Em setembro, o plenário do Senado Federal aprovou, em votação simbólica, o Projeto de Lei da Câmara (PLC) 3.624/2008, de autoria do ex-deputado Tadeu Filippelli (PMDB-DF). O projeto alterou o artigo 6.º da Lei n.º 10.826/2003 – o Estatuto do Desarmamento –, permitindo a concessão de porte de arma de fogo aos agentes em serviço das autoridades de trânsito da União, dos Estados e dos municípios que não sejam policiais, desde que comprovadas tanto a capacidade técnica como a aptidão psicológica dos agentes.
Em boa hora, o presidente Michel Temer vetou o projeto de lei na íntegra, após consultas ao Ministério da Justiça e à Casa Civil da Presidência da República, que propuseram o veto por entenderem que o PLC 3.624/2008 conflitava com o principal objetivo que inspirou a edição do Estatuto do Desarmamento, qual seja, a redução do número de armas de fogo em circulação no País.
Na semana passada, o Congresso Nacional sustentou o veto do presidente Temer. Na sessão, 174 deputados votaram pela manutenção do veto, enquanto 152 manifestaram-se pela sua derrubada. Para que o veto presidencial caísse, eram necessários os votos de, pelo menos, 257 deputados e 41 senadores, ou seja, a maioria absoluta das duas Casas Legislativas. Diante do placar obtido na votação dos deputados, os senadores nem sequer precisaram votar e o veto foi mantido. Assim, os agentes de trânsito permanecem proibidos de portar armas de fogo.
O Código de Trânsito Brasileiro (CTB) define “agente da autoridade de trânsito” como “toda pessoa, civil ou policial militar, credenciada pela autoridade de trânsito para o exercício das atividades de fiscalização, operação, policiamento ostensivo de trânsito ou patrulhamento”. Caso o projeto de lei não fosse vetado, ou o veto não fosse mantido pelos congressistas, as ruas e avenidas do País ficariam ainda mais inseguras do que já estão hoje, pois um enorme contingente de civis, não policiais, cuja atribuição legal é “atuar na educação, engenharia e fiscalização de trânsito”, passaria a portar armas de fogo após ser submetido a sabe-se lá que tipo de treinamento ou avaliação psicológica.
Além do mais, armar os agentes de trânsito significaria uma ofensa frontal à Constituição, que é bastante clara ao determinar as incumbências e competências exigidas das polícias, em seus diferentes níveis e estruturas organizacionais, elas sim, forças do Estado constitucionalmente autorizadas a ter agentes portando armas de fogo no exercício de suas atribuições legais.
Em seu parecer defendendo a aprovação do projeto, o senador José Medeiros (PODE-MT) afirmou ser “inegável que a fiscalização do trânsito envolve riscos consideráveis, pois os agentes são encarregados de fiscalizar vias públicas e não raro se deparam com condutores embriagados, exaltados e violentos”, o que, em sua visão, justificaria o porte de arma de fogo pelos agentes de trânsito. Além disso, prosseguiu, “os agentes (de trânsito) podem ser surpreendidos pelo cometimento de crimes em flagrante delito, como o porte de entorpecentes e de armas de fogo”.
Ora, para os casos de risco à ordem pública e à incolumidade das pessoas, incluindo os agentes do Estado, como os descritos no parecer do senador José Medeiros, a lei já determina quem deve atuar: as Polícias Militares, forças responsáveis pelo patrulhamento ostensivo das vias públicas. Em caso de ocorrências daquela natureza, basta que os agentes de trânsito requisitem a intervenção dos órgãos de segurança pública legalmente competentes para intervir nestes casos, inclusive usando a força se necessário.
Já são muitos os riscos a que estão expostos os cidadãos brasileiros ao saírem todos os dias de suas casas. É aberrante o número de mortes causadas pelo uso de armas de fogo no País. Ainda que não estejamos no patamar civilizatório de poder contar com policiais que nem sequer portam armas nas ruas, como ocorre em países como a Inglaterra, por exemplo, pelo menos restringir o acesso a elas pelos marronzinhos já é uma medida sensata.
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