O candidato do PSL à Presidência da República, Jair Bolsonaro, não sabe direito o que fala, o que implica que não tenha noção da, digamos, extensão das bobagens que diz. Em algum momento, murmuraram a seu redor — os seus, por assim dizer, intelectuais candidatos a Goebbels dos Trópicos — que Donald Trump, o seu modelo com alguns trilhões de PIB a mais, resolveu retirar os EUA do Conselho de Direitos Humanos da ONU. E aí ele pensou: “Por que não eu? Também vou querer sair desse negócio aí…” Faltava só a oportunidade.
E apareceu. O Comitê de Direitos Humanos da ONU, formado por 18 observadores independentes, mas referendados pela Assembleia Geral, resolveu, em caráter liminar, provisório, recomendar que o Brasil permita que Lula dispute a eleição deste ano. Que peso isso tem no Poder Judiciário brasileiro? Nenhum! O Comitê apenas indicou, em caráter, reitero, liminar, que o país deveria seguir a sua Constituição. Se ninguém pode ser considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória, como está no Inciso LVII do Artigo 5º, como é que tal pessoa, seja Lula ou o Zé Ninguém, pode sofrer os efeitos de uma condenação que pode ser revista? Ainda que haja muitos esquerdistas por lá, o fato é que há também o que faz e o que não faz sentido.
De toda sorte, reitero, a decisão do Comitê não tem efeito nenhum sobre o Poder Judiciário no Brasil — este no qual se abriga uma figura que manda manter Lula preso num dia e, no outro, vai fazer palestra num clube presidido por Hamilton Mourão, vice de Jair Bolsonaro. Foi o que fez nesta segunda o desembargador Thompson Flores, presidente do TRF-4. E ainda chamou Mourão de “amigo”. Enquanto isso, Cármen Lúcia, presidente do STF e do Conselho Nacional de Justiça, cantava a plenos pulmões “Não deixe o samba morrer/ não deixe o samba acabar”, comemorando o empoderamento feminino, coisa que Bolsonaro, o titular da chapa de que Mourão é vice, o amigão de Flores, acha uma besteira.
A única coisa que não morre no país é o “samba-da-ministra-doida”, fazendo aqui uma alusão à história ensandecida do “Samba-do-crioulo-doido”, de Stanislaw Ponte Preta. Nessa perspectiva, o dito “empoderamento” virou apenas um fetiche, uma espécie de versão oficial, do tapetão, da luta das mulheres por igualdade. O Brasil está muito amalucado! O assassinato da política, promovido pela Lava Jato, com o apoio dos fascistoides, transformou em protagonistas personagens que não conseguiam ser notórias nem por sua nulidade. O fascismo, e há muita literatura a respeito, é o regime dos ressentidos; é o “empoderamento” da mediocridade rejeitada pelo Estado e pelo mercado. Batata!
“Mas o que temos aí é fascismo, Reinaldo? Isso não é forçar a mão?” Você está falando com um idiota se tem de explicar uma metáfora óbvia. O que temos aí é o “empoderamento” da mediocridade rejeitada pelo Estado e pelo mercado. E isso só aconteceu no fascismo. Não tenho como desenhar o raciocínio. Volto a Bolsonaro, do qual jamais me afastei.
Ele se explicou nesta segunda. Disse que, ao afirmar, no sábado, na Academia Militar das Agulhas Negras, que romperia com a ONU, uma “instituição” — ele empregou essa palavra — cheia de “comunistas”, cometeu um “ato falho” (ele usou tal expressão…). Queria, na verdade, referir-se ao Conselho de Direitos Humanos — que, notem, nem é subordinado nem subordina o Comitê, com o qual ele está injuriado por causa da recomendação sobre Lula.
Ele sabe sobre a ONU o que sabe sobre dívida interna ou a psicologia dos molestadores. Bolsonaro é só a expressão “pop” do sonho de certa extrema-direita supostamente letrada, que julga não ter tido o devido reconhecimento porque o mundo está tomado por comunistas perversos, que, por óbvio, acabarão todos na fogueira. Não dará certo, mas não comemore. O povo começa a pender para outro autoritarismo, oposto, mas combinado.
Por Reinaldo Azevedo
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