segunda-feira, 9 de junho de 2014

Reeleição dependerá mais de Dilma que de Lula


Fábio Pozzebom/ABr

Dilma Rousseff tem vários problemas sobre a mesa. Três são especialmente graves: a estagnação do PIB, a excitação da inflação e a deterioração estética do governo. A presidente não tem nada a dizer a respeito de nenhuma dessas encrencas. Seu silêncio potencializa a atmosfera de exaustão que enredou o poder federal. A ideia de que o prestígio de Lula funcionará como vacina contra o desânimo é ilusória.

Em 2010, Dilma era uma técnica desconhecida avalizada por Lula, chefe de um governo que mais de dois terços da sociedade desejava continuar. Em 2014, Dilma é uma presidente superconhecida, que reivindica o direito de continuar uma administração que 74% do eleitorado deseja mudar. Em privado, o próprio Lula reconhece que cabe a Dilma postar-se na linha de frente da defesa de sua gestão.

O pessimismo em relação ao futuro cresceu. Segundo o Datafolha, 36% dos brasileiros acham que a situação vai piorar nos próximos meses. Para 64%, a inflação vai subir ainda mais. Por mal dos pecados, essa percepção tende a ser confirmada pelos fatos.

A economia estagnou. No primeiro trimestre, cresceu irrisórios 0,2%. No segundo trimestre, não está descartada a hipótese de um índice negativo. Formou-se entre os especialistas um sólido consenso de que o PIB de 2014 será inferior aos 2,5% anotados no ano passado. Disso nem o Banco Central discorda.

A inflação acumulada em doze meses cresce a despeito da alta dos juros. Em janeiro, estava em 5,59%. Em maio, informou o IBGE na semana passada, bateu em 6,37%. Em abril, fora de 6,28%. A carestia pode até registrar pequenos recuos na aferição feita mês a mês. Mas, na medição acumulada, continua flertando perigosamente com um índice acima do teto da meta oficial de inflação, que é de 6,5%.

Há dois dias, numa palestra em Porto Alegre, até Lula rendeu-se ao óbvio. “Também não estou gostando da inflação de 6%”, disse ele. “Eu queria 4,5%, quem sabe 3,5%.” De repente, a “vacina” de Dilma começa a destilar um discurso que soa como veneno:

“A inflação está um pouquinho alta. É como se a pessoa não tivesse 37° de febre, estivesse com 38°, mas precisa começar a tomar remédio já para não deixar chegar a 39° ou 40°. Senão tem que dar um choque mais pesado, um banho gelado.”

Com o prestígio em queda, Dilma assiste, impotente, à queda da sua taxa de intenção de votos. Despencou dez pontos desde fevereiro. No último Datafolha, caiu de 37% para 34% em um mês. Um aliado que torce pela reeleição realçou, neste domingo: um candidato petista, seja quem for, costuma arrastar um terço dos votos. É esse o eleitorado que historicamente se identifica com o partido. “Dilma está ficando do tamanho do PT”, constatou.

O mesmo aliado pinçou nas dobras da pesquisa dados que considerou “preocupantes”. A queda de Dilma foi maior nos pedaços do mapa brasileiro onde se imaginava que programas como o Bolsa Família a blindavam. Recuou de 53% para 44% na região Norte. Caiu de 54% para 48% no Nordeste. Há um ano, disse o torcedor de Dilma, esse tipo de movimento era “impensável”.

Além de Lula, a principal arma de Dilma contra seus atagonistas é o tempo de propaganda. Numa articulação que elevou o déficit estético do seu governo, Dilma trocou cargos e verbas por um latifúndio eletrônico de mais de 12 minutos. A dúvida é: além da cara de Lula e dos truques mistificadores de João Santana, o que a presidente da República levará à vitrine?

No universo da marquetagem política, convencionou-se dizer que um gestor público precisa dispor de uma taxa mínima de aprovação de 34% para pensar em reeleição. De acordo com o Datafolha, Dilma já está abaixo desse patamar. Apenas 33% dos eleitores consideram o seu governo ótimo ou bom. A gestão da supergerente escorrega para um cenário de apagão gerencial.

Dilma pode enfrentar suas dificuldades de várias maneiras. O silêncio é a pior delas. A melhor seria reconhecer os problemas e dizer o que pretende fazer para resolvê-los. Para chegar a esse estágio, a presidente precisaria ter a honestidade intelectual de reconhecer que seu governo não é a maravilha que a propaganda tenta vender. Mas autocrítica não é um vocábulo que Dilma aprecie.

Lula continua a postos. Pedirá votos para sua pupila na tevê e nos palanques. Mas também ele precisaria responder a uma pergunta que até os brasileios que o admiram fazem aos seus botões: o que foi feito daquela gerente extraordinária de 2010?

Na palestra de Porto Alegre, Lula ensaiou uma explicação que ficou mais parecida com um autoelogio do que com uma defesa de Dilma: “Pouca gente vai ter condição neste país de repetir o sucesso do meu segundo mandato.” Ao poucos, vai ficando claro: ou Dilma assume o papel de cabo eleitoral de si mesma ou corre o risco de comprometer sua reeleição.

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