quinta-feira, 30 de novembro de 2023

Quem já pratica bom jornalismo não será afetado por tese do STF



O Supremo Tribunal Federal aprovou, em julgamento concluído nesta quinta-feira, uma tese que irá nortear decisões do Judiciário sobre o exercício da liberdade de imprensa no país. Ficou decidido que veículos de comunicação podem ser condenados por danos morais quando divulgam entrevista na qual o entrevistado imputa a alguém uma acusação falsa de prática de ato ilícito.

O caso que deu origem à decisão do Supremo envolve uma disputa entre a família do ex-deputado Ricardo Zarattini Filho, morto em 2017, e o Diário de Pernambuco. O jornal havia sido condenado a pagar indenização de R$ 50 mil por uma entrevista. Nela, o entrevistado acusara o ex-parlamentar de ser responsável por atentado a bomba no aeroporto de Guararapes, em 1968, durante a ditadura militar. Algo que não ficou comprovado.

O Supremo já havia confirmado a condenação. Mas entendeu que seria necessário definir os parâmetros a serem aplicados pelo Judiciário no julgamento de casos similares. Entidades representativas da imprensa agiram para evitar incompreensões ruinosas. Acabou prevalecendo, por maioria de votos e com ajustes, a tese do ministro Alexandre de Moraes. Para ele, a liberdade de imprensa não é um direito absoluto. Deve ser exercida com "responsabilidade".

Ficou estabelecido o óbvio: Não se admite a censura prévia. Mas avaliou-se que é possível responsabilizar veículos que divulguem entrevistas com "informações comprovadamente injuriosas, difamantes, caluniosas, mentirosas." A decisão combina o direito à informação com outros direitos também previstos na Constituição. Os "direitos à honra, intimidade, vida privada e à própria imagem" dos acusados.

Num instante em que a sociedade exige das plataformas digitais responsabilidade pelo conteúdo das informações que divulgam, não seria razoável que a imprensa profissional reivindicasse a inobservância da obrigação elementar de verificar a veracidade de fatos e acusações.

Se as imputações são antigas, como no caso de Pernambuco, a checagem é um imperativo historiográfico. Se a notícia envolve acusações contemporâneas, como nos casos da entrevista de Pedro Collor contra o irmão-presidente ou das revelações de Roberto Jefferson sobre o mensalão, cabe exercer o dever profissional de ouvir o "outro lado" —não como aplicação mecânica de uma regra, mas com o propósito sincero de dar oportunidade genuína ao exercício do contraditório.

Tudo isso já é levado em conta pelas redações onde se pratica o bom jornalismo. Conviria ao Supremo aperfeiçoar o texto de sua tese, pois há desafios que transbordam a decisão tomada nesta quinta-feira. Por exemplo: nas entrevistas ao vivo, a instantaneidade impede a verificação imediata de eventuais imputações criminosas atribuídas a terceiros. Cabe, nesses casos, buscar o contraditório com a rapidez devida. De novo, algo que já está introjetado na prática do jornalismo profissional.

Não faria sentido a essa altura impor travas artificiais à imprensa livre. Ela pode, naturalmente, ser boa ou ruim. Mas será sempre precária sem liberdade.

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