quinta-feira, 5 de janeiro de 2017

Compreensível ou incompreensível?!


Brasilino Neto
Faço estas perguntas ante as situações que envolvem decisões da ministra Cármen Lúcia, presidente do Supremo Tribunal Federal, que em uma semana concedeu duas liminares suspendendo bloqueios de valores pertencentes ao Estado do Rio de Janeiro, em favor da União.

A suspensão em si é questão de menos importância, mas prendo-me, para falar sobre elas, aos argumentos utilizados pelas partes, ministra e Estado do Rio, nas decisões que tomaram.

O Estado não negou a existência das obrigações de pagamentos em favor da União, sustentou, porém, no judiciário que tais bloqueios não poderiam ocorrer, pois “isto impossibilitaria a execução de obrigações constitucionais dos direitos dos servidores públicos, de aposentados dependentes do ente estadual, dentre outras obrigações fundamentais do estado, dentre as quais os atendimentos básicos à população”.

Argumenta ainda o Estado do Rio de Janeiro que “por circunstâncias alheias à sua vontade e absolutamente imprevisíveis não conseguiu honrar o pagamento de parcelas desses contratos”, o que levou a União a invocar a cláusula de contra garantia, que é a segurança que o Estado dá para a obtenção do empréstimo, “sem contraditório e sem facultar ao Estado do Rio de Janeiro a oportunidade de se defender...”.

Nestas condições o Estado volta novamente a ‘pensar’ em sua população, a coloca como objetivo principal da defesa de seus interesses, o que, em realidade, no dia a dia não existe, posto a tratar, como sempre tratou, como ente de ‘quinta categoria’.

O pior de tudo isto não é a concessão da medida liminar pela ministra Cármen Lúcia suspendendo o bloqueio, mas os insólitos argumentos nela utilizados.

Diz a liminar concedida que: “É necessário garantir que se observe o contexto fático descrito pela Procuradoria-Geral do Estado do Rio de Janeiro, que aponta a necessidade de se garantir “direito do Estado-Membro aferir, previamente, se nas condições estipuladas no contrato estão presentes o direito de defesa, por exemplo, para invocar justo impedimento ou para demonstrar que o valor cobrado pelo agente financeiro é indevido ou excessivo”. 

Ao assim decidir a ministra deixa de observar a cláusula “pacta sunt servanda”, que advém dos Latinos a centenas de milhares de anos, assentada no Digesto, que significa que: "Os pactos assumidos devem ser respeitados e os contratos assinados devem ser cumpridos".

Cármen Lúcia a senhora não poderia alegar ou invocar, para a concessão das medidas de suspensões dos bloqueios de R$ 181 e R$ 193 milhões, como fez, a cláusula “rebus sic stantibus”, posto que para sua aplicação impõe-se a exigência de que as ocorrências para o inadimplemento sejam imprevisíveis, o que não se dá no caso em comento, eis que o estado de calamidade a que chegou o Estado do Rio de Janeiro e em geral na administração pública brasileira, se dá por pura incompetência, corrupção, desvios e falta de previsão e inconsequência em gastar mais do que arrecada.

Indubitavelmente as concessões das liminares afetam aos interesses da nação, pois abriu a possibilidade de os Estados se valerem da medida e comprometer, mais do que já estão, as estruturas econômicas do Estado brasileiro.

Decisões tais colocam o Brasil em condições de país sem segurança jurídica e o transforma em país que pode e deve ser excluído do contexto das nações sérias, eis que a senhora bem deve se lembrar o que certa vez afirmara o então ministro da Fazenda brasileiro, Delfim Neto: “O capital estrangeiro é arisco, e o movimento desordenado, mesmo que pequeno, feito na economia o espanta”. 

Ministra, as concessões em questão é desordenado e não é pequeno. 

Outras duas decisões tomadas nas concessões das liminares chegam às raias da incompreensão, especialmente quando a senhora, num exercício de ‘vidência’ ou mera indução, incabível a um magistrado, especialmente da Corte Maior, quando assenta: “... que o Rio de Janeiro amarga gravíssima situação financeira” e que parece pretender “valer-se da teoria da imprevisão, pois não previsto o quadro calamitoso que agora domina a Administração Pública estadual”.

Ainda encontrou a senhora ministra espaço para piorar a decisão quando ordenou que o Estado do Rio não terá a condição de devedor por não realizar os pagamentos. “Se fosse declarado devedor, o Rio poderia ficar impedido de obter novos financiamentos perante o governo federal”.

Senhora ministra Cármen Lúcia eis aqui as conclusões:

= O Estado do Rio deve, não pagou e ainda tem o direito de discutir se as cláusulas então assinadas são válidas ou não? 

= Já não foram lidas e debatidas na oportunidade em que firmaram o contrato?

= Não está nos contratos então assinados que o pagamento dependeria de notificação para que o Estado do Rio se constituísse em mora, e a senhora na decisão entendeu assim.

= E, a final, decide que o Estado do Rio não precisa pagar e nem mesmo pode ser colocado no cadastro de inadimplente do governo central, ficando, inclusive com a possibilidade de obter novos empréstimos.

Cabe então a pergunta final:

Na vida do cidadão brasileiro que deve, a decisão tomada seria a mesma?

Respondo: Não, pois isto é o que ocorre no dia a dia de nossos tribunais, em todos os níveis.

A decisão também suspende os efeitos da condição de devedor que seria imputada ao estado pelo inadimplemento do contrato, inclusive os reflexos em restrições legais que impedem o acesso e a obtenção a novos financiamentos. A liminar da presidente do STF, deferida em atuação durante o plantão do recesso do tribunal, tem validade até reapreciação pelo relator da ação, ministro Ricardo Lewandowski, ou a sua submissão ao colegiado para referendo.

Enviado por Brasilino Neto

Um comentário:

Luiz Carlos Oliveira disse...

Doutor Brasilino posso assinar esta matéria também? Mas se der rolo o senhor me defende?