Instrumentos
legítimos do processo democrático estão tendo o uso deturpado para servir à
corrupção. Essa é a constatação a que muitos estudiosos chegaram após analisar
práticas cotidianas da vida política, como o lobby, emendas parlamentares e
doações para campanhas eleitorais. Se isso não bastasse, políticos pegando
carona em jatinhos de empresas que têm relação com o governo e dossiês que
propagam suposições como verdades têm se transformado em práticas corriqueiras.
Conheça melhor cada uma destas atividades:
LOBBY
O lobby é uma atividade legítima em diversos países, mas no Brasil é muito
associado à corrupção. Nos mais recentes escândalos no governo federal lobistas
apareceram entre os suspeitos de desvios de recursos. Eles davam expediente em
ministérios sem ter cargos e tinham como principal função defender de forma
suspeita interesses de terceiros, seja uma empresa ou um político.
Uma das razões para essa relação estreita entre lobby e corrupção, dizem
estudiosos, é a falta de regulamentação da atividade, garantida na Constituição.
Há 20 anos, tentativas de normatizar o lobby aguardam definição do Congresso.
EMENDAS PARLAMENTARES
Esse é outro instrumento legítimo numa democracia e que tem tido o uso
deturpado. O assunto já foi alvo de um estudo acadêmico que constatou uma
estreita relação entre emendas parlamentares e corrupção. Após análises de
relatórios da Controladoria Geral da União (CGU), uma analista do órgão e autora
do estudo, Maria Fernanda Colaço Alves, constatou que o número de
irregularidades administrativas encontradas em prefeituras estava associado ao
repasse de recursos por emendas.
- Um caminho natural para buscar uma redução da corrupção por meio das
emendas parlamentares não é a extinção delas. São instrumentos que fazem parte
do processo democrático. Precisamos fortalecer os níveis de controle do uso
desses recursos que são muito frágeis, seja no âmbito federal como no municipal
- disse Maria Fernanda.
Pelas regras atuais cada deputado federal pode indicar emendas num total de
R$ 12,5 milhões por ano.
ENRIQUECIMENTO DO AGENTE PÚBLICO
A regra é clara. O agente público tem que disponibilizar a sua declaração de
bens anualmente ao governo para que seja feito um controle sobre o aumento
patrimonial do servidor. O objetivo é identificar casos de enriquecimento
ilícito, quando o patrimônio é incompatível com a renda. Mas, na prática, essa
fiscalização não existe. A constatação é de um trabalho acadêmico que foi
premiado pela Controladoria Geral da União (CGU), um dos órgãos responsáveis por
fazer esse controle. O autor da pesquisa é o auditor fiscal e delegado da
Receita Federal Marco Aurélio de Oliveira Barbosa.
- Quando a CGU ou o TCU vai fazer uma auditoria no órgão, eu constatei que
seles perguntam se está sendo exigida a declaração do servidor e, se sim, isso
já satisfaz. O objetivo que seria analisar o conteúdo da declaração para saber
se houve enriquecimento ilícito não é feito. É aquela história para inglês ver -
diz Barbosa.
DOAÇÃO DE EMPRESAS A CAMPANHAS ELEITORAIS
Doações
milionárias de empresas com contratos junto à administração pública para
campanhas eleitorais estão sendo questionadas quanto à sua constitucionalidade.
Diante de inúmeros indícios de corrupção, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB)
decidiu na semana passada que vai entrar no Supremo Tribunal Federal com uma
ação direta de inconstitucionalidade pedindo o fim das doações por empresas que
trabalham para o governo. O argumento é a prática "compromete o processo
democrático, promove a desigualdade política e alimenta a corrupção".
CONTRATAÇÃO DE SERVIDOR PÚBLICO PELA INICIATIVA PRIVADA
O assédio do setor privado para contratação de funcionários públicos
licenciados ou egressos dos cargos no governo começa a chamar a atenção da
Comissão de Ética Pública da Presidência e do meio acadêmico. Não existem
estatísticas do fenômeno no Brasil, mas, independentemente da dimensão do
problema, o impacto é certamente lesivo ao poder público. Nem sempre se trata de
corrupção, mas governo e sociedade perdem.
- As regras no Brasil são muito frágeis, apesar de parecerem muito
simpáticas. Por exemplo, há a quarentena de quatro meses, mas isso é
absolutamente insuficiente para lidar com o problema maior, que é a mobilização
dos grupos de interesses. Acaba tendo um efeito perverso, uma espécie de carta
de alforria, de inoculação - diz o professor de políticas públicas da Ebape/FGV
e professor associado do Departamento de Economia da PUC-Rio, Jorge Vianna
Monteiro.
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