sexta-feira, 8 de fevereiro de 2019

A cada 3 dias, uma criança é internada após acidente doméstico com arma



Essa imprensa não tem jeito. Leiam abaixo o que informa reportagem da Folha. Pois é… Das mortes e acidentes causados por liquidificadores, piscinas, engasgos, choque elétrico… Ah, disso ninguém fala, não é mesmo? Vivemos a era, costumo dizer, em que os fatos e os números pouco podem contra os argumentos — quando mais torto, mais eficiente.

A cada três dias, em média, uma criança de até 14 anos entra em um hospital do Brasil em decorrência de um acidente doméstico com arma de fogo.

Entre 2015 e 2018, foram 518 internações na faixa etária de até 14 anos por essa causa, mostram dados compilados pelo Ministério da Saúde.

A posse de armas em casa foi facilitada no mês passado por decreto assinado pelo presidente Jair Bolsonaro (PSL).

O documento adota como critério para a autorização uma taxa de homicídios que atinge todos os estados, permitindo, na prática, que moradores do país todo possam pedir a posse sem comprovar a efetiva necessidade.

Pela norma, para ter uma arma na residência é preciso ter mais de 25 anos, ocupação lícita e residência certa e não ter sido condenado ou responder a inquérito ou processo criminal, além de comprovar a capacidade técnica e psicológica.

Pessoas que moram com crianças devem ainda assinar declaração de que possuem cofre ou lugar seguro com tranca para guardar a arma. Para especialistas, porém, isso não elimina o risco de acidentes.

Juan Riquelme Machado Dias, 9, foi uma das crianças que morreram por disparo acidental de arma dentro de casa —entre 1996 e 2016 (dados mais recentes), foram 292 óbitos por essa causa.

O caso ocorreu no ano passado. Juan estava sentado na cama do quarto, em Cidade Tiradentes (zona leste de SP), quando a madrasta arrumava o armário. Uma arma do pai que estava dentro do móvel caiu e disparou. “O tiro bateu na parede e voltou no olho dele”, diz a avó do menino, que não quis ser identificada.

O pai do garoto, que tinha histórico criminal por roubo, contou à polícia que comprou a arma com numeração raspada para se defender. Acabou preso por posse ilegal e foi levado com ferimentos após bater o rosto no chão várias vezes. A avó conta que resolveu se livrar dos pertences do neto para tentar esquecer a tragédia, mas um primo do menino não deixa. “Toda pessoa que chega ele diz: ‘É o Juan'”.

Casos como esse ficaram mais raros após o Estatuto do Desarmamento, de 2003. O número de crianças mortas por tiro acidental em casa, que era de cerca de 20 por ano, caiu para a metade após aquele ano.

Entre as vítimas, porém, ainda há crianças baleadas tanto por armas legais como por ilegais. Em outubro de 2018, em Manaus (AM), um menino da mesma idade de Juan morreu com um disparo acidental com a arma do pai, um policial militar. Nove meses antes, em Ibiúna (SP), um garoto um ano mais novo morreu na mesma situação.

Para a gerente executiva da ONG Criança Segura, Gabriela Freitas, o decreto vai aumentar o número de ocorrências do tipo, que poderiam ser evitáveis. Ela cita o caso dos EUA. Estudos no país mostram que a presença de uma arma em casa está relacionada a um maior risco de morte acidental e de suicídio.

Já o jurista Adilson Dallari, que foi professor da PUC-SP, afirma que a decisão de assumir o risco deve ser dos pais e não do Estado. Favorável à liberação do “porte com restrições”, ele diz que o cofre “é ultrapassado” e defende o uso de uma trava, com senha, que pode ser colocada no gatilho. “As mortes no trânsito são muito maiores e nem por isso vamos proibir carro”, diz.
(…)

Na Folha 

(Por Reinaldo Azevedo)

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