Por Reinaldo Azevedo
Costumo recorrer a uma metáfora bastante popular para me referir a este momento em que todos querem investigar tudo, o que é saudável, desde que respeitadas as regras. E agora a metáfora: é preciso não jogar a criancinha fora junto com a água servida, a água suja. E especial cuidado precisa ser tomado quando organizações corporativistas decidem usar o especial poder de que dispõem para vazar informações contra algumas figuras selecionadas.
O ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, está na mira. Há uma pressão para que o governo passe a nomear o delegado-geral da Polícia Federal eleito pelos próprios delegados, em lista tríplice — que, de resto, a exemplo do que ocorre com o procurador-geral da República, seria tríplice só para inglês ver: o que a categoria quer é o “direito” de eleger o comandante da PF. E ponto.
Não custa lembrar à margem: a eleição do procurador-geral da República só por procuradores não está em lugar nenhum da Constituição. É uma invenção. E é antidemocrática até entre os pares: afinal, só os procuradores do Ministério Público Federal escolhem aquele que vai comandar o Ministério Público da União, que inclui também o Ministério Público do Trabalho, o Ministério Público Militar e o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios. Os membros desses outros entes nem podem votar nem são votados. Como se explica isso? Ora, perguntem aos procuradores que tipo de democracia é essa. Adiante.
A Folha publicou uma reportagem na sexta informando que, entre 2010 e 2014, a empresa a JHSF Participações, de São Paulo, pagou R$ 4 milhões em honorários advocatícios ao escritório a que pertencia o agora ministro da Justiça. A empresa é uma das investigadas da Operação Acrônimo. Atenção! Moraes não exercia nenhum cargo público no período. Estava exercendo a advocacia privada. O pedido de investigação já chegou ao Supremo, e o ministro Luiz Fux mandou arquivá-lo. Emana de setores da PF uma, digamos, indiscreta pressão para encruar o caso.
A OAB de São Paulo soltou uma nota de protesto em defesa do que chamou “atividade advocatícia”.
Vamos ver
A Operação Acrônimo foi deflagrada no dia 29 de maio de 2015. Os pagamentos ao escritório a que pertencia Moraes foram feitos entre 2010 e 2014. Bem, há coisas que certamente ele não teria como saber:
a: que a empresa seria alvo de uma investigação;
b: que ele próprio seria ministro da Justiça.
Se houver algum indício de irregularidade no pagamento, que se investigue. Mas não há, que se saiba. O que se nota é que a coisa é notícia e que a pressão existe porque a empresa passou a ser investigada, e Moraes se tornou ministro. Aí fica difícil: será que todos escritórios de advocacia que prestaram serviços, por exemplo, paras empreiteiras investigadas estão sob suspeição? Mais: seria o caso, então, de suspender o direito de defesa de acusados, já que há quem queira que os advogados se tornam suspeitos ao advogar para uma empresa acusada?
As coisas por aí trilham um mau caminho. Há advogados bandidos? É claro que há. Ninguém está acima da investigação. Mas a suspeita pela suspeita não parece ser um bom caminho.
Abaixo, segue nota divulgada pela OAB-SP
Interpretação que precisa ser combatida, pela constância com que tem aparecido na mídia, hoje desponta em reportagem publicada na Folha de Paulo (08/10), atingindo o advogado e atualmente ministro da Justiça, Alexandre de Moraes. Surge no texto, mais uma vez, o equívoco de se questionar um advogado a partir de suspeitas sobre o seu cliente.
Ao duvidar da natureza dos serviços prestados pelo advogado pela afirmação de que ela está protegida por cláusula de sigilo, a matéria desconsidera a importante prerrogativa profissional essencial ao direito de defesa. O advogado é obrigado por lei, pela ética da atividade e, até mesmo, perante uma autoridade judiciária a preservar o sigilo. Não haveria ambiente de confiança entre cliente e advogado, se o primeiro não tivesse a segurança de que o profissional estaria impedido de participar a terceiros o que foi conversado entre ambos.
A OAB SP repudia toda e qualquer iniciativa que confunda a imagem de um advogado com a do cliente pelo fato de lhe prestar serviços advocatícios. Distorção que, em nada, contribui para a compreensão pela sociedade da importância da advocacia para que a Justiça seja feita em pleno Estado Democrático de Direito.
Marcos da Costa
Presidente da OAB SP
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