Por mais bem orientado que tenha sido pelos que o defendem, e por mais esperto que possa ser como sua longa trajetória política o demonstra, Lula pisou na bola em diversos momentos do seu primeiro encontro face a face com o juiz Sérgio Moro. Os mais notáveis tropeços:
A reforma que disse desconhecer
Em diversas ocasiões do interrogatório, Lula disse que o tríplex do Guarujá era coisa de Marisa Letícia, sua mulher. E que ele jamais encomendou, ou ficou sabendo, que o tríplex fora reformado para abrigar sua família. Se a construtora OAS o fez, o problema foi dela, interessada em vendê-lo.
Ocorre que o Instituto Lula, em nota oficial de janeiro do ano passado no formato de pergunta a resposta, e na época incorporada à retórica da defesa do ex-presidente, afirmou o que segue:
“Por que a família desistiu de comprar o apartamento? Porque, mesmo tendo sido realizadas reformas e modificações no imóvel (que naturalmente seriam incorporadas ao valor final da compra), as notícias infundadas, boatos e ilações romperam a privacidade necessária ao uso familiar do apartamento”.
Provocado pelo procurador Roberson Pozzobon, Lula afirmou diante de Moro que não fora consultado para a elaboração da nota:
- Eu não sou dirigente do instituto. A nota é feita com a direção do instituto em combinação com os advogados que conhecem o projeto e o processo todo. Nem sempre, quando a nota é feita, eu estou no instituto.
Pode não ter sido consultado. Poderia não estar no instituto quando a nota foi escrita e divulgada. Mas é impossível que não a tenha lido depois. E visto que a nota, em outras palavras, confirma o que a imprensa publicara: que o tríplex reformado se destinava à sua família. Tanto que as modificações feitas nele “naturalmente seriam incorporadas ao valor final da compra”.
O encontro com Renato Duque
O ex-diretor da Petrobras, indicado pelo PT e nomeado por Lula, havia sido preso e depois solto, denunciado pelo Ministério Público Federal por corrupção e lavagem de dinheiro, quando Lula em 2014 se reuniu com ele em um hangar do aeroporto de Congonhas, em São Paulo.
Ex-presidente da República desde janeiro de 2011, o que Lula poderia querer se encontrando com uma pessoa que disse desconhecer, que jamais estivera com ela, e incriminado pela Lava Jato? Ele acionou João Vaccari, tesoureiro do PT hoje preso em Curitiba, para localizar Duque e marcar o encontro.
Lula contou a Moro que lera nos jornais que Duque poderia ter recebido parte da propina supostamente paga por empreiteiras ao PT. E que para escondê-la teria se valido de contas no exterior. O encontro serviu para que ele perguntasse a Duque se isso era verdade. Duque respondeu que não.
Em depoimento a Moro há três semanas, Duque confessou que se reuniu com Lula três vezes. E que da vez em que conversaram em Congonhas, Lula lhe disse que Dilma estava preocupada com a informação de que ele, Duque, estocava dinheiro fora do país.
Então Lula orientou Duque a encerrar imediatamente qualquer conta que tivesse lá fora para não deixar rastros e prevenir complicações futuras.
Por que Lula não se limitou a negar seu encontro com Duque em Congonhas? Porque o encontro deixou rastros. Que já foram recolhidos pela Lava Jato.
O sítio que jamais foi dele
Lula morrerá dizendo que o sítio de Atibaia, em São Paulo, onde ele e a família passaram mais de 100 fins de semana desde o fim do seu governo, não é dele e jamais foi. Está registrado em nome dos empresários Jonas Suassuna e Fernando Bittar, sócios de um dos seus filhos.
Entretanto, ao ser interrogado por Moro, ele admitiu que recebeu em seu apartamento a visita de Léo Pinheiro, um dos donos da OAS, e o arquiteto Paulo Gordilho. Motivo do encontro: tratar de um projeto de cozinha para o sítio, igual ao adotado pela OAS para reformar a cozinha do tríplex.
Se o sítio não pertence a Lula, por que a OAS o reformaria de graça como fez? E por que Léo Pinheiro o procuraria para discutir um novo projeto de cozinha para o sítio? Lula negou-se a explicar por quê. Alegou que o sítio é alvo de outro processo a ser encarado no futuro.
Por Ricardo Noblat
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