Deu na Agência Brasil
Da festa agrária do Egito antigo, passando pela celebração a Dionísio na Grécia, a Baco em Roma, pelos bailes de rua da Veneza renascentista e pela coroação dos Rei e Rainha do Congo no século 18, a festa da carne ganhou novo contexto no Rio de Janeiro do século 20, com a popularização das escolas de samba.
Festa universal com origem nos rituais agrários primitivos, o carnaval reuniu em um único conceito brincadeiras e fenômenos sociais de origens diversas, que ocorriam em datas distintas, mas mantinham características em comum.
Para o historiador Hiram Araújo, o carnaval é a válvula de escape que libera as tensões sociais e permite a convivência nas sociedades divididas por classes. Nas festas dionisíacas da Grécia, celebrava-se a primavera com procissão e concurso de beberrões. Já nas saturnálias romanas, os tribunais e escolas ficavam fechados e os escravos podiam dizer verdades a seus senhores e ridicularizá-los, além de sair às ruas para cantar e se divertir sem ordem nenhuma.
A Igreja Católica oficializou o carnaval no ano de 590 d.C como um momento festivo para anteceder o período de privações da quaresma. A festa tomou formas mais parecidas com as atuais no período Renascentista do início do século 17 e chegou ao Brasil com os primeiros bailes nos anos 1840.
SURGEM OS RANCHOS
A organização das primeiras sociedades carnavalescas ocorreu a partir de 1855. Os blocos e cordões que surgiram reuniam elementos de batuques do candomblé e cortejos religiosos como o da Senhora do Rosário e o dos afoxés.
Em seguida, foi a vez do surgimento dos ranchos carnavalescos, no fim do século 19. Em 1909, é realizado o primeiro concurso de desfile de ranchos, organizado pelo Jornal do Brasil. Na competição, era obrigatório o desenvolvimento de um tema com abre-alas, comissão de frente, alegorias, mestre de canto, mestre-sala e porta-estandarte e orquestra, com coreografias rígidas.
As bases das escolas de samba surgiram nos anos 1920 com os sambistas do Estácio, entre eles Ismael Silva, que organizaram a escola Deixa Falar e o primeiro concurso de sambas, em 1929, que contou com a participação da Mangueira. O vencedor foi o Conjunto Oswaldo Cruz.
As escolas de samba eram consideradas variações dos blocos até o jornal Mundo Esportivo, de Mário Filho, promover, em 1932, o primeiro desfile das agremiações, na Praça 11, no qual participaram 19 grupos. O concurso estabeleceu alguns critérios de julgamento e elementos mínimos para o desfile, como a Ala das Baianas, o samba inédito, ter mais de cem componentes e não utilizar instrumentos de sopro. A vencedora foi a Estação Primeira de Mangueira.
BAIANAS MASCULINAS
Na década de 30, a Ala das Baianas era formada por homens que desfilavam nas laterais e levavam navalhas para defender a agremiação em caso de brigas. Ela foi criada em homenagem às “tias baianas”, que abrigavam os sambistas em suas casas na época em que esse gênero musical era marginalizado, bem como para lembrar as raízes africanas do samba.
No começo das escolas, não havia uma ligação entre a música, o enredo e o desfile. Foi apenas em 1939 que a Portela apresentou o enredo Teste ao Samba, no qual o visual da escola e a dramatização na avenida dialogavam com o enredo e a letra do samba.
Foi a partir dos anos 60 que começou a espetacularização dos desfiles, com a incorporação das escolas por segmentos de fora das comunidades de origem e a aproximação das classes médias urbanas. Além disso, a popularidade cresce com os primeiros registros fonográficos em disco que continham todos os sambas do ano e a transmissão televisiva. As escolas de samba são um grande sucesso da organização das comunidades, mas atualmente as origens festivas se perderam.
ENREDOS PATROCINADOS
“Hoje, na verdade, você tem a onda dos enredos patrocinados, as escolas de samba que vendem, negociam seus enredos com marcas, que é uma questão polêmica, até porque essas marcas percebiam que as escolas de samba podem ser veículos de propaganda poderosos. A questão da escola de samba como uma estrutura comunitária está em xeque. Isso se perdeu e está muito comprometido” diz o historiador Luiz Antonio Simas.
Apesar de o carnaval na Sapucaí movimentar o turismo no Rio de Janeiro e milhões de reais durante todo o ano, Simas questiona o real valor cultural que “o maior espetáculo da terra” representa atualmente. “A questão é a gente entender que cultura e evento, às vezes, não são sinônimos. A escola de samba hoje faz um grande evento, mas a discussão é se esse grande evento ainda se preserva dinamicamente como uma força cultural. Preserva em alguma instância, mas, sem dúvida alguma, é um momento de reflexão, as agremiações estão em xeque de certa maneira.”
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