Jair Bolsonaro, como se sabe, mantém um relacionamento inamistoso com a imprensa e os jornalistas. Mas não há meio de comunicação ou comunicador que lhe sonegue o direito de exercitar sua liberdade de expressão. Mesmo quando o capitão tem dificuldades para se exprimir —como num post em que falou sobre a mídia como se o livre fluxo de informações e opiniões fosse uma concessão do seu governo e de sua magnânima generosidade presidencial.
"Em meu governo a chama da democracia será mantida sem qualquer regulamentação da mídia, aí incluída as sociais (sic). Quem achar o contrário recomendo um estágio na Coréia do Norte ou Cuba."
Tomado ao pé da letra, Bolsonaro insinua que, se quisesse, poderia lançar mão de seus poderes imperiais para controlar a imprensa e as mídias que ele ajudou a tornar antissociais. A julgar pela forma como cultua a ditadura militar, não deve faltar vontade. Entretanto, a presunção do capitão é autoilusória e ofensiva.
Bolsonaro se ilude porque, a essa altura, já deve ter percebido que seu poder efetivo não vai muito além do Planalto e de um grupo de umas 50 pessoas. Sua manifestação ofende porque parte do pressuposto de que a sociedade brasileira é feita de imbecis.
Os últimos que cometeram esse tipo de equívoco foram os ministros Dias Toffoli e Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal. Imaginando-se dotados de poderes autocráticos, os dois tentaram censurar notícia que deixava Toffoli mal. A reação foi tão devastadora que tiveram de recuar para não ser desautorizados por seus próprios colegas de tribunal.
Imagine-se o que ocorreria se Bolsonaro enviasse ao Congresso uma proposta de regulação da mídia, eufemismo para censura. O barulho seria instantâneo. As reações ecoariam dentro e fora do país. Hoje, seria mais fácil aprovar um pedido de impeachment do presidente da República.
Deve-se a manifestação presunçosa do capitão a uma tentativa de se distanciar de posições anti-mídias sociais atribuídas ao general e ministro palaciano Carlos Santos Cruz. De quebra, o capitão estabelece um contraponto em relação a Lula.
Em entrevista à Folha e ao El Pais, o presidiário petista declarou: "Quando falam em autocrítica, eu acho que nós devemos ter muitos erros. Eu, por exemplo, tive um erro grave. Eu poderia ter feito a regulamentação dos meios de comunicação. É uma autocrítica que eu faço."
Quer dizer: para Lula, a liberdade de expressão não é senão uma lamentável negligência dos governos do PT. Ironicamente, ele fez tal insinuação a dois jornais que guerrearam no Judiciário para que ele pudesse se expressar mesmo estando preso. Foi preciso ouvi-lo por mais de duas horas para descobrir que ele tinha pouquíssimo a dizer.
Bolsonaro e Lula ainda se darão conta de que as duas coisas mais perigosas numa democracia são a imprensa livre e a sociedade consciente. Juntas, elas conduzem governantes ineptos à impopularidade e larápios à cadeia.
Por Josias de Souza
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