O ministro Joaquim Barbosa pendurou a toga há oito meses e 11 dias. E Dilma Rousseff ainda não indicou um substituto. É o prazo mais longo de todos os tempos. Nenhum outro presidente havia demorado tanto para exercer o seu poder de escolha. “Essa demora é uma extravagância ímpar”, criticou o ministro Marco Aurélio Mello, vice-decano do STF. “Para mim, como cidadão e integrante do Supremo, é algo injustificável. Vejo isso como um menoscabo [desprezo] institucional do Executivo em relação ao Supremo.”
Entre as pessoas que Dilma consulta antes de tomar sua decisão está o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL). Ele responde a inquérito no STF por suspeita de envolvimento no escândalo da Petrobras. “Um presidente da República tem uma enorme liberdade de escolha. Não tem cabimento consultar e ficar querendo atender ao presidente do Senado”, disse Marco Aurélio, sem entrar no mérito dos indícios que pesam contra Renan. O ministro considera incabíveis também consultas ao presidente do Supremo.
Entre os nomes cogitados por Dilma, há pelo menos três ministros do Superior Tribunal de Justiça: Benedito Gonçalves, Luis Felipe Salomão e Mauro Campbell. Em conversa com oblog, Marco Aurélio informou que a demora de Dilma fez surgir “uma disputa interna” entre os cotados do STJ. Algo que já virou “uma verdadeira autofagia''. No dizer do ministro, “pipocam notícias ruins contra um, contra outro. São pessoas ligadas querendo minar a caminhada uns dos outros.”
Afora os ministros do STJ, o cardápio de opções de Dilma inclui o advogado paranaense Luiz Edson Fachin. De acordo com auxiliares da presidente, seria o nome da sua predileção. “É muito preparado, da área acadêmica”, avaliou Marco Aurélio. Mas Renan parece preferir o atual presidente da OAB, Marcus Vinícius Furtado Coêlho. Seja quem for, será necessário aprovar o nome no Senado —primeiro na Comissão Constituição e Justiça. Depois, no plenário. Daí a preocupação em sondar os humores do investigado Renan.
O pedaço do PMDB que faz cara feia para Dilma ameaça apresentar uma proposta de emenda à Constituição fixando prazo de 90 dias para que os presidentes da República preencham as vagas abertas no Judiciário, no Ministério Público e nas agências reguladoras. Sob pena de responder por crime de resposabilidade e transferir para o Senado a prerrogativa da escolha.
Marco Aurélio discorda dessa proposta. “Seria a certidão de desprezo do Executivo para com o Judiciário”, ele disse. “O que tem que haver é uma compenetração do Executivo para indicar os nomes num período razoável. Devemos manter o sistema como está. Mas que cada qual atue observando o figurino. E o figurino direciona a decisão para uma indicação em período razoável. Considero bastante razoável o prazo de 30 dias.”
Para Marco Aurélio, “o que está acontecendo hoje é impensável.” Segundo ele, a demora de Dilma “acaba sobrecarregando os ministros.” Quando o Supremo está com sua composição completa, os processos que ingressam no tribunal são divididos entre dez ministros (o presidente não entra no rateio). “Com um número menor de integrantes, vai uma quantidade maior de processos par cada qual. Estamos recebendo os processos que o colega não-nomeado poderia estar recebendo”, lamentou o ministro.
De resto, o STF foi concebido para funcionar com um número ímpar de magistrados, de modo a evitar o empate. Em julgamento recente sobre a constitucionalidade de uma lei de Minas Gerais registrou-se o empate: quatro votos a favor, quatro contra. Dois ministros estavam ausentes. Marco Aurélio criticou Dilma diante das cameras da TV Justiça: “Vejam como é nefasto atrasar-se a indicação de quem deve ocupar a cadeira”. O decano Celso de Mello ecoou-o: “Essa omissão irrazoável e abusiva da presidente da República já está interferindo no resultado dos julgamentos.”
Dilma acenara com a hipótese de fazer a indicação do novo ministro do STF na semana passada. E nada. Dias atrás, o ministro José Eduardo Cardozo (Justiça) deu de ombros para as críticas. “Há uma demora, mas uma demora que eu diria boa, porque é uma demora para uma boa escolha.'' Marco Aurélio pensa de outro modo. “Se para escolher um integrante do Supremo demora tanto, o que o cidadão imagina quanto aos outros atos que compõem a administração pública?”.
Blog do Josias
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