sexta-feira, 18 de dezembro de 2015

Supremo atropela a Constituição e o Regimento da Câmara em tarde vergonhosa…



Convenham! Todos somos um tanto tentados pelo diabo, não é mesmo? A literatura, até a brasileira, é rica no trato dessa voz interna que nos recomenda: “Deixe o circo pegar fogo!”. Não é diferente comigo. Se fosse só pelo gosto, deveria estar aqui dando pulos de alegria. Se tudo der certo para Dilma, dará tudo errado para o PT. Não deixa de ser bom! O chato é que o país vai pagar uma conta altíssima se esta senhora continuar na Presidência. E aí quem fala ao meu ouvido é o anjo, que quer o bem.

O Supremo atravessou a rua hoje para se meter na crise, numa evidência de que a arruaça desses tempos, que tomou conta do Executivo e do Legislativo, chegou ao Supremo, como chegou à Procuradoria-Geral da República. Querem saber? Foi um dia mais triste para o tribunal do que propriamente para o país. Vamos a uma síntese.

AS REJEIÇÕES

– A corte rejeitou por unanimidade a tese de que Eduardo Cunha estaria obrigado a receber uma defesa prévia de Dilma antes de dar continuidade ao processo.

– A corte rejeitou por unanimidade a tese de que Eduardo Cunha não poderia participar do processo porque adversário político da presidente.

Bem, de tão absurdas que são as duas formulações, nem se parabenize o tribunal por rejeitá-las.

Mas…

O PODER DO SENADO

O Supremo, por maioria, com divergência aberta pelo petista sem carteirinha Roberto Barroso, decidiu que a Câmara faz apenas o juízo de admissibilidade do impeachment e que isso não obriga o Senado a abrir o processo. Opuseram-se à tese apenas os ministros Luís Edson Fachin (relator), Dias Toffoli (em sessão memorável) e Gilmar Mendes (para não variar, votando bem!).

Assim, o que vai acontecer? Caso a Câmara dê autorização para o Senado processar e julgar a presidente, tal decisão será submetida ao plenário do Senado, que vai deliberar por maioria simples: metade mais um dos que votarem (desde que estejam presentes metade mais um dos 81 senadores).

Trata-se de uma clara violação ao que estabelece a Constituição no Artigo 86, a saber:
Art. 86. Admitida a acusação contra o Presidente da República, por dois terços da Câmara dos Deputados, será ele submetido a julgamento perante o Supremo Tribunal Federal, nas infrações penais comuns, ou perante o Senado Federal, nos crimes de responsabilidade.

Notem que, ali, se diz “será”, não “pode ser, a depender de…”.

Mas, atenção!, tal votação de admissibilidade se fez no impeachment de Collor. Ainda se encontra ao menos um grãozinho de razoabilidade no que é dito. Quanto ao resto, aí a coisa caminha para o absurdo.

A COMISSÃO

A maioria dos ministros decidiu, na prática, tornar sem efeito a comissão do impeachment criada na Câmara. Roberto Barroso inventou a regra — e acabou emplacando a tese — de que não se admite candidatura avulsa nesse caso. Ou por outra: a comissão só pode ser formada, segundo a proporcionalidade dos partidos, com os membros indicados pelos líderes.

Ora, então por que fazer votação? É um escândalo! Se não pode haver disputa, a questão do voto secreto ou aberto é irrelevante.

DESTAQUES POSITIVOS E NEGATIVOS

Destaque-se a qualidade do voto, nesta quarta, de Dias Toffoli, que tentou chamar atenção dos seus pares para o fato de que o tribunal estava entrando na economia interna do outro Poder — na prática, legislava sobre questões de procedimento interno. Um vexame e um escândalo.

Luís Edson Fachin deu um voto exemplar, preservando a independência entre os Poderes. Gilmar Mendes chamou atenção para o fato de que o tribunal havia deixado de votar questões de princípio para fornecer oxigênio a um governo que pretende se manter à custa de tribunais.

Não darei o destaque negativo para Barroso. Eu espero dele sempre o pior, e ele nunca me decepciona. Quem realmente enfiou o pé na jaca desta feita foi Celso de Mello. Sem conseguir ancorar sua decisão nas leis ou na Constituição, saiu-se com a máxima de que o Senado precisaria ter o poder de barrar a instauração de um processo levando-se em conta o “útil, o oportuno e o conveniente”.

O ministro deve ter se esquecido de que os senadores poderiam levar isso em conta na hora do julgamento.

Não se vai decidir nada neste ano, e tudo se transfere para 2016. Essa história está muito longe do fim.

Ministros do Supremo que ignoraram a Constituição e o Regimento Interno em seu voto ignoraram também a população. Que vai às ruas dizer o que pensa. Aí nós vamos ver.

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