Aquilo a que se viu na Venezuela neste domingo não foi uma eleição, mas uma farsa asquerosa de uma ditadura que mata seu povo de fome e de falta de remédios quando não o mata a tiros. Na condição de país mais importante da América Latina, particularmente da América do Sul, o Brasil não pode reconhecer o resultado. O tirano Nicolás Maduro venceu, é claro! Enquanto escrevo, Costa Rica e Panamá já seguiram esse caminho. Sei que são países pequenos, com pouco poder de pressão. Isso só faz crescer a importância de um posicionamento mais duro do Brasil. Se o país adotar o que considero a única posição digna diante de tamanho acinte, haverá a gritaria de sempre das esquerdas. Fazer o quê? Como sabem, não defendo nem nossos assassinos nem os dos outros; nem os de ontem nem os de hoje. Ademais, reitero, não houve uma eleição no país, mas apenas um ritual a mais de recondução do ditador — e, desta feita, o arranjo é ainda mais mambembe do que os anteriores. Se o Brasil não reconhecer o resultado, estará em companhia de Canadá, EUA e União Europeia. Não custa lembrar: Ruy Carlos Pereira, embaixador do país em Caracas, foi expulso em dezembro do ano passado.
Comecemos pelo básico. Os dois principais opositores de Maduro, Henrique Capriles e Leopoldo López, não puderam se candidatar. O primeiro foi declarado inelegível em 2017 pelos 15 anos seguintes. A decisão é da Controladoria-Geral da República, mera repartição do chavismo. O segundo está preso desde 18 de fevereiro de 2014. Em setembro de 2015, foi condenado a 13 anos, nove meses e sete dias de prisão sob a acusação de ter insuflado protestos contra o governo que resultaram na morte de 43 pessoas, abatidas como moscas pelas forças policiais e por milícias a serviço de Maduro. Vale dizer: o ditador mandou matar e prendeu seu opositor, acusando-o de ser o responsável pelos assassinatos. Essa é a Venezuela de hoje.
O MUD (Mesa da Unidade Democrática) boicotou a eleição. Não quis coonestar a farsa. Os críticos dessa posição lembram o que foi, de fato, um erro em 2005, quando os antichavistas denunciaram a desigualdade de condições na disputa e se retiraram do pleito. O chavismo disputou sozinho. Deitou e rolou. Com o domínio absoluto da Assembleia Nacional, Chávez nomeou sem contestação os juízes do Tribunal Supremo de Justiça, que é o STF deles, e os juízes do Conselho Nacional Eleitoral, correspondente ao nosso TSE. Ocorre que as circunstâncias agora são outras.
A verdadeira oposição está fora do pleito. O principal adversário de Maduro é o ex-chavista Henri Falcón. Pesquisa do Instituto Datanálisis dava-lhe 7,1 pontos de vantagem sobre o atual mandatário (41,4% a 34,3%). A rejeição ao tirano chegava a 80%. Doce ilusão! Às 22h27 deste domingo, a presidente do Conselho Nacional Eleitoral anunciou que, com 96,6% da apuração concluída, Maduro havia sido reeleito com 5.823.728 votos. Falcón obteve apenas 1.822.552. Javier Bertucci ficou com 942.042, Reinaldo Quijada, com 34.600. A participação não alcançou nem a metade do eleitorado. Ficou em 46.1%.
Se foi um erro a oposição não ter participado da disputa em 2005, agora, tudo indica, o erro foi participar — ainda que Falcón seja um ex-homem do regime; apenas um neo-oposicionista. Observem: será plausível imaginar que o governo que responde pelo pior momento da história do país obtenha 67,7% votos? É bem verdade que isso corresponde a algo em torno de um terço do eleitorado. A maioria, com efeito, não compareceu. Mesmo assim, as evidências de fraude são escandalosas.
Daí que deixo aqui o convite ao governo Temer: não reconheça o resultado. Sei que é outra a tradição da política externa brasileira. Mas que se saiba a hora de romper a tradição diante de uma fraude vendida como eleição.
Por Reinaldo Azevedo
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