que veio do Senado. Conhece os problemas do ensino por dentro. Já foi secretaria de Educação do seu Estado, o Tocantins.
“A primeria coisa que fiz foi aplicar uma prova nos alunos —ainda não havia um exame nacional— e nos professores do 1º ao 5º ano”, conta a deputada. “Verificamos que os alunos eram frágeis naqueles tópicos em que os professores não estavam seguros. O que fizemos? Iniciamos um processo de formação, dando aula aos professores.”
A despeito do apreço que tem pela tese, a Professora Dorinha revela-se preocupada em preparar um texto que deixe bem claro que o objetivo da prova não é o de responsabilizar os professores pelas mazelas do sistema educacional brasileiro. O importante, diz ela, é mapear o problema desde a sua origem, evitando estigmatizar um personagem que é mais vítima do que culpado.
Há dois dias, realizou-se na Comissão de Educação da Câmara uma audiência pública. A maior serventia da sessão foi a de identificar os personagens que frequentam a cena mais interessados em desqualificar a proposta do que em vê-la caminhar.
Presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), entidade filiada à CUT, Roberto Leão disse que é inútil aferir o grau de conhecimento dos professores sem avaliar todo o sistema de ensino. “Os profissionais da educação pública precisam do apoio do governo para se qualificar”, declarou. “O cidadão tem esse direito. O que não pode haver é avaliação para punição do professor. Deve-se avaliar o sistema, o aparato pedagógico, já que a qualidade da educação não depende só da formação do professor. Os problemas da educação devem ser atacados no seu conjunto.”
Tomado pelas palavras, o presidente da principal entidade do sindicalismo educacional parece não ter lido o projeto que rejeita. Na sua versão original, aquela que foi aprovada pelo Senado, o projeto prevê que será “voluntária e gratuita” a participação dos professores na prova do Enamed.
O projeto anota também que os resultados poderão ser usados pelos governos municipais, estaduais e federal “para fins de progressão na carreira do magistério”. Quer dizer: fará a prova quem quiser. Como estímulo aos que se dispuserem a fazer, acena-se com a melhoria do contracheque.
Noutro trecho, a proposta prevê que a aplicação da prova “será acompanhada de instrumento destinado a levantar o perfil dos professores e suas condições de trabalho, com o fim de melhor compreender seus resultados.” Nesse trecho, o projeto revela preocupação com a tese de Roberto Leão segundo a qual “os problemas da educação devem ser atacados no seu conjunto.”
Compareceu também à audiência pública o diretor de Valorização dos Profissionais da Educação do MEC, Antônio Roberto Lambertucci. Disse que a aprovação do teste “representaria mais ônus, sem a devida eficácia”. Segundo ele, os professores “já passam hoje por uma série de avaliações, na graduação, no concurso público, no fim do estágio probatório e nas avaliações periódicas de desempenho. Um exame nacional padronizado não auxilia nesse processo.”
Para não deixar dúvidas quanto à sua opinião de que o melhor é deixar tudo como está para ver como é que fica, Antônio Lambertucci saiu-se com essa: “A avaliação é um instrumento complexo, que deve ser feita no contexto cultural e social em que se insere cada professor”. A Professora Dorinha interveio para realçar a falta de nexo do argumento.
Ela lembrou ao orador que os alunos da educação básica submetem-se a um exame nacional que permite ao MEC compor o Ideb, Índice de Desenvolvimento da Educação Básica. A deputada foi ao ponto: “Se podemos avaliar nacionalmente os alunos do ensino médio e do ensino fundamental por meio de uma base nacional comum, por que não podemos fazer o mesmo com os professores?”.
Na conversa com o repórter, a Professora Dorinha reforçou seu argumento lembrando que o MEC aplicará neste final de semana as provas do Enem, o Exame Nacional do Ensino Médio. Inscreveram-se 7.173.574 alunos. Ou seja: não será por falta de estrutura e experiência que os professores deixarão de ser submetidos a teste.
Foi ao microfone na audiência da Comissão de Educação um representante do Inep, o instituto do MEC responsável pelas provas do Enem. Diretor de Avaliação de Educação Básica do órgão, Alexandre André dos Santos apegou-se ao custo para atacar o exame dos professores. Disse que a prova custaria R$ 50 por professor. “O custo de uma avaliação dessa natureza é muito elevado para o país”, disse Alexandre. “Tendo em vista esse custo, é preciso avaliar se o exame é uma ação prioritária do governo federal.” Aparentemente, não é.
As duas coisas mais perigosas do mundo são o aluno interessado e o professor habilitado. Juntos, eles levam faltalmente a uma sociedade civilizada, questionadora e atenta às coisas simples que muitos tentam complicar.
Josias de Souza
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