Se me pedissem para escolher a melhor frase de todos os tempos, a eleita seria a de La Rochefoucauld, aristocrata e pensador do Século 17: “A hipocrisia é o tributo que o vício presta à virtude”.
Vocês acompanharam o debate sobre a restrição de foro especial para deputados e senadores. É bem provável que eu esteja a falar, neste momento, com uma maioria de leitores deste blog que discordou do blogueiro. De tal maneira ficou parecendo que se tratava de escolher entre a justiça e a injustiça, entre a punibilidade e a impunidade que as pessoas nem quiseram ler ou ouvir os argumentos.
Qual posição triunfou? Permanecem com foro no Supremo os deputados e senadores que tenham cometido crimes durante o mandato e em razão deste. Todo o resto vai para a primeira instância. Parece coisa boa? Parece. Na prática, os senhores parlamentares serão processados e julgados por juízes estaduais (na maioria dos casos) ou federais de seus respectivos estados, onde são influentes, ganhando o direito a mais instâncias e a mais recursos. A ideia de que a primeira instância pune mais do que o Supremo é falsa como nota de R$ 3. Proporcionalmente, pune menos. Mais ainda: haverá, a depender do caso, dificuldades incontornáveis. Imaginem um juiz da primeira instância estadual ou um Tribunal de Justiça determinando a prisão (preventiva no primeiro caso) de um deputado ou senador por crime anterior ao mandato ou sem conexão com este. Ocorre que o Artigo 53 da Constituição garante que o parlamentar federal só pode ser preso por flagrante de crime inafiançável. E aí? Como é que fica? Delega-se, então, um caso a juízes que não podem sê-lo plenamente?
Sim, é preciso disciplinar o foro especial, que atinge quase 60 mil pessoas. Mas essa não era e não é tarefa para ministro do Supremo. A decisão foi tomada. Magistratus dixit, causa finita est. Reinaldo Azevedão perdeu mais uma, certo? Viva o grito das ruas, certo ou errado.
Pois é…
O ministro Luis Felipe Salomão, do Superior Tribunal de Justiça, fez a coisa certa. Ele próprio declinou de processos, envolvendo governadores, que estavam em suas mãos. E o fez para compatibilizar a prática desse tribunal superior com a decisão tomada pelo STF. Se deputado e senador acusado de crimes que teriam sido cometidos antes do mandato ou sem conexão com este devem ir para a primeira instância, por que não fazer o mesmo com os governadores? E propõe que o Órgão Especial do STJ, que fala pelo tribunal, passe a adotar tal posição.
Eis que surge, então, a hipocrisia. A Procuradoria-Geral da República, que se mostrou uma fanática da mudança do foro para deputados e senadores decidiu, desta feita, fazer diferente. Deu um parecer contrário à proposta de Salomão. Quem falou pelo órgão foi Luciano Mariz Maia, vice-procurador. E o argumento ou é igualmente hipócrita ou é cediço:
– o hipócrita: a Constituição prevê o foro especial para governadores; bem, mas ela também prevê para deputados e senadores, ora… Por que mudar no caso destes e não daqueles?;
– o cediço: a questão de ordem proposta por Barroso se limitava a parlamentares federais. Sim, é verdade. O ministro Salomão está propondo uma unificação de procedimentos.
A verdade, com a devida vênia, é que o vice-procurador está se lixando para os governadores. O ponto é outro.
Acontece que a “Alínea a” do Inciso I do Artigo 105 da Constituição diz que compete ao STJ processar e julgar originariamente “nos crimes comuns, os Governadores dos Estados e do Distrito Federal, e, nestes e nos de responsabilidade, os desembargadores dos Tribunais de Justiça dos Estados e do Distrito Federal, os membros dos Tribunais de Contas dos Estados e do Distrito Federal, os dos Tribunais Regionais Federais, dos Tribunais Regionais Eleitorais e do Trabalho, os membros dos Conselhos ou Tribunais de Contas dos Municípios e os do Ministério Público da União que oficiem perante tribunais”.
Entenderam o ponto? Quando cair o foro especial dos governadores no STJ, cairá também o dos desembargadores dos Tribunais de Justiça, dos membros dos Tribunais Regionais Federais e dos integrantes do Ministério Público da União, incluindo os procuradores da República, como o próprio Maia. Toda essa gente seria julgada por juiz de primeira instância.
Nos bastidores, Roberto Barroso e Luiz Fux, dois entusiastas da mudança do foro para deputados e senadores, passaram a falar contra a mudança. E o muxoxo é o seguinte: “Imaginem um juiz de primeira instância processando e julgando um desembargador…” Ora, doutores, se o projeto já aprovado no Senado passar também na Câmara, teremos magistrado de primeiro grau convocando para depor ministro do Supremo.
Vocês não queriam brincar de Deus? Não quiseram legislar?
O colunismo que se conforma em ser porta-voz e assessor de imprensa do Ministério Público Federal agora se mostra contrário à mudança do STJ.
Eu, agora, sou a favor. E não se trata de uma questão de mérito, mas de unificação de procedimentos. Trata-se apenas de uma questão de coerência e vergonha na cara, não é mesmo, senhores e senhoras da PGR?
