Por Augusto Nunes
Dilma Rousseff até que fez bonito na prova de leitura de discurso: abstraídas três ou quatro derrapagens veniais (como o “Vicente” acrescentado ao prenome do presidente João Belchior Marques Goulart), recitou com cuidado e atenção o texto escrito por algum assessor alfabetizado. Como antecipou esta coluna, o desastre começou a desenhar-se na etapa seguinte, reservada ao duelo verbal entre a depoente e parlamentares favoráveis ao impeachment.
“Após discurso firme, Dilma volta a ser Dilma”, resumiu o título do post publicado pelo site de VEJA. “A presidente afastada voltou a fazer uso do ‘dilmês’ na fase de interrogatório”, constatou o texto. “A retórica confusa que sempre a caracterizou deu o tom das respostas aos senadores. Com frases emendadas umas nas outras e nem sempre respeitando a lógica, a presidente retomou o uso de metáforas e dos pleonasmos que consagraram o idioma próprio de Dilma”.
O zero com louvor em falatórios de improviso foi garantido com as respostas que deu às duas primeiras perguntas menos amistosas. A senadora Ana Amélia (PP-RS) quis saber o que Dilma queria dizer com a expressão “golpe parlamentar”. A interrogada pendurou-se numa imagem provavelmente nascida das trocas de ideias com a senadora ruralista e melhor amiga Kátia Abreu.
“A diferença consiste que no golpe militar é como se você tivesse uma árvore, que você derruba o governo e o regime democrático”, desandou o neurônio solitário. “O que tem acontecido no golpe parlamentar é que você tira um presidente eleito por razões que estão fragilizadas pelo fato de que não tem crime de responsabilidade que as sustentem. É como se essa árvore não fosse derrubada, mas atacada por forte e intenso ataque de fungos, por exemplo”.
Segundo da fila puxada por Ana Amélia, o senador Ricardo Ferraço (PSDB-ES) descobriu que, na cabeça baldia da presidente agonizante, a mentira comporta matizes até aqui ignorados pela ciência. “Considero que essa sua acusação é improcedente”, ensinou Dilma. “Acho que ela é aquela mentira que não tem base na realidade, ou seja, ela não expressa a verdade dos fatos”. Se existe aquela mentira sem relação com o mundo real, então também existe a mentira baseada em fatos.
O restante da sessão confirmou que, ao longo do depoimento reduzido a uma inutilidade tediosa, o grande ausente foi um intérprete. Faltou alguém que fizesse a tradução simultânea da mais longa sequência de improvisos em dilmês. Alguns senadores conseguiram decifrar a essência do falatório sem pé nem cabeça. Outros foram dormir sem saber o que a depoente estava tentando dizer para, como sempre, ocultar a verdade.
Nenhum comentário:
Postar um comentário