terça-feira, 21 de maio de 2019

Qual o Bolsonaro de hoje? O golpista? O que aceita o Congresso?



Qual Jair Bolsonaro estará à frente da Presidência nesta terça? É aquele que, na Firjan (Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro) voltou a atacar os políticos ou um outro, que numa solenidade de lançamento de uma campanha publicitária em favor da reforma da Previdência, fez um aceno ao Congresso? Não se sabe. Depende. Como diria o poeta, a única certeza que se pode ter sobre Bolsonaro é a inconstância. É essa a sua constância. E isso resulta num governo caótico.

Sem articulação, retórica sobre destino do país é balofa e inútil


Na sexta, o presidente divulgou um texto primário e golpista, segundo o qual o Congresso, o STF, o empresariado e até os militares atrapalham seu governo. Esse mesmo Bolsonaro, no domingo, espalhou um vídeo de um pastor congolês para quem essa tal Jair é mesmo o messias, um enviado por Deus, e, segundo o tal, não se deve criticar o presidente nem lhe fazer oposição. Esse chefe autocrático do Executivo ainda esteve na manhã desta segunda na Firjan e mandou bala: nos políticos e na gramática, como é de seu gosto e estilo. Wilson Witzel, governador do Rio, e Marcelo Crivella, prefeito da Capital, estavam presentes. Afirmou o presidente: 

"[O Brasil] É um país maravilhoso, que tem tudo para dar certo, mas o grande problema é a nossa classe política. É nós' (sic), Witzel, 'é nós' (sic) Crivella, sou eu, Jair Bolsonaro, é o Parlamento em grande parte, é a Câmara Municipal, a Assembleia Legislativa. Nós temos que mudar isso. Não existe maior satisfação para um político do que ser reconhecido em qualquer lugar, do Brasil ou fora do Brasil. Reconhecido pelo lado bom. Então nós temos como mudar o destino do Brasil". 

Eis Bolsonaro em estado puro. Vive em busca desse tal "grande destino", desse "país maravilhoso", mas é incapaz de organizar uma base de apoio que permita a existência de um Congresso minimamente funcional. Sem efetiva articulação política, trata-se de retórica balofa e inútil.

Na Firjan, a baixa tolerância de Bolsonaro para a divergência

A temperatura já estava alta com as bobagens feitas no fim de semana. Voltou a se elevar com o discurso na Firjan. Bolsonaro deixou mais uma vez evidente a sua baixíssima tolerância para o contraditório. Afirmou: 
"Cada vez que eu toco o dedo numa ferida, um exército de pessoas influentes se vira contra mim, buscam de todas as maneiras me desacreditar"

E, claro, atribui à tal mídia, como de hábito, a responsabilidade por desacertos que, por óbvio, são apenas seus. Criticar, divergir, apontar falhas são características das disputas políticas e, ora vejam, da cobertura que a imprensa faz sobre o assunto. Assim foi com todos os presidentes da República. 

Mais tarde, no Palácio do Planalto, no lançamento da campanha publicitária sobre a reforma, Bolsonaro mudou o tom: 
"Nós valorizamos, sim, o parlamento brasileiro, que vai ser quem vai dar a palavra final nesta questão da Previdência, tão rejeitada ao longo dos últimos anos". 

Foi, de fato, muito rejeitada. E um de seus mais duros adversários era justamente o então deputado Jair Bolsonaro. Como compunha o chamado "baixo clero" e direcionava sua militância barulhenta contra gays e esquerdistas, dava-se pouco relevo a outros aspectos de sua atuação. No ano passado, já pré-candidato à Presidência, atacou com virulência a proposta apresentada pelo então presidente Michel Temer. Veja vídeo:


No Planalto, Bolsonaro muda o tom com parlamentares. Adianta?


Sabe qual é o problema? Nos 28 anos na Câmara, Bolsonaro nunca participou efetivamente de nenhuma negociação, de nenhuma costura política importante. Não conhece o funcionamento do Parlamento. Ainda tentando ser amistoso com os congressistas, afirmou na solenidade no Planalto: 
"Aos parlamentares como um todo, quero dizer: 'só não recebo mais por falta de agenda. Mas gostaria de continuar a conversar com o maior número possível de vocês para que possíveis equívocos, possíveis melhoras, nós possamos junto ao Parlamento brasileiro buscar". 

Mas acrescentou: 
"Se bem que pretendemos que nossa reforma saia de lá com o menor número possível de emendas aprovadas". 

É um sem-jeito.

Ônix e reforma em 3 semanas. Não haverá. Patriotismo como refúgio


Outra dificuldade de Bolsonaro é que mesmo os seus homens encarregados da negociação política vivem num estágio de negação da realidade, de alienação. Presente à cerimônia de lançamento da campanha em favor da Previdência, Onix Lorenzoni, ministro da Casa Civil, afirmou: 
"A nova Previdência vai ser aprovada agora no início de junho. Sabe por quê? Porque os homens e mulheres, as mulheres e os homens, que estão no parlamento brasileiro sabem que ela é fundamental para o presente e futuro do país que todos nós amamos". 

E acrescentou: 
"Temos diferenças ideológicas? Sim. Temos diferenças de concepção de países? Também. Temos diferenças de concepção de governabilidade? Também. Mas há uma responsabilidade que está acima de cada um de nós, que é a responsabilidade com a pátria que nós amamos" 

A chance de se aprovar a reforma em três semanas é inferior a zero. E por que Lorenzoni falou? Porque, dada a ausência de articulação política, fala-se qualquer coisa e se apela ao patriotismo como última saída.

Por Reinaldo Azevedo

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