Vocês acompanharam o debate sobre a restrição de foro especial para deputados e senadores. É bem provável que eu esteja a falar, neste momento, com uma maioria de leitores deste blog que discordou do blogueiro. De tal maneira ficou parecendo que se tratava de escolher entre a justiça e a injustiça, entre a punibilidade e a impunidade que as pessoas nem quiseram ler ou ouvir os argumentos.
Qual posição triunfou? Permanecem com foro no Supremo os deputados e senadores que tenham cometido crimes durante o mandato e em razão deste. Todo o resto vai para a primeira instância. Parece coisa boa? Parece. Na prática, os senhores parlamentares serão processados e julgados por juízes estaduais (na maioria dos casos) ou federais de seus respectivos estados, onde são influentes, ganhando o direito a mais instâncias e a mais recursos. A ideia de que a primeira instância pune mais do que o Supremo é falsa como nota de R$ 3. Proporcionalmente, pune menos. Mais ainda: haverá, a depender do caso, dificuldades incontornáveis. Imaginem um juiz da primeira instância estadual ou um Tribunal de Justiça determinando a prisão (preventiva no primeiro caso) de um deputado ou senador por crime anterior ao mandato ou sem conexão com este. Ocorre que o Artigo 53 da Constituição garante que o parlamentar federal só pode ser preso por flagrante de crime inafiançável. E aí? Como é que fica? Delega-se, então, um caso a juízes que não podem sê-lo plenamente?
Sim, é preciso disciplinar o foro especial, que atinge quase 60 mil pessoas. Mas essa não era e não é tarefa para ministro do Supremo. A decisão foi tomada. Magistratus dixit, causa finita est. Reinaldo Azevedão perdeu mais uma, certo? Viva o grito das ruas, certo ou errado.
Pois é…
O ministro Luis Felipe Salomão, do Superior Tribunal de Justiça, fez a coisa certa. Ele próprio declinou de processos, envolvendo governadores, que estavam em suas mãos. E o fez para compatibilizar a prática desse tribunal superior com a decisão tomada pelo STF. Se deputado e senador acusado de crimes que teriam sido cometidos antes do mandato ou sem conexão com este devem ir para a primeira instância, por que não fazer o mesmo com os governadores? E propõe que o Órgão Especial do STJ, que fala pelo tribunal, passe a adotar tal posição.
Eis que surge, então, a hipocrisia. A Procuradoria-Geral da República, que se mostrou uma fanática da mudança do foro para deputados e senadores decidiu, desta feita, fazer diferente. Deu um parecer contrário à proposta de Salomão. Quem falou pelo órgão foi Luciano Mariz Maia, vice-procurador. E o argumento ou é igualmente hipócrita ou é cediço:
– o hipócrita: a Constituição prevê o foro especial para governadores; bem, mas ela também prevê para deputados e senadores, ora… Por que mudar no caso destes e não daqueles?;
– o cediço: a questão de ordem proposta por Barroso se limitava a parlamentares federais. Sim, é verdade. O ministro Salomão está propondo uma unificação de procedimentos.
A verdade, com a devida vênia, é que o vice-procurador está se lixando para os governadores. O ponto é outro.
Acontece que a “Alínea a” do Inciso I do Artigo 105 da Constituição diz que compete ao STJ processar e julgar originariamente “nos crimes comuns, os Governadores dos Estados e do Distrito Federal, e, nestes e nos de responsabilidade, os desembargadores dos Tribunais de Justiça dos Estados e do Distrito Federal, os membros dos Tribunais de Contas dos Estados e do Distrito Federal, os dos Tribunais Regionais Federais, dos Tribunais Regionais Eleitorais e do Trabalho, os membros dos Conselhos ou Tribunais de Contas dos Municípios e os do Ministério Público da União que oficiem perante tribunais”.
Entenderam o ponto? Quando cair o foro especial dos governadores no STJ, cairá também o dos desembargadores dos Tribunais de Justiça, dos membros dos Tribunais Regionais Federais e dos integrantes do Ministério Público da União, incluindo os procuradores da República, como o próprio Maia. Toda essa gente seria julgada por juiz de primeira instância.
Nos bastidores, Roberto Barroso e Luiz Fux, dois entusiastas da mudança do foro para deputados e senadores, passaram a falar contra a mudança. E o muxoxo é o seguinte: “Imaginem um juiz de primeira instância processando e julgando um desembargador…” Ora, doutores, se o projeto já aprovado no Senado passar também na Câmara, teremos magistrado de primeiro grau convocando para depor ministro do Supremo.
Vocês não queriam brincar de Deus? Não quiseram legislar?
O colunismo que se conforma em ser porta-voz e assessor de imprensa do Ministério Público Federal agora se mostra contrário à mudança do STJ.
Eu, agora, sou a favor. E não se trata de uma questão de mérito, mas de unificação de procedimentos. Trata-se apenas de uma questão de coerência e vergonha na cara, não é mesmo, senhores e senhoras da PGR?
Por Reinaldo Azevedo
Nenhum comentário:
Postar um comentário