Das 46 páginas do despacho em que manda prender o ex-presidente Michel Temer e outros, Bretas gasta ao menos 34 tentando explicar a prisão. Sem conseguir. Afrontou gostosamente o direito, a língua e a lógica.
Afrontou o direito quando, ao justificar as razões da prisão preventiva, limitou-se a repetir as acusações que o Ministério Público e a Polícia Federal fazem contra o presidente. Ora, estas, devidamente acompanhadas de provas, haverão de ser avaliadas pelo juiz quando e se o ex-presidente se tornar réu. Nesse processo, Temer nem foi denunciado ainda. Agrediu a língua quando ignorou o que dispõe claramente o Artigo 312 do Código de Processo Penal. E depredou a lógica quando deu a sua intepretação do texto legal.
Escreve o juiz, não sei com que eventual dose de cinismo: "À luz da garantia constitucional da não presunção de culpabilidade, nenhuma medida cautelar deve ser decretada sem que estejam presentes os pressupostos do fumus comissi delicti e do periculum libertatis. Entende-se por fumus comissi delicti a comprovação da existência de crime e de indícios suficientes de sua autoria, e por periculum libertatis, o efetivo risco que o agente em liberdade pode criar à garantia da ordem pública, da ordem econômica, da conveniência da instrução criminal e à aplicação da lei penal".
O juiz tenta igualar esses dois requisitos, como se fossem elementos coordenados. Não são! Existe uma relação de subordinação. O "fumus comissi delicti" é, reitero, uma precondição para qualquer etapa da persecução penal. Ou nem se teria um caso. Mas a prisão preventiva requer um crime ou ameaça que tenha contemporaneidade e que demonstre, portanto, o "periculum libertatis", o que absolutamente não está demonstrado.
Não tendo como justificar a prisão, Brettas apela, então, à condição social do preso, o que tem se tornado prática corriqueira na Lava Jato. Escreveu: "Avaliando os elementos de prova trazidos aos autos, em cognição sumária, considero que a gravidade da prática criminosa de pessoas com alto padrão social, mormente políticos nos mais altos cargos da República, que tentam burlar os trâmites legais, não poderá jamais ser tratada com o mesmo rigor dirigido à prática criminosa comum." Aí está admitido, então, o que ele mesmo considera um rigor incomum. Mas notem: Bretas continua apegado apenas à suposta existência do crime com indício de autoria. Nem Ministério Público nem juiz foram capazes de apontar que risco Temer representaria à sociedade e à investigação se estivesse livre.
Reitero: não estou aqui asseverando a inocência de Temer. Insisto nesse ponto não para me preservar de eventuais cobranças futuras. Reitero a questão porque é preciso que se faça a distinção entre prisão preventiva e prisão depois da condenação. O despacho de Bretas para autorizar a prisão é uma sentença condenatória. E, ora vejam, nesse caso, o ex-presidente nem é réu ainda.
Trata-se de uma prisão ilegal, submetida a injunções de natureza política.
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