O Ministério Público Federal denunciou os executivos e delatores da JBS Joesley Batista e Francisco de Assis sob acusação de corrupção ativa, lavagem de dinheiro, violação de sigilo funcional e embaraço de investigação.
A denúncia, apresentada no dia 27 de abril e mantida sob sigilo, rompe a blindagem concedida pela Procuradoria-Geral da República (PGR) aos executivos no acordo de delação premiada assinado há um ano, que os protegia de serem denunciados por crimes cometidos.
A denúncia acusa o procurador Ângelo Goulart Vilella de receber ajuda de custo da JBS para vazar informações internas da Procuradoria do Distrito Federal para os investigados.
O presidente da OAB-DF (Ordem dos Advogados do Brasil), Juliano Costa Couto, o advogado Willer Tomaz e o publicitário André Gustavo Vieira também foram denunciados.
No documento, os procuradores afirmam que o grupo ocultou e dissimulou propina recebida entre 21 de fevereiro e 2 de março de 2017 como contrapartida de benefícios oferecidos a JBS, então alvo na Operação Greenfield. Comandada pelo MPF, a operação investiga o uso irregular de dinheiro de fundos de pensão.
A denúncia é toda baseada na delação premiada dos executivos do frigorífico e na ação controlada feita por Francisco de Assis, autorizada pelo Supremo.
Na delação, Assis disse que a empresa pagava mesada de R$ 50 mil a Villela, que na ocasião integrava a força-tarefa da Greenfield.
A denúncia foi apresentada ao TRF-1 (Tribunal Regional Federal da 1ª Região) no dia 27 de abril porque Villela tem foro especial devido ao cargo de procurador.
O caso está em segredo de Justiça, com a desembargadora Monica Sifuentes.
A peça é assinada por Gustavo Velloso, Marcelo Serrazul e Bruno de Acioli, da PRR-1 (Procuradoria Regional da República na 1ª Região).
O MPF pede aos denunciados o pagamento de R$ 24 milhões a título de reparação de danos morais, além da perda do cargo de Ângelo Villela.
O presidente da OAB-DF e o publicitário são acusados pelos crimes de corrupção ativa e lavagem de dinheiro.
Em abril de 2017, Joesley e Assis fecharam acordo com a PGR. Na ocasião, o então procurador-geral Rodrigo Janot assim justificou a extensão dos benefícios concedidos, que impediam, por exemplo, que os empresários fossem incriminados formalmente pelo Ministério Público.
“Em razão do ineditismo de muitos dos temas trazidos pelos colaboradores (...) a premiação pactuada entre as partes signatárias dos acordos foi o não oferecimento de denúncia em face dos colaboradores”, escreveu Janot no documento em que pediu a homologação da delação dos executivos da JBS.
Após a suspeita de que os executivos omitiram informações relevantes, no último mês de setembro, Janot pediu a rescisão dos acordos, solicitação que foi também reiterada por sua sucessora, Raquel Dodge”
A rescisão não foi, no entanto, homologada pelo relator do caso no STF (Supremo Tribunal Federal), o ministro Edson Fachin, o que faz com que o acordo ainda esteja em vigência.
OUTRO LADO
Em nota, a defesa de Joesley disse que recebe a notícia com estranheza. "Verifica-se grave desrespeito à lei e às cláusulas do acordo de colaboração, firmado entre a PGR e Joesley Batista, que preveem a não denúncia", afirma a defesa. "Há menção expressa pela Procuradora-Geral da República de que, enquanto o STF não se manifestar sobre a rescisão do acordo, a denúncia não pode ser recebida contra o colaborador. Só há uma explicação: ou desconhecem que o acordo não está rescindido ou desconhecem a manifestação da PGR".
O advogado do procurador Angelo Villela, Gustavo Badaró, afirmou que seu cliente não cometeu nenhum ato ilícito, que não há nenhum fato novo desde a deflagração da Operação Patmos, em maio do ano passado, e que a denúncia é baseada em elementos frágeis.
O publicitário André Gustavo Vieira não foi localizado.
Em nota, Willer Tomaz afirmou que a leitura da denúncia lembra a “denominada era da pós-verdade, com a proliferação de fake news onde o espectador escolhe a “verdade” que melhor convém a suas convicções pessoais, selecionando os fatos ao sabor de preconcepções”.
O advogado denunciado questionou também que em alguns momentos as palavras dos delatores se justificam e em outros não são dignas de confiança.
“Trata-se de um verdadeiro bufê, com perdão pelo estilo, no qual o MPF escolhe ao bel prazer o que lhe interessa, tomando alguns trechos dos depoimentos como verdade absoluta, dogma solar que tudo toca, e outros como a mais absurda das mentiras”.
Tomaz ainda disse que “as delações foram revogadas em razão da falta de credibilidade. A denúncia foi toda estruturada tendo como base exclusivamente às delações revogadas. Lamentável. Mas confio no judiciário brasileiro”.
Em nota, o presidente da OAB-DF disse estar surpreso com a informação sobre a denúncia. “Manifesto a minha mais que justificada indignação em razão de nunca ter sido intimado a prestar esclarecimentos, nem durante o tempo em que o assunto esteve em evidência, bem como ao longo dos procedimentos processuais nas instâncias às quais o caso foi remetido.”
Ele disse que não houve “nenhum tipo de contraditório, fundamento elementar do inarredável direito de defesa”.
“Como já esclarecido em maio de 2017, reafirmo que não sou nem nunca fui advogado do grupo JBS e/ou do J&F, nem de quaisquer de seus dirigentes. Nunca fui contratado para atuar em nenhuma das operações e/ou ações que envolvam os interesses do grupo. Sondado a oferecer serviços em campo do direito distinto à minha atuação, limitei-me a indicar advogado de área criminal, prática comum no exercício da profissão”, diz o texto.
Juliano Costa Couto afirma que não cometeu nenhuma ilegalidade, que confia no sistema Judiciário e que tem interesse no esclarecimento dos fatos.
“Ressalto aos colegas de profissão e à sociedade brasiliense que tenho honrado meu histórico profissional de mais de 20 anos de uma advocacia reconhecidamente técnica e ética, incluindo o mandato que me foi outorgado pela minha categoria no Distrito Federal. Em meu escritório e na OAB, venho desempenhando minhas atividades com dedicação, esmero e seriedade. Tenho a consciência tranquila e me defenderei.”
Os outros denunciados também foram procurados, mas não responderam até a publicação da reportagem.
ESQUEMA
De acordo com os procuradores, os executivos da JBS pagaram 1/3 do “valor inicial” de R$ 3,754 milhões ao escritório Willer Tomaz Advogados Associados sob o pretexto de prestação de serviços. O presidente da OAB-DF e o publicitário receberam uma comissão, segundo os investigadores.
Villela e Willer Tomaz foram presos na operação Patmos, em 18 de maio de 2017, deflagrada após a divulgação da delação dos executivos do frigorífico.
De acordo com os delatores, Tomaz, que trabalhou para a J&F (controladora da JBS), dizia que Villela ajudaria passando informações privilegiadas a Joesley.
Sobre o pagamento de R$ 50 mil por mês, Joesley em outro depoimento não saber se o dinheiro chegava ao procurador. A investigação não conseguiu achar documentos comprobatórios de repasses.
Na Folha
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