Nenhum governo gosta de admitir que perdeu uma votação no Congresso. Mas é preciso tomar cuidado para não transformar uma cena ruim num episódio de pastelão. Na votação da medida provisória que redecorou a Esplanada, o Planalto cavalgou três cavalos de batalha: Coaf, mordaça da Receita e número de ministérios. Concluiu-se a votação na Câmara. No Coaf, o governo perdeu para o centrão. No poder do Fisco e na quantidade de pastas, derrotou a si mesmo. Nos três casos, enrolou-se sem a ajuda da oposição.
Exposto na vitrine das redes sociais pela turma do PSL, o centrão emagreceu. Amedrontada, parte de sua infantaria votou a favor da manutenção do Coaf nas mãos de Sergio Moro. Ainda assim, o órgão que fiscaliza movimentações bancárias suspeitas foi devolvido à pasta da Economia por um placar de 228 votos a 210. A diferença foi miúda: apenas 18 votos. Mas o ex-juiz da Lava Jato, embora não tenha beijado a lona, saiu do ringue com um olho roxo.
O Planalto celebrou o expurgo da emenda-jabuti que proibia auditores da Receita de comunicar ao Ministério Público crimes não-tributários —lavagem de dinheiro e corrupção, por exemplo. Chama-se Fernando Bezerra (MDB-PE) o senador que colocou o jabuti nos galhos da MP. Vem a ser o líder de Bolsonaro no Senado. Continua no posto. Quer dizer: o governo prevaleceu contra o líder do presidente.
Soltaram-se fogos no Planalto também pela retirada do artigo que trocava um ministério novo (Desenvolvimento Regional) por duas pastas velhas (Cidades e Integração Nacional). Com isso, o organograma do governo continua com 22 ministérios. A recriação de ministérios resultara de negociação direta de Bolsonaro com Rodrigo Maia e Davi Alcolumbre, mandarins da Câmara e do Senado. Ou seja: nesse caso, os rojões do bunker palaciano festejaram um recuo do capitão.
Na matemática palaciana, Bolsonaro saiu ileso do plenário da Câmara, pois o Coaf funcionará na Economia com a mesma eficiência que exibiria na Justiça, o Fisco salvou suas prerrogativas e a Esplanada não foi esticada. A contabilidade parece inofensiva, mas embute um perigo. O derretimento precoce de um governo que vive o seu quinto mês de existência confunde falta de votos no Legislativo e ineficiência política com força e eficácia. Fragilizado, o centrão continua na tocaia.
Por Josias de Souza
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