Raramente um despacho judicial expôs com tamanha riqueza de detalhes uma decisão arbitrária e ilegal como o despacho assinado pelo juiz Marcelo Bretas, da 7ª Vara Federal do Rio, que determinou a prisão preventiva do ex-presidente Michel Temer. O que se tem ali é uma soma de aberrações. E, desde logo, de cara, nas primeiras linhas, deve-se dizer: eu não estou assegurando a inocência de Temer dos crimes que lhe imputam. Disso, em princípio, se encarrega a sua defesa, que deve ter mais detalhes do processo do que eu — se bem que isso, hoje em dia, também não é certo. Na era do "Direito Penal de Curitiba" e seus braços, a defesa é sempre a última a saber. O que me e nos concerne é outra coisa: saber se a prisão preventiva foi decretada ou não com base nos fundamentos legais. E não foi. Não fossem as agruras de quem se transforma em vítima do arbítrio e de seus familiares, seria o caso de chamar o acontecimento de piada. Mas não é. Não tem graça. Assim, estamos indo ladeira abaixo. De saída, leitor, uma lembrança fundamental: PRISÃO PREVENTIVA É DIFERENTE DE PRISÃO DEPOIS DA CONDENAÇÃO.
Para entender o que digo, é preciso ler o despacho de Bretas. São 46 páginas. Está aqui. Também é preciso saber o que diz o Artigo 312 do Código de Processo Penal, que reproduzo abaixo, e entender o que está escrito ali. É a leitura porca do texto legal que tem permitido esses espetáculos grotescos de arbítrio. Vamos ao que diz a legislação:
"Art. 312. A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria".
Se você ler errado o que vai acima, chegará à conclusão de que existem cinco razões para a prisão preventiva:
1: para garantir a ordem pública;
2: para garantir a ordem econômica;
3: por conveniência da instrução criminal;
4: para assegurar a aplicação da lei penal;
5: quando há prova da existência do crime ou indício suficiente de autoria.
Ocorre, meus caros, que esse quinto motivo para prender não existe porque motivo não é. Só há os quatro primeiros. Para que se possa prender alguém preventivamente é preciso que haja uma circunstância, uma pré-condição necessária: ter havido o crime, com indício suficiente de autoria. Pergunte-se: essa circunstância, por si, permite ao juiz mandar prender alguém preventivamente. A RESPOSTA É ESCANCARADAMENTE "NÃO". ISSO É O QUE SE AVALIA NA HORA DO JULGAMENTO.
Para decretar uma prisão preventiva, é preciso que, dada essa circunstância, então, do crime comprovado e do indício de autoria, esse possível autor esteja incidindo NO PRESENTE, NO TEMPO EM QUE SE DECRETA A PRISÃO, em ao menos uma das quatro transgressões: praticando crime contra a ordem pública ou contra a ordem econômica, tentando dar sumiço em provas ou assediando testemunhas ou, ainda, dando indícios de que pretende fugir.
E nada disso existe no despacho de Bretas. E nada disso foi demonstrando na absurda entrevista coletiva de membros do Ministério Público e da Polícia Federal. Muito pelo contrário.
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