Quando ouvir alguém vinculando a roubalheira na Petrobras ao caixa dois eleitoral ou à tese de extorsão, cuidado com a carteira. A primeira desculpa é novamente invocada por políticos e autoridades. A segunda começou a ser utilizada por executivos de empreiteiras. Ambas, por esfarrapadas, não param em pé.
Em 2005, logo que estourou o escândalo do mensalão, Lula tentou reduzir tudo ao caixa clandestino das campanhas. “O que o PT fez, do ponto de vista eleitoral, é o que é feito no Brasil sistematicamente”, disse, numa entrevista parisiense. No final do processo, corruptos e corruptores foram ao xadrez condenados por crimes mais pesados. Por exemplo: lavagem de dinheiro, peculato, corrupção ativa e passiva.
Há quatro dias, discursando num congresso nacional de advogados, o ministro petista José Eduardo Cardozo (Justiça) disse, com outras palavras, algo parecido com o que afirmara aquele Lula do alvorecer do mensalão: “Se queremos um Estado de direito legitimado [...] temos uma tarefa inadiável: a reforma política.”
Numa clara referência ao petrolão. Cardozo acrescentou: “Não é possível conviver com um sistema que, pelas formas de financiamento, gera corrupção estrutural que não pode mais ser aceita entre nós.''
Se os crimes praticados na Petrobras tivessem alguma coisa a ver com a caixa registradora das campanhas, a delinquência seria bem mais simples: os contratos da Petrobras seriam superfaturados e a diferença se converteria em doações das empreiteiras aos partidos e aos comitês de candidatos. Coisa oficial, registrada na Justiça Eleitoral.
Para azeitar esse tipo de transação, não há necessidade de recorrer a personagens como Alberto Youssef. Quem passa pela lavanderia do doleiro está atrás de outro tipo de serviço: a transformação do dinheiro sujo da corrupção em patrimônio de aparência higienizada. De resto, depois que o gerente-executivo de Engenharia da Petrobas Pedro Barusco aderiu à delação e topou devolver à Viúva US$ 97 milhões recebidos por baixo da mesa, quem sustenta a tese de caixa dois se arrisca a passar por bobo. Ou, pior, por cúmplice.
Na outra ponta, a defesa de Erton Medeiros Fonseca, presidente da Galvão Engenharia, alegou que ele pagou propinas ao doleiro Alberto Yousseff e a prepostos dos ex-diretores da Petrobras Paulo Roberto Costa e Renato Duque porque teria sido extorquido. Sérgio Cunha Mendes, vice-presidente da Construtora Mendes Júnior, sustenta que também foi achacado por Youssef.
Nessa versão, empreiteiras boazinhas cederam a ameaças de funcionários malvadões —ou pagavam propinas ou não fariam negócios com a Petrobras. “É muito difícil de acreditar”, reagiu o procurador-geral da República Rodrigo Janot. De fato, é inacreditável.
O conteúdo dos depoimentos de delatores e o papelório colecionado pelos investigadores apontam para a formação de um cartel de empreiteiras na Petrobras. Mandavam e, sobretudo, desmadavam no orçamento e na distribuição das obras encomendadas pela estatal.
Se fossem vítimas de extorsão, as empreiteiras teriam formado um cartel às avessas. Mordidos, denunciariam os achacadores. Juntas, tinham o trombone nas mãos. Com um sopro, teriam poupado milhões, além das humilhações.
Josias de Souza
Nenhum comentário:
Postar um comentário