A prisão dos mensaleiros pôs o sistema carcerário brasileiro em estado de plena nudez. Mas não apenas: também Judiciário e Legislativo têm, novamente, suas mazelas expostas. A figura do deputado-presidiário é um escândalo ainda maior que o Mensalão.
É inconcebível que quem viola a lei – e é condenado em última instância por isso – continue a ostentar o título de legislador. É uma contradição em termos. No entanto, enquanto a Câmara dos Deputados não se manifestar, os presidiários José Genoíno, Pedro Henry e Valdemar Costa Neto continuam parlamentares.
Nessa condição, continuam a ostentar prerrogativas incompatíveis com o novo local de residência. Isso só acontece porque o Supremo Tribunal Federal, pressionado pela Câmara dos Deputados, concordou em dar-lhe a palavra final.
A Câmara impôs no grito o seu ponto de vista, que, além de inconstitucional, é surrealista. Com isso, conquistou uma prerrogativa a mais: a de ser a Corte revisora da Suprema Corte. E o impensável precedeu a situação dos mensaleiros. O deputado Natan Donadon, condenado pelo STF por roubo de dinheiro público, foi absolvido pela Câmara. Levou para o xadrez o seu mandato.
O escândalo foi de tal ordem que o próprio Congresso decidiu dar fim ao voto secreto para questões de cassação de mandato e vai reavaliar a situação de Donadon em votação aberta.
Não fosse isso, José Genoíno, Valdemar Costa Neto e Pedro Henry (falta ainda definir a sentença de João Paulo Cunha) teriam seus mandatos preservados pelo espírito de corpo (ou de porco).
Se funcionou para o obscuro Donadon, que ninguém conhecia, por que não funcionaria para colegas com muito mais prestígio? Mas Donadon chegou a tempo de evitar o pior.
Causou tal desconforto na opinião pública (que de vez em quando se manifesta) que não parece possível tê-lo como padrão. Genoíno, que o PT quer transformar em herói nacional, foi condenado, em síntese, pelas mesmas razões de Donadon.
É tão herói quanto ele. Seu estado de saúde não altera os fatos. Pode ensejar cuidados diferenciados, mas não a essência moral do que o levou ao presídio. Ambos lá estão por lesar o Estado, que, como legisladores, deveriam preservar.
Idem os demais. A movimentação para atenuar ou mesmo impedir o cumprimento da pena, com manifestos, declarações e oferta de empregos improvisados desafia a conduta da Justiça.
Joaquim Barbosa, responsável pela execução das penas, tem sido destratado de maneira inconcebível, inclusive pelos sentenciados. É apontado como tirano, como se a condenação tivesse sido manifestação solitária dele e não do plenário do STF. Não foi ele quem causou a cardiopatia de Genoíno, nem quem o induziu a assinar empréstimos fraudulentos para o PT.
Coube-lhe, como relator da ação penal, articular os dados constantes dos autos, manifestar seu voto e submetê-lo ao plenário, que, por maioria, o acompanhou.
O interessante é que a revolta contra a execução penal se concentra no núcleo político dos mensaleiros. Não há nenhuma palavra quanto aos demais sentenciados – ao todo, 25.
Ninguém está interessado em saber em que condições estão, por exemplo, Kátia Rabello ou Marcos Valério, condenados em regime fechado por algumas décadas. A eles, o governador Agnelo Queiroz ou o senador Eduardo Suplicy não fazem visitas.
E o que os diferencia dos políticos-presidiários? O Mensalão só aconteceu porque formou-se um núcleo político para articulá-lo. Os demais agentes – Valério, Kátia etc. - foram por ele motivados e mobilizados. A rigor, pois, as penas mais duras deveriam caber a quem tinha poder para viabilizar a trama.
Mas não foi assim. Dessa forma, Valério, que não teria feito o que fez sem o aval de José Dirceu e aliados petistas, purga pena bem mais drástica que os que, na cadeia de comando, davam-lhe ordens e pautavam suas ações. Mas quem disse que o senso comum faz parte da política brasileira?
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